Economia

Novelo sem-fim

Os setores beneficiados com a redução de impostos ainda não experimentaram os efeitos das medidas e carregam a inércia dos tempos do dólar barato

Prateleira. Os segmentos de roupas e calçados desovam aos poucos o estoque de importados. Foto: Afliberto Lima/AE
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O índice de desemprego geral mais recente, relativo a maio, caiu a 5,8%, o menor nível para o mesmo mês desde 2002. A renda média segue em alta, 5% maior do que há um ano. O varejo, em ritmo acima do PIB, acumula números igualmente positivos. O câmbio valorizou-se para além de 2 reais há quase dois meses. A inflação mantém-se em queda. A Selic está no menor nível da história. E o emprego industrial embicou para cima.

Diante desses números, a lógica econômica concluiria que os investimentos têm tudo para reagir, particularmente nos setores da indústria que, desde o início do ano, receberam incentivos. A realidade, contudo, é mais complexa e dura. E a luz no fim do túnel ainda é uma promessa tênue.

A produção industrial, por exemplo, recuou 2,8% de janeiro a abril em comparação a 2011, resultado que engloba segmentos como o de calçados e vestuário, cujas folhas de pagamento foram desoneradas em dezembro de 2011 em troca do desconto de 1% sobre seus faturamentos.

Apesar de os incentivos do governo soarem insuficientes, persiste a sensação entre empresários e economistas de que eles evitam o pior. Paulo Francini, diretor da Fiesp, a federação das indústrias paulistas, esboça um otimismo contido ao comentar o crescimento do emprego na indústria paulista, de 0,29% em maio em relação ao mês anterior, ou 21 mil postos de trabalho, índice incapaz de reverter a queda ante 2011, calculada pela Fiesp em 2,9%. “Fica a indagação se este é o início de uma melhora da indústria de transformação. Os números do próximo mês deverão trazer mais luz”, afirmou o empresário ao divulgar o resultado. “Não se fala em voltar a crescer, mas sim em não ter um declínio muito grande”, comenta ressabiado o economista Júlio Sergio Gomes de Almeida, do IE/Unicamp.

Para as fabricantes de roupas e sapatos, o benefício fiscal mostrou-se, até o momento, fraco diante da concorrência importada, em um momento em que o consumo desses itens esfriou. O varejo como um todo vendeu 9% a mais nos primeiros quatro meses do ano, mas o consumo dos dois setores cresceu apenas 0,45%, com aumento de 11% das importações de calçados e de 35% das confecções. A produção nacional nos dois casos retraiu-se em 3,42% e 13,5%, respectivamente.

A resposta à desoneração aplicada a calçados e vestuário tende mesmo a ser lenta, ainda que contínua, dizem especialistas, diferentemente da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), com impacto direto no preço e data certa para acabar. Segmentos que tiveram o IPI cortado, como linha branca e móveis, estão com resultados melhores na produção.

A expectativa é de que haja recuperação nas vendas de automóveis – que caíram 18% até abril – a partir de maio, como resultado do benefício recente. O desempenho da indústria em geral mexe com a confiança dos investidores em relação aos resultados do ano. E as esperanças concentram-se no segundo semestre.

Há quem considere que as iniciativas são limitadas. “É preciso pensar medidas horizontais como a reforma tributária, mais investimentos em pesquisa, desenvolvimento, infraestrutura”, avalia Silvio Sales, do Ibre/FGV. Na mesma linha, Almeida argumenta que a desoneração da folha de pagamento não é grande coisa, conforme o cenário. “O consumo poderia ser maior se não houvesse alguma restrição ao crédito como ainda há.”

O mais difícil é mesmo enfrentar os chineses. A aposta da indústria é de estabilidade na produção em relação a 2011 para calçados, vestuário e têxtil. E também para os móveis. “As vendas de mobiliário foram puxadas pela maior oferta de crédito dos grandes magazines, que também são grandes financiadores. Mas sentimos o consumo mais fraco em maio. E o nível de endividamento e a insegurança com a economia externa devem prejudicar o ritmo das vendas”, diz Lipel Custódio, presidente da Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário (Abimóvel).

Confecção é o setor com maior dificuldade, por ser o elo final da cadeia. A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) reivindica que o porcentual de desconto sobre o faturamento caia do atual 1% para 0,5% a 0,8%. O governo ainda não manifestou disposição em reduzir o porcentual.

Para a Associação Brasileira do Vestuário (Abravest), a desoneração permitiu ganho de 4% sobre a folha de pagamento. “O incentivo ajudou as empresas a terem capital de giro, mas exportar continua impossível. Sem a possibilidade de competir com o preço de produtos básicos da China, as empresas brasileiras precisam sofisticar a sua produção”, explica Roberto Chadad, presidente da Abravest.

Na atual conjuntura, a economia das empresas de confecção e têxteis com tributos, esta última apoiada em benefícios que entrarão em vigor a partir de julho, deve ser de 560 milhões de reais, a partir da segunda metade do ano. “Os incentivos estão maturando, além de o segundo semestre ser melhor para as vendas do setor. Considerado o ano todo, se a produção empatar em relação a 2011 está bom”, diz Aguinaldo Diniz Filho, presidente da Abit.

A situação é semelhante no caso dos calçadistas, que indicam maior fôlego financeiro, mas sem reflexo sobre as vendas. “Houve um esgotamento da demanda neste ano, algo que já era esperado, com uma desova de estoques de importados no mercado brasileiro”, explica Heitor Klein, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados).

O comportamento do consumidor parece ser contraditório com a desenvoltura da renda. Para Sales, uma das explicações é a de que os brasileiros não sentem a necessidade neste momento de adquirir novos bens duráveis. Além disso, por causa do endividamento em alta, há uma cautela maior para fechar compras a prazo. “Roupas e sapatos são o tipo de consumo que se pode adiar, diferentemente do supermercado”, diz o economista do Ibre/FGV. Para recuperar o consumo, Almeida lembra que é preciso uma conjunção de fatores. “O consumo não depende só de renda, que hoje cresce, mas também de crédito, que está caindo, e de confiança, que também está caindo.”

Os preços desses setores beneficiados no fim do ano passado também não tiveram redução capaz de estimular o consumo de maneira mais acentuada, como o verificado nos grupos que tiveram o corte de IPI. De janeiro a abril, os vestuários encareceram 3,5% e os calçados, 3%.

“Como um benefício estrutural, não era de se esperar que os preços caíssem já, da mesma forma que o efeito do câmbio valorizado não derruba o preço dos importados na mesma hora, devido aos contratos já fechados”, diz Almeida.

O índice de desemprego geral mais recente, relativo a maio, caiu a 5,8%, o menor nível para o mesmo mês desde 2002. A renda média segue em alta, 5% maior do que há um ano. O varejo, em ritmo acima do PIB, acumula números igualmente positivos. O câmbio valorizou-se para além de 2 reais há quase dois meses. A inflação mantém-se em queda. A Selic está no menor nível da história. E o emprego industrial embicou para cima.

Diante desses números, a lógica econômica concluiria que os investimentos têm tudo para reagir, particularmente nos setores da indústria que, desde o início do ano, receberam incentivos. A realidade, contudo, é mais complexa e dura. E a luz no fim do túnel ainda é uma promessa tênue.

A produção industrial, por exemplo, recuou 2,8% de janeiro a abril em comparação a 2011, resultado que engloba segmentos como o de calçados e vestuário, cujas folhas de pagamento foram desoneradas em dezembro de 2011 em troca do desconto de 1% sobre seus faturamentos.

Apesar de os incentivos do governo soarem insuficientes, persiste a sensação entre empresários e economistas de que eles evitam o pior. Paulo Francini, diretor da Fiesp, a federação das indústrias paulistas, esboça um otimismo contido ao comentar o crescimento do emprego na indústria paulista, de 0,29% em maio em relação ao mês anterior, ou 21 mil postos de trabalho, índice incapaz de reverter a queda ante 2011, calculada pela Fiesp em 2,9%. “Fica a indagação se este é o início de uma melhora da indústria de transformação. Os números do próximo mês deverão trazer mais luz”, afirmou o empresário ao divulgar o resultado. “Não se fala em voltar a crescer, mas sim em não ter um declínio muito grande”, comenta ressabiado o economista Júlio Sergio Gomes de Almeida, do IE/Unicamp.

Para as fabricantes de roupas e sapatos, o benefício fiscal mostrou-se, até o momento, fraco diante da concorrência importada, em um momento em que o consumo desses itens esfriou. O varejo como um todo vendeu 9% a mais nos primeiros quatro meses do ano, mas o consumo dos dois setores cresceu apenas 0,45%, com aumento de 11% das importações de calçados e de 35% das confecções. A produção nacional nos dois casos retraiu-se em 3,42% e 13,5%, respectivamente.

A resposta à desoneração aplicada a calçados e vestuário tende mesmo a ser lenta, ainda que contínua, dizem especialistas, diferentemente da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), com impacto direto no preço e data certa para acabar. Segmentos que tiveram o IPI cortado, como linha branca e móveis, estão com resultados melhores na produção.

A expectativa é de que haja recuperação nas vendas de automóveis – que caíram 18% até abril – a partir de maio, como resultado do benefício recente. O desempenho da indústria em geral mexe com a confiança dos investidores em relação aos resultados do ano. E as esperanças concentram-se no segundo semestre.

Há quem considere que as iniciativas são limitadas. “É preciso pensar medidas horizontais como a reforma tributária, mais investimentos em pesquisa, desenvolvimento, infraestrutura”, avalia Silvio Sales, do Ibre/FGV. Na mesma linha, Almeida argumenta que a desoneração da folha de pagamento não é grande coisa, conforme o cenário. “O consumo poderia ser maior se não houvesse alguma restrição ao crédito como ainda há.”

O mais difícil é mesmo enfrentar os chineses. A aposta da indústria é de estabilidade na produção em relação a 2011 para calçados, vestuário e têxtil. E também para os móveis. “As vendas de mobiliário foram puxadas pela maior oferta de crédito dos grandes magazines, que também são grandes financiadores. Mas sentimos o consumo mais fraco em maio. E o nível de endividamento e a insegurança com a economia externa devem prejudicar o ritmo das vendas”, diz Lipel Custódio, presidente da Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário (Abimóvel).

Confecção é o setor com maior dificuldade, por ser o elo final da cadeia. A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) reivindica que o porcentual de desconto sobre o faturamento caia do atual 1% para 0,5% a 0,8%. O governo ainda não manifestou disposição em reduzir o porcentual.

Para a Associação Brasileira do Vestuário (Abravest), a desoneração permitiu ganho de 4% sobre a folha de pagamento. “O incentivo ajudou as empresas a terem capital de giro, mas exportar continua impossível. Sem a possibilidade de competir com o preço de produtos básicos da China, as empresas brasileiras precisam sofisticar a sua produção”, explica Roberto Chadad, presidente da Abravest.

Na atual conjuntura, a economia das empresas de confecção e têxteis com tributos, esta última apoiada em benefícios que entrarão em vigor a partir de julho, deve ser de 560 milhões de reais, a partir da segunda metade do ano. “Os incentivos estão maturando, além de o segundo semestre ser melhor para as vendas do setor. Considerado o ano todo, se a produção empatar em relação a 2011 está bom”, diz Aguinaldo Diniz Filho, presidente da Abit.

A situação é semelhante no caso dos calçadistas, que indicam maior fôlego financeiro, mas sem reflexo sobre as vendas. “Houve um esgotamento da demanda neste ano, algo que já era esperado, com uma desova de estoques de importados no mercado brasileiro”, explica Heitor Klein, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados).

O comportamento do consumidor parece ser contraditório com a desenvoltura da renda. Para Sales, uma das explicações é a de que os brasileiros não sentem a necessidade neste momento de adquirir novos bens duráveis. Além disso, por causa do endividamento em alta, há uma cautela maior para fechar compras a prazo. “Roupas e sapatos são o tipo de consumo que se pode adiar, diferentemente do supermercado”, diz o economista do Ibre/FGV. Para recuperar o consumo, Almeida lembra que é preciso uma conjunção de fatores. “O consumo não depende só de renda, que hoje cresce, mas também de crédito, que está caindo, e de confiança, que também está caindo.”

Os preços desses setores beneficiados no fim do ano passado também não tiveram redução capaz de estimular o consumo de maneira mais acentuada, como o verificado nos grupos que tiveram o corte de IPI. De janeiro a abril, os vestuários encareceram 3,5% e os calçados, 3%.

“Como um benefício estrutural, não era de se esperar que os preços caíssem já, da mesma forma que o efeito do câmbio valorizado não derruba o preço dos importados na mesma hora, devido aos contratos já fechados”, diz Almeida.

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