Economia

Fazendo o capital em casa – 2

Precisamos de um imposto sobre valor agregado com alíquota alta o suficiente para substituir os valores arrecadados com IPI e ICMS

Milhões de brasileiros que declararam Imposto de Renda entre 1967 e 1983 têm uma bolada a receber, mas se esqueceram de correr atrás do dinheiro
Apoie Siga-nos no

Retomo, como prometido, à proposta de um debate que nos leva ao Brasil a ser construído, com nossas energias políticas e um alto (quanto possível) nível de poupança doméstica – para nele lastrear, primariamente, nossa aguda necessidade de oferecer ao nosso povo um modelo de desenvolvimento que sustente, no tempo, taxas altas de crescimento econômico, sem comprometer o controle de nossa moeda.

Creio que os principais movimentos têm a ver com nosso modelo tributário e, mais enfaticamente, com nosso modelo previdenciário.

O coração de nosso modelo tributário nos foi imposto pelo regime de 64. Mesmo assim, curiosamente, foi agasalhado praticamente na íntegra pelo constituinte de 88.

Pune o investimento, a produção e o trabalho e subgrava o patrimônio, o rentismo e, em certa medida, o consumo das classes mais abastadas. É absolutamente hostil à superação de nossos desequilíbrios profundos entre pessoas, setores econômicos e regiões. É muito pouco utilizado estrategicamente para reforçar uma política industrial e de comércio exterior, que aliás não temos.

É sempre honesto e sóbrio afirmar que a solução não é trivial muito menos simples politicamente. Mas é preciso e inadiável pautarmos este debate. É uma das três ou quatro questões que deveriam hegemonizar o debate no Congresso Nacional. É das questões em que precisamos ousar no passo e colocar em prática o princípio constitucional vigente de mecanismos de democracia direta em vez da vulnerável e mofada democracia estritamente representativa que temos.

A consistente queda da proporção entre dívida pública e PIB que experimentamos com Lula e Dilma abre raro espaço para atenuar os naturais temores e riscos relativos à transição. Mas de qualquer forma trata-se, tenhamos clareza, de deslocar proporções no peso da carga tributária entre diversos grupos de interesse que fraturam a ideia de Nação e nos submetem – na prática – ao domínio de lobbies, regionalismos paroquiais e cíclicos favores aos que já são os mais favorecidos.

Igualmente tenhamos clareza: o que precisa ser feito fere interesses atuais, organizados, informados, para beneficiar as gerações futuras, os do povo, cujo máximo de organização se encontra em um sindicalismo avançado das regiões ricas. Sempre em desfavor das maiorias atomizadas e induzidas a crer, pela novelização dos escândalos, que qualquer tributo é ruim – pois só serviria para os “políticos roubarem”, todos iguais que seriam, a depender do critério dominante do oligopólio da grande mídia.

Assim entendemos a aberração, recém-assistida passivamente pelo País: com uma diferença de poucos dias, o Senado revogou a CPMF, subtraindo, do dia para a noite, quase 50 bilhões de reais do orçamento público sem qualquer adaptação do quadro de despesas e, incrível (!), determinou a regulamentação da chamada emenda 29, incrementando fortemente os dispêndios com saúde pública.

Durma-se com um barulho desses: reduzir carga tributária dos endinheirados e anunciar incremento substantivo de despesas quase na mesma hora!

Últimos artigos de Ciro Gomes:

Vi coisa pior: um notório deputado do PMDB do Rio de Janeiro, com apoio do atual vice-presidente da República, então presidente da Câmara dos Deputados, emendou uma medida provisória que tratava de moradia popular, criando uma isenção de impostos num valor superior a 100 bilhões de reais (!) retroativa à década de 70 (!).

Neste caso o erário teria de devolver aos abastados esta montanha de dinheiro. A Câmara aprovou, o Senado também. Eu vi os lobistas andando dentro do plenário, denunciei da tribuna. Conseguiu-se que o presidente Lula vetasse a falcatrua.

Mas eis aí exemplos práticos de como precisamos politizar este debate e envolver o povo, inclusive diretamente, através de plebiscitos e referendos, se quisermos tratar do assunto a sério como o País precisa.

No mérito, sustento (sem qualquer presunção de estar sustentando verdade única) que precisamos criar no Brasil um IVA (imposto sobre valor agregado) federal com alíquota de partida alta o suficiente para substituir os valores arrecadados com os atuais IPI e ICMS.

Este IVA deve ser cobrado no destino, como se faz no mundo civilizado todo. Mas, por peculiaridade brasileira, deve ser partilhado com os estados e municípios de maneira diretamente proporcional à população, mas inversamente proporcional à renda per capita.

Pra compensar os estados mais ricos de eventuais perdas com esta repartição progressiva, a Constituição deve ser emendada facultando ao estado que quiser cobrar um imposto de renda adicional com alíquota máxima regulada, inclusive sobre benefícios atualmente usados como disfarce pra burla do imposto de renda federal.

Defendo a criação de imposto direto e com alíquota progressiva sobre heranças e doações. Isto é o moderno e eficaz em vez de um tal imposto sobre grandes fortunas que não arrecadaria nada porque as assim chamadas fortunas estão todas materializadas em pessoas jurídicas.

Advogo a adoção de um novo Imposto Territorial Rural também com alíquota progressiva conforme tamanho e fator de uso da terra. O atual ITR arrecada menos que o IPTU de uma só cidade grande brasileira.

Sobre PIS, COFINS, contribuições parafiscais outras, vamos discuti-las na questão previdenciária.

Isto feito, poderíamos simplificar o sistema tributário para não mais que cinco ou seis impostos, arrecadar mais e mais eficientemente, ganhando escala na distribuição mais progressiva da carga de tal forma que poderíamos anunciar uma queda progressiva também da carga tributária nominal atual.

Retomo, como prometido, à proposta de um debate que nos leva ao Brasil a ser construído, com nossas energias políticas e um alto (quanto possível) nível de poupança doméstica – para nele lastrear, primariamente, nossa aguda necessidade de oferecer ao nosso povo um modelo de desenvolvimento que sustente, no tempo, taxas altas de crescimento econômico, sem comprometer o controle de nossa moeda.

Creio que os principais movimentos têm a ver com nosso modelo tributário e, mais enfaticamente, com nosso modelo previdenciário.

O coração de nosso modelo tributário nos foi imposto pelo regime de 64. Mesmo assim, curiosamente, foi agasalhado praticamente na íntegra pelo constituinte de 88.

Pune o investimento, a produção e o trabalho e subgrava o patrimônio, o rentismo e, em certa medida, o consumo das classes mais abastadas. É absolutamente hostil à superação de nossos desequilíbrios profundos entre pessoas, setores econômicos e regiões. É muito pouco utilizado estrategicamente para reforçar uma política industrial e de comércio exterior, que aliás não temos.

É sempre honesto e sóbrio afirmar que a solução não é trivial muito menos simples politicamente. Mas é preciso e inadiável pautarmos este debate. É uma das três ou quatro questões que deveriam hegemonizar o debate no Congresso Nacional. É das questões em que precisamos ousar no passo e colocar em prática o princípio constitucional vigente de mecanismos de democracia direta em vez da vulnerável e mofada democracia estritamente representativa que temos.

A consistente queda da proporção entre dívida pública e PIB que experimentamos com Lula e Dilma abre raro espaço para atenuar os naturais temores e riscos relativos à transição. Mas de qualquer forma trata-se, tenhamos clareza, de deslocar proporções no peso da carga tributária entre diversos grupos de interesse que fraturam a ideia de Nação e nos submetem – na prática – ao domínio de lobbies, regionalismos paroquiais e cíclicos favores aos que já são os mais favorecidos.

Igualmente tenhamos clareza: o que precisa ser feito fere interesses atuais, organizados, informados, para beneficiar as gerações futuras, os do povo, cujo máximo de organização se encontra em um sindicalismo avançado das regiões ricas. Sempre em desfavor das maiorias atomizadas e induzidas a crer, pela novelização dos escândalos, que qualquer tributo é ruim – pois só serviria para os “políticos roubarem”, todos iguais que seriam, a depender do critério dominante do oligopólio da grande mídia.

Assim entendemos a aberração, recém-assistida passivamente pelo País: com uma diferença de poucos dias, o Senado revogou a CPMF, subtraindo, do dia para a noite, quase 50 bilhões de reais do orçamento público sem qualquer adaptação do quadro de despesas e, incrível (!), determinou a regulamentação da chamada emenda 29, incrementando fortemente os dispêndios com saúde pública.

Durma-se com um barulho desses: reduzir carga tributária dos endinheirados e anunciar incremento substantivo de despesas quase na mesma hora!

Últimos artigos de Ciro Gomes:

Vi coisa pior: um notório deputado do PMDB do Rio de Janeiro, com apoio do atual vice-presidente da República, então presidente da Câmara dos Deputados, emendou uma medida provisória que tratava de moradia popular, criando uma isenção de impostos num valor superior a 100 bilhões de reais (!) retroativa à década de 70 (!).

Neste caso o erário teria de devolver aos abastados esta montanha de dinheiro. A Câmara aprovou, o Senado também. Eu vi os lobistas andando dentro do plenário, denunciei da tribuna. Conseguiu-se que o presidente Lula vetasse a falcatrua.

Mas eis aí exemplos práticos de como precisamos politizar este debate e envolver o povo, inclusive diretamente, através de plebiscitos e referendos, se quisermos tratar do assunto a sério como o País precisa.

No mérito, sustento (sem qualquer presunção de estar sustentando verdade única) que precisamos criar no Brasil um IVA (imposto sobre valor agregado) federal com alíquota de partida alta o suficiente para substituir os valores arrecadados com os atuais IPI e ICMS.

Este IVA deve ser cobrado no destino, como se faz no mundo civilizado todo. Mas, por peculiaridade brasileira, deve ser partilhado com os estados e municípios de maneira diretamente proporcional à população, mas inversamente proporcional à renda per capita.

Pra compensar os estados mais ricos de eventuais perdas com esta repartição progressiva, a Constituição deve ser emendada facultando ao estado que quiser cobrar um imposto de renda adicional com alíquota máxima regulada, inclusive sobre benefícios atualmente usados como disfarce pra burla do imposto de renda federal.

Defendo a criação de imposto direto e com alíquota progressiva sobre heranças e doações. Isto é o moderno e eficaz em vez de um tal imposto sobre grandes fortunas que não arrecadaria nada porque as assim chamadas fortunas estão todas materializadas em pessoas jurídicas.

Advogo a adoção de um novo Imposto Territorial Rural também com alíquota progressiva conforme tamanho e fator de uso da terra. O atual ITR arrecada menos que o IPTU de uma só cidade grande brasileira.

Sobre PIS, COFINS, contribuições parafiscais outras, vamos discuti-las na questão previdenciária.

Isto feito, poderíamos simplificar o sistema tributário para não mais que cinco ou seis impostos, arrecadar mais e mais eficientemente, ganhando escala na distribuição mais progressiva da carga de tal forma que poderíamos anunciar uma queda progressiva também da carga tributária nominal atual.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo