Economia

“Sem ajuste fiscal, juros não vão descer”, diz Levy

Em debate de sete horas no Senado, ministro da Fazenda defende medidas recentes. No apoio e nas críticas a ele, timidez

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, durante a audiência no Senado, nesta terça-feira
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O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, encarou nesta terça-feira 31 sua primeira audiência pública no Congresso. Em mais de sete horas na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, defendeu o ajuste fiscal com um discurso já ensaiado no governo de que é necessário para garantir a retomada do crescimento da economia, da geração de empregos e da renda dos trabalhadores. Pelo segundo dia seguido, repetiu que o ajuste é vital para o Brasil não ser rebaixado pelas agências de rating. E ensaiou um argumento até agora inédito em seus pronunciamentos recentes: “Sem o ajuste fiscal, os juros não vão descer”.

Após quatro altas consecutivas promovidas pelo Banco Central na chamada Selic, sendo a última no início de março, o País tem hoje a maior real de juros (descontada a inflação) do mundo. Algo em torno de 5% ao ano. Na visão de Levy, um implicante com a Selic desde seus tempos de secretário do Tesouro Nacional no primeiro governo Lula (2003-2006), o ajuste fiscal será capaz de domar o aumento da dívida pública. E o tamanho da dívida é um dos principais argumentos usados pelo “mercado” para cobrar juros pesados – Selic entre eles – na rolagem desta mesma dívida.

O tema “juros” não despertou interesse durante uma das mais longas sessões dos últimos tempos na CAE. Dos 27 senadores a sabatinar Levy, só dois tocaram no assunto, Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e José Serra (PSDB-SP), ambos com críticas à Selic e a culpá-la pela drenagem de recursos orçamentários.

Houve um quase silêncio também em relação a um outro tema de interesse do sistema financeiro. Segundo a Operação Zelotes, deflagrada na quinta-feira 26, grandes contribuintes – muitos bancos entre eles – contratavam escritórios de consultoria para anular ou reduzir o pagamento de impostos em processos no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão subordinado a Levy. Só o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) questionou-o a respeito da operação, uma parceria entre a Corregedoria do Ministério da Fazenda, a Receita Federal, a Polícia Federal e o Ministério Público.

O ministro respondeu que não queria “fazer espalhafato” sobre o assunto e garantiu que se empenha por fortalecer o Carf. Se as contestações tributárias no órgão forem decididas sem manipulações, haveria aí uma fonte de arrecadação. Assim, disse Levy, diminuem “a necessidade de se aumentarem impostos” e “os riscos de desvio”.

A Zelotes debruça-se sobre 70 processos posteriores ao fim de 2013 cujos valores totais somam 19 bilhões de reais. É praticamente a mesma quantia que o governo espera economizar com a restrição de pagamento do seguro-desemprego, abono salarial e pensão por morte, proposta feita pelo Palácio do Planalto em duas medidas provisórias a desmotivarem partidários de Dilma Rousseff.

Levy disse que tais mudanças não são parte do ajuste fiscal. Segundo ele, trata-se de corrigir distorções e de um “ajuste econômico” capaz de melhorar a competitividade da economia brasileira. Argumentos a merecer uma reação de “perplexidade” por parte do senador governista Walter Pinheiro (PT-BA).

De acordo com o ministro, o governo precisa fazer um ajuste, e “rápido”, para recuperar o fôlego financeiro após um período de deterioração fiscal visível em 2014. Tal deterioração teria sido causada sobretudo pela decisão do governo de abrir mão de cobrar certos impostos. Foi o caso da desoneração da folha de pagamentos das empresas em vários setores. A tributação passou para o faturamento das firmas, opção a resultar em uma perda estimada em 25 bilhões anuais.

A volta da regra antiga, ao menos para uma parte dos setores empresariais envolvidos, é uma das medidas mais polêmicas do ajuste. O presidente do Congresso, Renan Calheiros, devolveu a medida provisória com tal conteúdo assinada por Dilma, obrigando o governo a aceitar discutir o tema em um projeto de lei, instrumento que não tem a eficácia imediata de uma MP. Levy defendeu a aprovação da lei o quanto antes, para que em 2016 a mudança já esteja consumada e pronta para gerar aumento da arrecadação.

Durante a sabatina, ele tentou mostrar que o governo não tem apenas um ajuste fiscal a propor, também tem um plano de retomada do crescimento, uma reivindicação de muitos parlamentares governistas temerosos da impopularidade do ajuste. Ele citou as concessões de obras públicas, o pacote em gestação de incentivo às exportações, medidas de incentivo aos empréstimos dos bancos privados e a reforma de dois tributos federais (PIS e Cofins). E defendeu o fim da guerra fiscal entre os estados, com uma nova lei do ICMS, algo que poderia estimular investimentos privados.

Apesar do esforço de Levy para convencer que o ajuste “não toca em um centavo do Bolsa Família” e busca “consolidar ganhos sociais” e “fortalecer a nova classe média”, sua passagem pelo Senado recebeu uma reação tímida dos governistas, que pouco se animaram a defender as propostas do Planalto. Já os oposicionistas fizeram críticas igualmente tímidas e, para quem tinha uma agenda parecida na eleição, pouco sinceras. O tucano Aécio Neves quis saber por que “um ajuste tão duro”. Ronaldo Caiado e José Agripino, ambos do DEM, disseram que o pacote sacrifica a população.

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