Do Micro Ao Macro
Fim do funil? Marcas repensam marketing e priorizam relacionamento, recorrência e valor contínuo
Com jornadas imprevisíveis e mais de 500 interações digitais antes da compra, empresas abandonam lógica linear e focam em permanência


Durante anos, o funil de vendas foi a principal estrutura usada por marcas e agências para guiar estratégias de marketing. Baseado em etapas bem definidas — da descoberta à conversão —, o modelo ajudava a mapear o comportamento de consumo de forma linear. Mas essa lógica está perdendo espaço.
Com a multiplicação dos pontos de contato e a mudança no comportamento do consumidor, empresas têm abandonado a obsessão pela conversão imediata. Em seu lugar, surgem métricas como lifetime value (LTV), taxa de recompra e engajamento contínuo — indicadores que avaliam a relação no longo prazo, e não apenas o ato da compra.
Decisão de compra em looping
Segundo o estudo Decoding Decisions, do Think with Google, o processo de compra se tornou altamente fragmentado. Um consumidor pode interagir com mais de 500 conteúdos digitais antes de tomar uma decisão em produtos de maior envolvimento. Ele pesquisa, compara, retrocede e volta a interagir mesmo depois de comprar.
“O consumidor entra e sai do funil em múltiplos pontos, misturando descoberta, comparação e recompra. Isso exige abandonar métricas centradas apenas na conversão imediata”, afirma Pedro Paulo Alves, cofundador da Boomer.
Engajamento contínuo
No lugar do funil tradicional, ganha força a lógica de looping, onde a venda não é o fim, mas o início de um ciclo. Nesse novo modelo, o cliente pode voltar a descobrir a marca depois da compra ou avançar direto para uma nova transação com base em boas experiências anteriores.
“A pergunta deixou de ser ‘como converter mais?’ para se tornar ‘como criar valor contínuo?’”, resume Alves.
Conteúdo passa a formar um ecossistema
A mudança afeta a forma como marcas produzem conteúdo. Em vez de campanhas isoladas voltadas para leads, o conteúdo agora integra um ecossistema permanente, com foco em educação, comunidade e utilidade prática.
De acordo com levantamento da Salesforce, 88% dos consumidores afirmam que a experiência é tão importante quanto o produto. Isso posiciona o conteúdo como um ativo central para fidelização e reputação.
Mídia acompanha toda a jornada do cliente
O investimento em mídia também muda de perfil. As marcas estão distribuindo esforços em toda a jornada, incluindo canais próprios e estratégias de pós-venda. Ganha espaço o e-mail marketing, programas de fidelidade, CRM multicanal e influenciadores de nicho.
Em vez de concentrar verba em anúncios de performance voltados à aquisição, a lógica agora é sustentar a relação com o cliente ao longo do tempo.
KPIs refletem valor e relacionamento
A nova abordagem exige novos indicadores. Marcas mais maduras estão substituindo métricas como CPL e taxa de clique por:
- LTV: valor total que um cliente gera ao longo da sua relação com a marca;
- Taxa de recompra: proporção de clientes que compram novamente;
- Retenção: tempo médio de permanência do cliente ativo;
- Engajamento contínuo: interações recorrentes como abertura de e-mails e uso de apps.
“Essas métricas representam uma visão mais estratégica. É menos sobre retorno imediato, e mais sobre construir ativos duradouros como comunidade e fidelização”, reforça Pedro Paulo.
Crescimento exige mudança de cultura
Mais do que implantar ferramentas, esse novo marketing exige uma transformação cultural nas empresas. Para Pedro Paulo, é preciso rever estruturas, processos criativos e, sobretudo, o que se entende por crescimento.
“Não é só tecnologia. É uma mudança de mentalidade. É entender que crescer pode significar engajar, reter e gerar valor — não apenas converter”, afirma o especialista.
Setores com alta recorrência, como alimentação, moda, assinaturas e tecnologia, já sentem os efeitos dessa transição. E, segundo ele, as marcas que liderarem essa virada devem conquistar uma vantagem difícil de ser replicada.
Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome
Depois de anos bicudos, voltamos a um Brasil minimamente normal. Este novo normal, contudo, segue repleto de incertezas. A ameaça bolsonarista persiste e os apetites do mercado e do Congresso continuam a pressionar o governo. Lá fora, o avanço global da extrema-direita e a brutalidade em Gaza e na Ucrânia arriscam implodir os frágeis alicerces da governança mundial.
CartaCapital não tem o apoio de bancos e fundações. Sobrevive, unicamente, da venda de anúncios e projetos e das contribuições de seus leitores. E seu apoio, leitor, é cada vez mais fundamental.
Não deixe a Carta parar. Se você valoriza o bom jornalismo, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal da revista ou contribua com o quanto puder.
Leia também

WhatsApp redefine jornadas de compra e transforma o funil em rede de conversas
Por Do Micro ao Macro
Veja cinco tendências que melhoram sua comunicação visual no varejo e no marketing
Por Do Micro ao Macro