Economia

Gleisi, Haddad e as piscadelas a Marcos Lisboa

O ensaio de uma nova rendição aos ditames do mercado financeiro, como no primeiro mandato de Lula, gera constrangimento no PT

Lisboa e Haddad, ligados pelo Insper
Apoie Siga-nos no

Não se sabe a identidade do responsável, mas um balão de ensaio foi lançado no picadeiro das notícias eleitorais: Fernando Haddad, confirmado como candidato à presidência da República na terça-feira 11, estaria propenso a nomear para o Ministério da Fazenda um economista ortodoxo, defensor da austeridade fiscal e do tripé macroeconômico (câmbio livre, superávit primário e metas de inflação). Alguém com o perfil de Marcos Lisboa, senão o próprio.

Seria uma tentativa de reeditar a conciliação do primeiro mandato de Lula, que assinou a Carta aos Brasileiros, um compromisso com os bancos apresentado durante a campanha de 2002, e entregou a Antônio Palocci a chave do cofre, em um gesto de boa vontade dirigido aos mercados.

Leia também:
Associado diretamente a Lula, Haddad soma 22% e ultrapassa Bolsonaro

Palocci, para quem não se lembra, aumentou o superávit primário no início do primeiro mandato de Lula, maneira de provar o compromisso petista com o controle das contas públicas.

Lisboa veio no pacote da Carta aos Brasileiros. Serviu a Palocci como secretário de Política Econômica entre 2003 e 2005 e presidente do estatal Instituto de Resseguros do Brasil de 2005 a 2006. Após deixar o governo, tornou-se crítico ferrenho das medidas adotadas pelas administrações petistas. Atualmente preside o Insper, faculdade que reúne a fina flor do pensamento ortodoxo do Brasil.

Haddad até recentemente era professor do Insper.

Os operadores financeiros não recusaram o flerte, apesar de há muito tempo terem deixado claro que topam “casar” até com Jair Bolsonaro para impedir que o PT ou Ciro Gomes vençam as eleições.

“Haddad pode não ser o bicho-papão que o mercado teme”, enuncia uma reportagem da Bloomberg, reproduzida em vários portais. O ex-prefeito, diz um analista ouvido pela agência de notícias, seria “mais pragmático do que ideológico”, o que manteria a chance de um eventual novo governo petista promover as reformas que o sistema financeiro (e só ele) considera essenciais para o País.

Quem atrapalhou o namorico foi Gleisi Hoffmann, presidente do PT. Em resposta às especulações de um lado e de outro, a dirigente foi taxativa: “O mercado já nos conhece. Não é a nossa prioridade. E foi o mercado que jogou o País no caos em que estamos”.

O mal estar no PT não está, porém, totalmente solucionado. Economistas que contribuíram para a confecção do programa de governo da campanha se incomodam, não é de hoje, com os acenos de Haddad a Lisboa e outros ortodoxos, entre eles Samuel Pessôa, ligado ao Instituto Milleninum. Também reclamam das certezas graníticas do candidato, que “acredita entender de economia”, conforme definição de um colaborador.

Nenhum dos quase cem especialistas convocados para os debates do programa do partido apostaria um único centavo na reedição ipsis litteris do arranjo – a entrega da gestão econômica a conservadores em troca de certa liberdade na administração dos projetos sociais – que permitiu a Lula governar por dois mandatos.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar