Do Micro Ao Macro
Neurocientista explica a pressão pela produtividade e seus efeitos na saúde mental
Especialista questiona a cultura do “fazer” constante e propõe reflexões sobre a real necessidade de ser sempre produtivo


Hoje, muitos profissionais seguem em uma busca constante por técnicas que aumentem a produtividade, focando em entregar cada vez mais. No entanto, segundo Joana Coelho, neurocientista e consultora da Nêmesis, é importante refletir: “Por que estamos almejando níveis tão altos de produtividade, muitas vezes em detrimento de aspectos que garantem nossa qualidade de vida?”
Quando analisamos nossa relação com o trabalho, percebemos que a cultura atual valoriza a produção acima de tudo. Momentos livres, quando não estamos trabalhando, acabam sendo vistos como desperdício de tempo.
Coelho explica que essa mentalidade é reforçada ao longo da vida, com crenças que associam valor à produtividade constante. “Nossa sociedade ensina a medir desempenho pelo tempo dedicado ao trabalho, o que nos impede de aproveitar o ócio”, comenta ela.
Assim, não é raro ver pessoas tentando preencher qualquer tempo livre com tarefas produtivas. Muitas vezes, utilizam esse tempo adiantando entregas, fazendo cursos ou investindo em atividades paralelas.
Essa pressão por preencher cada minuto acaba consumindo o tempo que poderia ser de descanso. Com isso, a oportunidade de relaxar se perde, e o cansaço aumenta.
Ambiente profissional e a pressão por resultados
Além disso, o cenário atual no mercado de trabalho incentiva a busca pelo crescimento rápido. Por um lado, o desenvolvimento na carreira é positivo, pois estabelece metas e traz satisfação.
Mas, por outro, o imediatismo das metas e expectativas nas empresas intensifica a pressão para que os profissionais sejam mais produtivos e busquem crescimento constante.
Para Coelho, essa lógica está atrelada à necessidade de cumprir metas, superar expectativas e desenvolver habilidades continuamente. No entanto, ela alerta: “O efeito dessa pressão é muitas vezes um desequilíbrio que afeta a saúde física e mental.”
Assim, ao tentar ser produtivos o tempo todo, acabamos prolongando as horas de trabalho. Esse hábito gera esgotamento e compromete a qualidade de vida.
A influência social e a dificuldade de mudar
Mesmo percebendo os efeitos negativos dessa busca por produtividade, a maioria das pessoas ainda se vê presa a ela. Para Coelho, essa dificuldade em mudar ocorre porque vivemos em uma sociedade que valoriza o “fazer”.
Ela explica que “a conformidade social nos leva a adotar o comportamento do grupo, impedindo que questionemos se ele realmente nos beneficia.” Nesse sentido, seguir a lógica coletiva parece a opção mais segura, ainda que possa nos prejudicar.
Ainda assim, existe uma mudança gradual na forma como as pessoas encaram o trabalho. A conscientização sobre a importância do equilíbrio entre descanso e produtividade está crescendo, o que permite uma visão mais ampla sobre o uso do tempo.
Reflexões para uma rotina mais equilibrada
Coelho sugere algumas reflexões para quem deseja repensar sua relação com a produtividade.
-
Estabeleça prioridades para aspectos importantes da vida pessoal e profissional
Muitas vezes, a pressão por produtividade e o ritmo do dia a dia fazem com que percamos de vista o que realmente importa. “Definir prioridades ajuda a preservar o que é importante, como atividades físicas, momentos com a família e conversas de qualidade com a equipe”, afirma Coelho. -
Questione a necessidade de ocupar o tempo livre com mais tarefas
Para mudar um comportamento enraizado, é necessário entender o que o motiva e trabalhar para alterá-lo. Coelho recomenda que, ao surgir um tempo livre, você questione a urgência de preenchê-lo com uma nova demanda. Muitas vezes, a tarefa pode ser adiada para outro momento sem prejuízo. -
Reconheça o que você já produziu durante o dia
Segundo Coelho, “a velocidade do dia a dia muitas vezes nos leva a focar no que ainda não fizemos”. Ela sugere que reconhecer as entregas realizadas ao longo do dia pode ajudar a manter um equilíbrio saudável. Isso evita a sensação constante de dívida e proporciona uma visão mais clara do que já foi alcançado.
Essas práticas permitem que o profissional reavalie o uso do seu tempo, promovendo uma rotina que equilibre produtividade e momentos de descanso. Dessa forma, é possível alcançar um cotidiano mais saudável e menos desgastante.
Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome
Muita gente esqueceu o que escreveu, disse ou defendeu. Nós não. O compromisso de CartaCapital com os princípios do bom jornalismo permanece o mesmo.
O combate à desigualdade nos importa. A denúncia das injustiças importa. Importa uma democracia digna do nome. Importa o apego à verdade factual e a honestidade.
Estamos aqui, há 30 anos, porque nos importamos. Como nossos fiéis leitores, CartaCapital segue atenta.
Se o bom jornalismo também importa para você, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal de CartaCapital ou contribua com o quanto puder.