Economia

A Semana do Mercado: Aumento dos juros, ‘surto inflacionário’ e ‘variável da política’ no radar

O editor de Finanças William Salasar apresenta as principais tendências da abertura dos mercados nesta segunda-feira 6

Edifício-sede do Banco Central, em Brasília. Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil
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A primeira semana do mês abre com apostas sobre o percentual de elevação da taxa básica de juros, a Selic, na reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central, nesta quarta-feira 8, com o cenário político amenizado pela aprovação da PEC dos Precatórios, na semana passada.

A maioria das apostas para a Selic é na direção de um aumento de 1,5 ponto percentual, elevando o juro básico de 7,75% a.a. para 9,25% – que é, aliás, a projeção consignada no Boletim Focus divulgado nesta manhã, sem mudanças em relação ao levantamento anterior. Já para 2022, os cem economistas ouvidos semanalmente pelo BC para monitorar as expectativas do mercado financeiro projetam a Selic a 11,25% ao ano, também sem alterações em relação à semana passada.

No entanto, o próprio presidente do BC, Roberto Campos Neto, reiterou que há um “surto inflacionário” no País, que a inflação está disseminada e persistente e que os núcleos dos índices de preços “estão bastante fora dos padrões normais”, admitindo que existe “importação de inflação”.

“Minha impressão é que, como Campos Neto falou em surto inflacionário, é possível que o Copom dê um salto maior, talvez de 2 pontos percentuais”, aventa o economista André Roncaglia, professor da Universidade Federal de São Paulo, que, no entanto, divide a probabilidade em 60% para a elevação usual de 1,5 ponto percentual e 40% para uma taxa mais agressiva.

“Já há sinais, lá fora, de arrefecimento dos preços do petróleo e de alimentos; o difícil é saber com que rapidez esses dados vão ser repassados para a percepção do Copom, dada a defasagem entre os movimentos internacionais e o que ocorre com os preços domésticos. Como o Copom pode ter a intenção de, realmente, ancorar as expectativas inflacionárias, é possível que queira mostrar serviço agora e, dada a comunicação do presidente, que acho que não foi impulsiva, porque nenhum banqueiro central recorre ao termo surto inflacionário sem querer passar uma noção de vigilância e de observação do que está acontecendo, acho que pode ter sinalizado algo um pouco maior que 1,5 ponto, então pode ser 2.”

“A inflação está desacelerando mas ainda bastante pressionada. Então, olhando do ponto de vista do Banco Central e do Comitê, é possível que pretendam acelerar um pouco a retomada da taxa de juro real, para poder mostrar que estão falando sério”, pondera o economista.

A percepção de inflação persistente é clara no Focus: pela 35ª semana consecutiva os economistas consultados pelo BC reviram para cima suas projeções para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, o IPCA: de 10,15% para 10,18% para 2021. Para 2022, a estimativa avançou mais uma vez: de 5,00% para 5,02%. Para o ano seguinte, passou de 3,42% para 3,50%.

Também subiu a mediana das previsões para o dólar, com o mercado agora projetando que a moeda encerre o ano em 5,56 reais, ante os 5,50 reais que vinha mantendo há pelo menos quatro semanas. Do mesmo modo, para 2022, a projeção subiu de 5,50 para 5,55 reais.

“A normalização da política monetária americana e a retirada de estímulos antecipada com provável alta de juros norte-americanos antes do que se pensava pode até ofuscar o Copom desta semana em relação ao câmbio”, adverte Vanessa Blum Colloca, diretora da corretora de câmbio GetMoney.

A expectativa de valorização do dólar – em todos os mercados, frise-se – decorre pelos depoimentos de Jerome Powell, presidente do Federal Reserve, o banco central americano, no Congresso dos Estados Unidos. Na terça-feira 30, ele falou diante do Comitê de Assuntos Financeiros, Habitação e Urbanismo do Senado e, na quarta-feira 1º, foi a vez do Comitê de Serviços Financeiros da Câmara dos Deputados. Foi nesta ocasião que Powell afirmou: “A palavra transitória deixou de ser adequada para descrever o que ocorre com a inflação.”

Ou seja, em vez de uma abordagem gradual de “normalização” da sua política monetária, o Fed deverá aumentar de 15 bilhões para 30 bilhões de dólares por mês o corte nas compras mensais de títulos públicos e hipotecas (que eram de 120 bilhões de dólares, desde o início da pandemia). Com isso, o programa de compras poderia acabar já no primeiro trimestre de 2022, e não em junho do ano que vem, abrindo caminho para o Fed começar a elevar a taxa de juros dos Fed Funds – a Selic norte-americana.  Consequência imediata, especuladores, empresas, pessoas, fundos, enfim, os agentes dos mercados mundiais tratam de se antecipar e comprar dólares para investir em títulos do Tesouro americano.

Isso desvia – ou diminui – o interesse por aplicações nos mercados emergentes, nos quais o risco maior só pode ser compensado por uma taxa de juros mais atrativa para o mundo e mais salgada para os nativos emergentes.

“Não podemos deixar de considerar o provável aumento dos juros nos EUA antes do esperado, que fortalece o dólar e não deixa o movimento de carry trade ser tão significativo”, sublinha Vanessa, referindo-se à arbitragem entre juros internacionais e juros locais, ou carry trade, que consiste em tomar dinheiro emprestado onde o juro é mais baixo, para aplicar onde ele é mais alto, ganhando a diferença entre as taxas.

“Mas esse aumento dos juros nos EUA é incerto por enquanto, uma vez que surgiram temores sobre efeitos potenciais da variante Ômicron do coronavírus sobre a economia global, dados abaixo do esperado do mercado de trabalho norte-americano e um tom persistentemente duro de membros do banco central dos EUA acerca da inflação”, acrescenta a especialista.

Na hora do almoço, o dólar comercial estava em 5,68, praticamente estável em relação ao fechamento da sexta.

Entretanto, aqui ainda entra no radar – e nos cálculos – a variável da política na precificarão do câmbio. Por isso, os investidores, operadores e agentes continuarão de olho na PEC dos Precatórios, que passou pelo Senado, porém com modificações que obrigam a novas votações na Câmara.

Deputados devem analisar as mudanças feitas no texto original da PEC, mas o regimento interno da Câmara deixa tal tarefa quase impossível de ser concluída ainda este ano. Isto porque o recesso parlamentar começa já no próximo dia 23 e ainda há esforços para construir e votar o orçamento de 2022. Os presidentes das Casas Legislativas continuam debatendo possíveis saídas alternativas.

Além disso, a cúpula do Congresso segue buscando uma maneira de reverter a suspensão do pagamento das emendas de relator, após decisão do Supremo Tribunal Federal.

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