Do Micro Ao Macro
Turnover de 40% expõe crise no recrutamento tech
Turnover elevado, processos seletivos longos e falta de transparência ampliam custos e revelam perda de confiança de profissionais no mercado de tecnologia
O turnover de até 40% no primeiro ano de contratação acendeu um alerta no setor de tecnologia. Empresas enfrentam uma crise de confiança nos processos de recrutamento, marcada por seleções extensas, desalinhamento cultural e avaliações pouco conectadas à realidade do negócio. O resultado é uma combinação de vagas abertas por até 90 dias, recontratações frequentes e aumento do retrabalho interno.
O diagnóstico é da HumanAZ, consultoria especializada em recrutamento baseado em competências e cultura organizacional. Segundo a empresa, o problema vai além da escassez de profissionais e está diretamente ligado ao modelo de seleção adotado por boa parte do mercado.
Processos longos elevam o turnover
Na tentativa de reduzir erros de contratação, muitas empresas ampliaram o número de etapas, testes e entrevistas. Esse movimento, porém, tem efeito contrário. O excesso de filtros aumenta o tempo de fechamento das vagas e afasta candidatos que recebem propostas mais rápidas.
Para Rodrigo Curcio, CEO da HumanAZ, o modelo atual perdeu eficiência. “Criou-se a ideia de que mais etapas significam mais qualidade. Na prática, o processo ficou desgastante, pouco produtivo e contribui diretamente para o turnover elevado”, afirma. Segundo ele, empresas que simplificarem a jornada do candidato tendem a ganhar vantagem competitiva.
Escassez de talentos agrava o cenário
O impacto do turnover ocorre em um contexto de déficit estrutural de profissionais. Estudo do Google em parceria com a Brasscom aponta que o Brasil pode encerrar 2025 com falta de cerca de 530 mil profissionais de tecnologia. A formação anual, porém, gira em torno de 53 mil novos tecnólogos.
Mesmo com essa demanda crescente, muitas vagas seguem abertas por meses. O dado reforça que o problema não está apenas na falta de mão de obra, mas na inadequação dos métodos de recrutamento frente à dinâmica do setor.
Investimentos aumentam a pressão por eficiência
O aquecimento do mercado amplia a urgência por processos mais ágeis. Segundo o Relatório Setorial da Brasscom, os investimentos em Tecnologias da Informação e Comunicação devem alcançar R$ 729 bilhões até 2027. A expectativa é de criação de até 147 mil empregos formais por ano, número muito superior à capacidade de formação atual.
Esse descompasso tende a intensificar a disputa por talentos e penalizar empresas com fluxos seletivos lentos, excessivamente técnicos ou desconectados da prática cotidiana.
Perfil do profissional muda expectativas
Outro fator que pressiona o turnover é a mudança no perfil dos profissionais de tecnologia. Em um mercado aquecido, candidatos priorizam propósito, aprendizado contínuo e ambiente de trabalho saudável. Cresce a insatisfação com testes técnicos longos, não remunerados e sem relação direta com o dia a dia da função.
Essas críticas aparecem com frequência em comunidades especializadas e redes sociais, ampliando a percepção negativa sobre processos seletivos tradicionais.
Recrutamento como ferramenta de retenção
Para Curcio, a redução do turnover passa por uma mudança de abordagem. “Contratar apenas pelo diploma ou pela stack tecnológica não garante resultado. Quando o recrutamento avalia competências reais e alinhamento cultural, ele deixa de ser um custo e passa a ser um ativo estratégico”, diz.
Nesse modelo, clareza, empatia e transparência ganham peso semelhante às habilidades técnicas. O objetivo é reduzir a rotatividade, acelerar contratações e construir relações mais estáveis entre empresas e profissionais.
O turnover de 40% no setor de tecnologia, portanto, não é apenas um indicador de saída de funcionários. Ele revela falhas estruturais no recrutamento e reforça a necessidade de processos mais simples, humanos e conectados à realidade do trabalho.
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