Do Micro Ao Macro
Exportadores veem pessimismo crescer com alta das tarifas nos EUA
Índice de confiança cai e expectativa para próximos seis meses recua com impacto sobre micro e pequenas empresas


O aumento das tarifas de até 50% imposto pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros já afeta diretamente o comércio exterior. Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que o Índice de Confiança do Empresário Industrial exportador (ICEI) caiu de 50,2 pontos em junho para 45,6 pontos em agosto. O indicador, que mede a percepção do setor, passou da faixa de otimismo para pessimismo.
No mesmo período, o Índice de Expectativas, que projeta os próximos seis meses, também recuou: de 52,2 para 47,2 pontos.
Exportações atingidas
De acordo com a CNI, 41,4% da pauta exportadora brasileira destinada aos EUA está sujeita à tarifa combinada de 50%, o equivalente a US$ 17,5 bilhões em 2024. Nos setores de transformação, o impacto chega a US$ 12,3 bilhões.
A pressão sobre as empresas é ampliada pelo ambiente doméstico. Os juros elevados no Brasil elevaram a inadimplência empresarial a R$ 182 bilhões em maio, segundo a Serasa Experian, o maior patamar desde 2016. O peso é maior sobre micro, pequenas e médias empresas.
Revisão de contratos
Para Carol Monteiro, sócia do Monteiro & Weiss Trade e especialista em comércio internacional e direito aduaneiro, o momento pede cautela. Segundo ela, a revisão contratual deve ser prioridade.
“Desde que tais cláusulas estejam previstas, é essencial demonstrar que houve mudança imprevisível de circunstâncias que inviabilizou o contrato nas condições originais. Durante a pandemia, muitas empresas recorreram à força maior, o que levou ao aprimoramento dessas disposições, ampliando-as para além de desastres naturais, a fim de contemplar eventos que afetem o comércio global”, afirma.
No caso das tarifas americanas, a advogada explica que a onerosidade excessiva pode ser mais aplicável do que a força maior. “O cumprimento não é impossível, mas se tornou demasiadamente oneroso. Isso permite avaliar a possibilidade de renegociação”, observa.
Pontos de atenção
Monteiro recomenda que contratos de exportação e de fornecimento sejam analisados de forma ampla. “É fundamental revisar não apenas os contratos de exportação para os EUA, mas também os de fornecedores. Essa análise deve abranger a classificação fiscal dos produtos, já que setores como automotivo, aço e alumínio estão sujeitos a tarifas diferenciadas ou a investigações em andamento. Também devem ser revistos termos de venda, condições de pagamento e responsabilidades diante de alterações tarifárias, inclusive quanto à destinação de mercadorias em trânsito”, detalha.
Medidas oficiais
O governo brasileiro anunciou medidas como a prorrogação de prazos do drawback, linhas de crédito, programas de apoio e o REINTEGRA. No campo internacional, já apresentou pedido de consultas na Organização Mundial do Comércio (OMC) e participa de processos relacionados à Seção 301 nos EUA.
Segundo Monteiro, ainda é preciso aguardar a regulamentação: “O setor privado acompanha os desdobramentos das medidas anunciadas e espera definições mais claras para a sua aplicação prática”, afirma.
Diversificação de mercados
Na avaliação da especialista, o momento exige estratégia. “A diversificação de mercados é fundamental para reduzir a dependência de um único destino. O governo tem envidado esforços nesse sentido, mas a participação ativa do setor privado é igualmente necessária, seja em consultas públicas ou em iniciativas de promoção comercial. É imprescindível realizar uma análise detalhada da estrutura tarifária de cada país, além de prever em contrato responsabilidades, termos de venda e mecanismos de reajuste em caso de alterações tarifárias”, conclui.
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