A política de Estado da Coreia

No começo, o país exportava itens simples e eletrônicos baratos. Acumulavam-se divisas para, então, adquirir máquinas avançadas para os novos setores

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Alguns dados importantes sobre o modelo coreano e as chamadas políticas de Estado – aquelas que ultrapassam meros períodos de governo.

Já na década de 50, havia sinais de que a Coreia começava a trabalhar uma visão estratégica de desenvolvimento. O Brasil começava a trilhar essa busca. À esquerda – com Rômulo de Almeida, Celso Furtado – e à direita – com Roberto Campos, Octávio Gouvea de Bulhões, Eugênio Gudin – havia a prospecção para as novas etapas, após o primeiro e segundo governo Vargas.

Uma das peças do milagre coreano foi a desvalorização cambial, que permitiu ao país exportar produtos de baixo valor agregado, mas que lhe permitiram acumular divisas para financiar setores novos.

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No curto governo Café Filho, Eugênio Gudin defendeu o caminho da desvalorização cambial pelo Brasil. No governo JK, a proposta voltou a ser defendida por Roberto Campos. Foi torpedeada por Augusto Frederico Schmidt, advogado e poeta altamente influente.

Campos me disse que a preocupação de Schmidt foi em relação a máquinas importadas por um empresário amigo, que ficaria inadimplente com a desvalorização. Não se perca de vista que o próprio Schmidt, ao lado de Lulu Aranha (irmão de Oswaldo Aranha) tinha enormes poderes e interesses sobre a Cexim (a Carteia de Exportações e Importações, que regulava as tarifas externas). Mas pode ser que o próprio JK temesse um recrudescimento da inflação.


O fato é que o país abdicou dessa saída cambial.

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No caso da Coreia, foi o primeiro passo apenas.

A busca do mercado externo revelou a vocação dos primeiros grupos empresariais. Nas décadas seguintes, seriam acertadas grandes parcerias do governo com o setor privado.

Estudos meticulosos selecionaram setores promissores – aliás, não era mistério para ninguém que eletroeletrônicos, automobilístico estariam entre eles. O governo estimulou a entrada de grupos coreanos e os defendeu, durante algum tempo, com proteção tarifária, subsídios e promoção de exportações por meio de agências públicas.

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O controle total sobre o sistema bancário garantiu o crédito para os novos setores. Em áreas em que o setor privado não tinha condições de atuar, entravam empresas públicas, como a siderúrgica POSCO.

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Não havia embates entre privativistas e estatizantes, mas um amplo pragmatismo. Onde coubesse o setor privado, ele seria estimulado. Onde se exigisse participação pública, ela seria implementada. Quando empresas privadas eram mal geridas, o governo estatizava, saneava e revendia.

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Havia também um controle rígido sobre moedas estrangeiras. Quem violasse as normas poderia ser condenado à morte. Havia prioridade absoluta para o uso de divisas na importação de máquinas especiais e insumos industriais.

O capital externo era direcionado para setores previamente selecionados. E estimulava-se a “engenharia reversa” e a pirataria mais escancarada.


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No começo, o país exportava itens simples e eletrônicos baratos. Acumulavam-se divisas para, então, adquirir máquinas avançadas para os novos setores.

O conceito de proteção à indústria nascente era rigidamente obedecido. Não se pensava em criar proteção eterna, mas apenas o tempo necessário para que as empresas tivessem condições de enfrentar a concorrência internacional.

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