Economia

A Semana do Mercado: à espera de Jackson Hole 

Ante a incerteza sobre o grau de aperto à atividade que o Fed está disposto a imprimir, os mercados de capitais operam em baixa na maior parte do mundo

Menor atratividade. O aumento dos juros básicos garante retornos com menor risco e afasta os investidores não habituais da Bolsa - Imagem: Miguel Schincariol/AFP
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Concentrando as especulações no simpósio anual do Fed em Jackson Hole, Wyoming, na próxima semana, as principais bolsas do mundo iniciaram a semana em queda, dando sequência à baixa iniciada no final da semana passada após a divulgação da ata da última reunião do Federal Open Market Committee (Fomc, o comitê americano de política monetária), que reacendeu os temores com a alta de juros e reverteu o ensaio de recuperação dos mercados. 

O Simpósio de Jackson Hole é um evento anual que reúne dirigentes de Bancos Centrais, acadêmicos e economistas de todo o mundo. Ante a incerteza sobre o grau de aperto à atividade que o Fed está disposto a imprimir para domar mais alta e renitente inflação dos últimos 40 anos, os mercados de capitais operam em baixa na maior parte do mundo – exceto pela Ásia, onde a China cortou suas taxas de empréstimos de um e cinco anos, uma semana após ter surpreendido os mercados cortando a taxa dos empréstimos interbancários de um dia.

O pronunciamento do presidente do Fed, Jerome Powell, marcado para a sexta-feira, segundo dia de evento, pode mudar o humor das bolsas. Diferentemente da maioria dos bancos centrais do mundo, o Fed norte-americano tem uma estrutura descentralizada, “federativa”. É formado por 12 distritos regionais, com seus próprios “governadores”, quatro dos quais se revezam nas reuniões do comitê de política monetária, junto com o governador do Fed de Nova York, que é membro permanente, vice-presidente e secretário do Fomc. Além dos cinco governadores distritais, o comitê é integrado ainda pelos sete membros do Conselho dos Governadores, que são, em geral, acadêmicos ou ex-dirigentes de instituições financeiras. Eles são indicados pelo presidente dos EUA e confirmados (ou não) pelo Senado.

Estes 12 integrantes do Fomc (sete membros do Conselho de Governadores e cinco governadores distritais), costumam se pronunciar, independentemente, sobre a política monetária, em eventos e entrevistas à imprensa, que os divide entre os “pombos”, aqueles que tendem a favorecer políticas monetárias mais brandas, e os “falcões”, que postulam políticas mais restritivas, fazendo taxas de juros, ações e contratos futuros bailarem – e as interpretações e especulações dos operadores, gestores e investidores. Na quinta-feira passada, por exemplo, o governador do Fed de St. Louis, James Bullard, disse que “se inclina por uma alta de 75 pontos-base neste momento” nos juros, na próxima reunião do Fed, em setembro, enquanto seu colega de Richmond, Tom Barkin, disse não ter certeza sobre se a próxima reunião, em setembro, trará alta de 50 ou de 75 pontos-base, embora reafirmasse o compromisso do BC norte-americano de “fazer o que for possível” para levar a inflação, que ronda os 7%, para a meta de 2% anuais. Com isso, as bolsas e as commodities caíram, enquanto os juros e o dólar subiam, na leitura de que um Fed “falcão” rima com economia em recessão. 

Por isso, a semana tende ser dominada pelas especulações sobre o que Powell dirá na próxima sexta-feira, à luz de uma série de indicadores da economia norte-americana programados para esta semana: índices de diretores de compras (PMIs), que apuram o humor da indústria e comércio com base na visão dos executivos responsáveis por encomendas de fábricas e lojas, nesta terça-feira, juntamente com as vendas de imóveis novos, indicador que tem se deteriorado nos últimos meses; na quinta-feira sai a segunda estimativa para o Produto Interno Bruto (PIB) americano no segundo trimestre, que já indicou queda de 0,9% na atividade e agora aponta para uma nova contração de 0,8% nesta segunda revisão, culminando na sexta com o indicador preferido do Fed para a inflação – o índice de Preços das Despesas do Consumidor (PCE), que roda à taxa de 6,8% em 12 meses, bem acima dos 2% da meta de inflação do Fed. 

Enquanto isso, o Banco do Povo, o BC chinês, surpreendeu com o novo corte nas suas taxas básicas de juros. Uma semana após ter cortado a taxa dos empréstimos por um dia (conhecido como “repo rate”, ou taxa de recompra, pela qual os BCs provêm socorro às instituições financeiras que estão com caixa negativo no final do dia, comprando títulos com compromisso de revendê-las no dia seguinte, ou seja, uma medida paliativa de curtíssimo prazo), o BC chinês cortou as taxas de empréstimos de um ano – que são a base da maioria das taxas dos bancos chineses – em cinco pontos percentuais, para 3,65% ao ano, e as de cinco anos em 15 pontos, para 4,30%. A taxa referencial de um ano foi reduzida pela última vez em janeiro. A taxa de cinco anos foi cortada pela última vez em maio, para amenizar a crise no mercado imobiliário chinês, já que ela é a referência para o crédito imobiliário. Os cortes indicam que as autoridades chinesas estão preocupadas com a desaceleração da economia, por causa das restrições impostas às atividades nas cidades afetadas por surtos de Covid 19 e a crise do mercado imobiliário.

Sobre o cenário inicial, agora oficial, da campanha eleitoral com pesquisas e sabatinas dos candidatos na imprensa, os mercados domésticos acompanham uma agenda econômica de poucos indicadores. Um dos principais destaques é a prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15), referente à primeira metade de agosto, que vai ser divulgado na quarta-feira. O Itaú espera por uma deflação de 0,84%, que, se confirmada, traria a inflação anual para abaixo de 10%, sendo mais uma vez puxada para baixo pela queda nos preços de petróleo e energia.

Refletindo essa expectativa, o Relatório Focus do BC divulgado agora cedo passou a estimar um IPCA abaixo de 7% neste ano e reduziu também a de 2023, pela primeira vez em 18 semanas consecutivas de alta. A expectativa dos mais de 100 economistas do mercado financeiro compulsados semanalmente para a elaboração do Focus traz queda de 7,0% para 6,82% na projeção do IPCA deste ano (há um mês era de 7,30%). Já a estimativa para o ano que vem caiu 5,38% para 5,33% (há quatro semanas era de 5,30%). Para 2024 e 2025, as projeções se mantiveram em 3,41% e 3,00%. Apesar das revisões para baixo da inflação deste e do próximo ano, elas ainda estão muito acima da meta do Banco Central (3,5% e 3,25%, respectivamente). Com a tolerância de 1,5 ponto percentual, a meta será cumprida se o IPCA ficar entre 2% a 5% em 2022 e entre 1,75% e 4,75% em 2023. Mesmo assim, o mercado manteve suas apostas para a Selic – a taxa básica de juros do BC – dos próximos anos (13,75% no fim de 2022, 11% no de 2023, 8,00% no de 2024 e 7,50% no de 2025).

Os prognósticos sobre o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) ficaram praticamente inalteradas, em 2,02%, ante 2% cravados na semana passada, e 0,41%, ante 0,39% para 2023. Para 2024 e 2025 elas continuam em 1,80% e 2,00%. 

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