Economia

Chance para empreiteiras no governo pode vir tarde demais

Futuro ministro de Infraestrutura diz que não há por que construtoras continuarem banidas de contratos, mas muitas estão atrofiadas

A Odebrecht foi uma das construtoras prejudicadas por causa de condutas impróprias
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As empreiteiras brasileiras mais conceituadas no País e no exterior pela qualidade dos seus produtos e serviços e a pontualidade da entrega das obras,  há anos banidas das contratações pelo governo devido a inidoneidades apuradas na operação Lava Jato terão uma chance de conseguir obras públicas no novo governo a julgar pelas declarações do futuro ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes Freitas.

Para algumas dessas empresas, entretanto, a readmissão à esfera dos contratos com a União, os estados e os municípios talvez chegue tarde demais dada a atrofia que lhes foi imposta desnecessariamente pela Justiça e por órgãos governamentais e tribunais em permanente disputa de protagonismo, com a colaboração de uma legislação anacrônica, confusa e contraditória. Freitas propõe recontratar as construtoras da Lava Jato, incluídas as maiores que o País teve até hoje, após a devida punição dos executivos que cometeram malfeitos e a melhora da governança, como se faz nos EUA e Europa.

O futuro ministro contestou a alteração, por comissão da Câmara, da nova Lei de Licitações no sentido de exigir certidão negativa de falência, recuperação judicial ou extrajudicial na habilitação para futuras concorrências, segundo noticiou o jornal Valor da quarta-feira 12. A restrição descarta grandes construtoras que estão em recuperação e preocupa um setor fragilizado pela Lava Jato. O futuro ministro mencionou a excelência das empresas envolvidas naquela operação e disse que se os administradores que se mostraram inidôneos foram punidos e as companhias adotaram medidas de governança, não há porque continuarem excluídas da contratação pública.

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As grandes empreiteiras brasileiras, antes com lugar garantido entre as maiores do mundo, encolheram após anos de Lava Jato e seu lugar foi ocupado por empresas médias, mostram informações oficiais das empresas relativas a 2017.  A que mais recebeu recursos da União e que era só a nona colocada no início da Lava Jato, a construtora Sanches Tripoloni, foi aquinhoada com 412 milhões de reais no ano passado. Em seguida vem a LCM Construção e Comércio, com 285 milhões e a Castilho Engenharia Empreendimentos, contemplada com 263 milhões. A Odebrecht, que tinha contratos superiores a 1 bilhão de reais em 2012, ficou em quarto lugar em 2017, com 228 milhões.

Além da Odebrecht, dentre as 21 empresas investigadas pela Lava Jato sete receberam recursos públicos em 2017, entre 10 milhões e 65 milhões cada uma: Mendes Júnior, Engevix, Galvão Engenharia, MPE, Nielsen Engenharia, Tomé Engenharia e Construcap.

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Nos Estados Unidos e na Europa, nos casos de inidoneidade pune-se executivos, impõe-se governança rígida às empresas que voltam a ser contratadas pelos governos em curto espaço de tempo. A suspensão durante anos seguidos, como ocorre no Brasil, de contratos governamentais para companhias que cometeram irregularidades mas têm grande importância sócio-econômica por gerarem emprego, arrecadação e riqueza é impensável nos países avançados. Lá a interdição de firmas envolvidas em ilícitos demora de alguns dias a cerca de um mês, mostram alguns casos representativos de gigantes globais como GE, IBM e Boeing nos EUA e Messerschmitt-Bölkow-Blohm e Volkswagen na Alemanha. Nas cinco companhias, os executivos foram punidos e as empresas, após assumirem compromissos rígidos de governança, pouco depois voltaram a contratar com o poder público.

A General Electric, a IBM e a Boeing, entre outras companhias afastadas das contratações públicas por inidoneidade, voltaram a operar com o governo pouco após atenderem às exigências da lei e dos tribunais. Os contratos da GE com o Pentágono, suspensos em 1992, foram retomados cinco dias mais tarde mediante a apresentação de um sistema de vigilância interna para evitar novas fraudes, conforme noticiou na ocasião o Los Angeles Times. A suspensão da contratação da Boeing pelo setor público em 2003 foi levantada um mês depois devido a “forte necessidade no interesse do país”, justificou o subsecretário da Força Aérea Peter B. Teets. A IBM retomou os contratos oito dias após a interdição determinada em 2008, segundo destacou a publicação especializada Public Contract Law Journal em 2009.

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Quanto a Volkswagen, tanto no caso recente da adulteração do mecanismo de controle de emissões dos veículos como no escândalo de distribuição de propina que envolveu o governador de Baden-Württemberg anos atrás, a Justiça puniu os executivos envolvidos e sequer cogitou cortar os contratos com o governo por um período que pudesse prejudicar a companhia. A fabricante de aviões e helicópteros Messerschmitt-Bölkow-Blohm,  envolvida em distribuição de propina, tampouco foi punida com corte duradouro dos seus contratos com o governo. Os executivos da montadora e do fabricante de aviões e as autoridades envolvidas foram severamente punidos, inclusive com prisão mas não houve solução de continuidade no relacionamento comercial das pessoas jurídicas com o poder público.

A legislação dos países avançados no caso da contratação pública contempla a punição dos indivíduos corruptos ou corruptores, a sua cooperação com as investigações, o ressarcimento total dos danos ao erário e ainda a criação de condições para as empresas envolvidas retomarem os contratos com o setor público o mais rápido possível, após a implantação de medidas severas de controle. As ações são regidas pelo instituto do self-cleaning ou auto-limpeza, parte essencial da Diretriz Europeia de Contratações Públicas implantada em 2014 e também da sua incorporação pelo sistema de contratações públicas do Reino Unido em fevereiro de 2015.  Esse recurso permite a extinção da proibição de licitar e contratar com a administração pública para a empresa que praticou irregularidades, mas cumpre o acordo de leniência. O mesmo procedimento é adotado há anos nos Estados Unidos.

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