Economia

As 350 pragas da Copa

O número de ameaças à nossa agropecuária parece-me dedução aritmética: 11,29 para cada país. E, como potência que são, é justo pensar os EUA como 64% responsáveis

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Ah, quanta coisa por causa da tal Copa que se pretende do Mundo, não fosse violentada por tantos. Fifa, Lula, Marin, Organizações Galvão-Globo, jornalistas esportivos, Pachecos, e os que achavam que não iríamos tê-la. Politizam-na, estupram-na, esquecendo-se que pela vigésima vez, depois da final, levantará a taça o futebol, esporte eterna paixão do planeta.

Inclusive no Qatar, pois não?

Estava eu aqui quieto, relembrando encantos recentes com as águas e poeiras do Vale do São Francisco, na preguiça de começar a ler o livro de Thomas Piketty (pra que, se tanto resenhado, comentado e combatido, como se o autor propusesse reerguer o Muro de Berlim?), quando a Copa Malmequer veio bater no meu sertão.

Revanchismo, sem dúvida. No período, nenhum canal de TV veio salvar-me da abstinência pré-Copa. Um joguinho da Série C que fosse.

Eis que uma Folha de nossa adversativa mídia alerta: o malfadado, indesejado, incompleto e superfaturado evento representaria grande ameaça para a saúde de nossa agropecuária.

Do jornalão: “As 31 delegações que virão ao País poderão trazer 350 pragas ainda inexistentes no Brasil. A maior ameaça vem dos norte-americanos, com 225 espécies. (…) As dificuldades no controle de entrada nos portos e aeroportos e a extensa fronteira seca brasileira estão tirando o sono de produtores de grãos, proteínas e hortifrútis e da indústria de defensivos”.

Cacete, pensei, vou ter que entrar nessa briga, logo agora, aliviado que estava com a volta do otimismo ao País. Ué, não perceberam? O crescimento da oposição nas pesquisas eleitorais fez subir a Bolsa de Valores.

Sou pessoa de estranhamentos. Das 31 delegações, logo tive certeza. Bastou-me contar o número de países participantes da Copa menos um.

As 350 pragas pareceram-me dedução aritmética: 11,29 para cada país. E, como potência que são, é justo pensar os EUA como 64% responsáveis.

Pronto! De forma nenhuma desconfiei que entre os turistas que poderão trazê-las estejam alguns representantes dos que ganharão bilhões de dólares combatendo-as.

Quem sabe como veio morar aqui certa Helicoverpa armigera, lagarta pródiga em causar prejuízos a produtores de grãos em diversas regiões agrícolas do Brasil, e que encheu os bolsos da indústria, fazendo a defesa sanitária brasileira permitir a importação de produtos com o benzoato de emamectina como princípio ativo?

O que reconhece o meu time de 11 leitores é o quanto sou ingênuo e crente de que o lucro está abaixo do respeito à vida.

A própria matéria se apressa em esclarecer: “O cenário que se apresenta nesta Copa preocupa a indústria produtora de defensivos. Com a globalização, a chegada de novas espécies ao país é inevitável, mas as indústrias têm de se preparar buscando conhecimento nos países de origem das pragas”.

Os responsáveis pelas entidades que representam a indústria de agrotóxicos opinaram e, como zelosos arqueiros, disseram-se preparados para qualquer ataque. Do governo, veio o mesmo: “estamos de olho”.

A matéria sugere suspeitos: “Algumas sedes vão receber concorrentes diretos do Brasil em alguns produtos e, com eles, poderão vir pragas inexistentes nas lavouras brasileiras. Um dos exemplos é Minas Gerais. Lá estarão jogando Colômbia e Costa Rica, dois importantes produtores de café”. Pobrezitos.

Leio que são esperados 600 mil turistas para a Copa. Segundo INFRAERO e ministério do Turismo, no ano de 2012, somente por via aérea, houve 10 milhões de desembarques internacionais no país.

Pessoas que poderiam ter pisado nas savanas africanas ou nas bem fornidas terras do Midwest norte-americano. Cultivadores de vespas vivas em caixas de Corn Flakes, talvez. Saudoso covilhanense trazendo em sua mala, disfarçado de notebook, um queijo português da Serra da Estrela para a tia Maria, que mora no Rio de Janeiro.

Ou mesmo um funcionário de multinacional de agrotóxicos sequioso por habilitar-se ao relógio de ouro pelos 25 anos dedicados à empresa.

Perigos que nunca corremos, trazidos agora por e pelas obras da Copa. Da mesma forma que soubemos que todas as nossas carências e mazelas estarem relacionadas aos dois eventos, entre 1950 e 2014. Um ferrou-nos no cabo, outro no rabo.

Pensando melhor, no entanto, e já que é para evitar malefícios ao país, não seria possível impedir a entrada no Brasil de pragas como Messi, Cristiano Ronaldo, Robben, Thomas Müller, Suarez, e alguns mais?

Eu aplaudiria. Logo atrás do Felipão.

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