Cultura

Temer, Doria, Lava Jato: marchinhas sobre política continuam em alta

Após Dilma e Cunha estrelarem diversos sambas e paródias em 2016, peemedebista e prefeito de São Paulo são alvos de gozações

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A marchinha é um dos gêneros musicais mais identificados com a crônica política e a sátira de figuras públicas no Brasil. Predominante no carnaval do Rio de Janeiro entre as décadas 1920 e 1960, quando perdeu espaço para o samba-enredo, o estilo jamais furtou-se de ironizar os presidentes e políticos nativos.

Responsável por um dos governos mais repressivos da história republicana, marcado pela censura e pela perseguição aos movimentos tenentista e operário, Arthur Bernardes foi um dos primeiros alvos dos compositores de marchinhas, que lhe dedicaram as irônicas “Fala Baixo” e “Ai, seu Mé”, ambas de 1921, ano de campanha presidencial.

A primeira expunha o clima pesado no ambiente político da época e mencionava Bernardes por um de seus apelidos, “Rolinha”. A segunda traz no título outra alcunha popular do presidente mineiro, “Seu Mé”, e pedia a Bernardes para “baixar a crista”. Praticamente todos os presidentes até os anos 1960 seriam alvos de gozações ou homenagens de compositores.

Embora tenham perdido fôlego nas últimas décadas, as marchinhas de carnaval com temas políticos têm retornado à cena, principalmente por causa do resgate do carnaval de rua e do conturbado clima político do País.

No Carnaval de 2016, Dilma Rousseff e Eduardo Cunha, polos opostos do processo de impeachment que culminou na ascensão de Michel Temer, foram os principais alvos das marchinhas, muitas delas consagradas menos pelos blocos de carnaval e mais pela viralização nas redes sociais. Grupos como Os Marcheiros e Orquestra Royal têm sido um dos grandes responsáveis pelo fôlego atual do gênero. 

Neste carnaval, há novos alvos. Temer recebeu diversas “homenagens”, que vão desde sua suposta aparência soturna à polêmica sobre a compra de sorvetes da Häagen-Dazs para o avião presidencial, licitação cancelada posteriomente. Outro que não escapou de paródias e marchinhas foi o tucano João Doria, prefeito de São Paulo, ironizado por suas incursões como gari nas ruas da capital paulista e sua obsessão contra grafites e pichações. 

A Lava Jato continua sendo a principal matéria de poesia dos compositores. Após o sucesso da marchinha do “Japonês da Federal”, o grupo Os Marcheiros não poupou o novo personagem da Operação, “o lenhador da federal”, apelido dado ao agente da Polícia Federal Lucas Valença, alçado à fama após conduzir Cunha à prisão.

Os políticos citados por seus apelidos na lista de supostas propinas pagas pela Odebrecht também não escapam das gozações, assim como Eike Batista e o PSDB, partido homenageado pela marchinha “Solta o Cano”, da Orquestra Royal.    

Confira abaixo dez composições e paródias que prometem ganhar as ruas no carnaval de 2017. Ou, ao menos, as timelines das redes sociais. 

Michel Temer

Presidento da Transilvânia

Em “Presidento da Transilvânia”, Os Marcheiros brincam com uma suposta familiaridade de Temer com entidades malignas, boato que foi alvo de um acalorado discurso do deputado Cabo Daciolo em novembro passado, quando pediu durante sessão da Câmara para o peemedebista “abandonar o satanismo”. A marchinha brinca que Temer “montou uma gangue para o inferno governar” e “muitos sinistros foi buscar no cemitério/ Para formar seu ministério”.

Häagen-Dazs

Paródia de “Caviar”, sucesso na voz de Zeca Pagodinho, “Você sabe o que é Häagen-Dazs“, também do grupo Os Marcheiros, tripudia de uma licitação aberta por Temer para estocar alimentos no avião presidencial. Originalmente, foi previsto gastos de 1,75 milhão de reais, sendo 7,5 mil para a aquisição de 500 potes da marca norte-americana de sorvete. O peemedebista cancelou a licitação após a péssima repercussão, mas os compositores não perderam a piada.  

Bota para Fora!

Nesta marchinha, o refrão resume o incômodo de muitos com o atual presidente: “Tô engasgado mas coloco para fora/ Chega de Temer”.

João Doria

Dança da Vassoura

Em mais uma paródia, desta vez de Dança da Vassoura, do Grupo Molejo, Os Marcheiros brincam com o fato de Doria ter se vestido de gari para varrer as ruas de São Paulo em seu primeiro compromisso como prefeito. Os versos inciais, “Se eu vou no Rubaiyat eu vou varrendo/ Se eu vou lá no Fasano, eu vou varrendo” mencionam dois restaurantes caros de São Paulo, habitualmente frequentados pela elite da capital paulista.  Atrasada para o primeiro evento no qual Doria trajou-se de Gari, Soninha Francine, secretária de Assistência Social, também é alvo da brincadeira. “Ô Soninha, eu sou seu fã/ varrer contigo às seis da manhã”. 

Pinto por Cima

Composta pela banda mineira Orquestra Royal, a marchinha “Pinto por cima” promete ser um dos maiores sucessos políticos deste carnaval. Cheia de figuras de duplo sentido, entre elas “Eu quero ver se eu pinto inteiro/ Um muro de Moema até o Brás”, a marchinha ridiculariza a obsessão do prefeito contra as pichações, o grafite e a arte de rua na cidade. 

Lava Jato

Marchinha do Lenhador da Federal

Ao escoltar Cunha, Lucas Valença, agente da Polícia Federal, tornou-se uma celebridade instantânea por seu visual hipster –embora o próprio prefira a classificação “lenhador”. O sucesso de Valença rendeu uma marchinha em sua homenagem, a exemplo de Newton Ishii, o “Japonês da Federal”, também alvo das brincadeiras do grupo Os Marcheiros. Nesta composição, ser preso pelo agente da PF não parece nada mal. “Estava sozinho no culto/ Rezando para não ir para  o xadrez/Escutei meu coração/ Avistei o garotão/ Dei um sorriso, o lenhador então falou/ Vem pra cá/ Eu disse “claro, pode até me algemar.” 

Vara do Juiz

Sérgio Moro também é alvo de piadas de duplo sentido. Nesta marchinha, o medo de muitos de encarar o juiz federal é a tônica: “Companheiro, o que foi que eu fiz/ Pra cair na vara desse juiz”. 

Marchinha dos Codinomes

Divulgada em dezembro, a delação de Cláudio Mello Filho, ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht, apresentou ao Brasil os apelidos de diversos integrantes da classe política que supostamente mantinham relações promíscuas com a empreiteira. Na marchinha a seguir, muitos dos codinomes são citados, inclusive as inciais de Michel Temer. “Não quero MT/ Eu quero é meter toda a quadrilha na prisão.” 

 Solta o Cano

Outra marchinha da Orquestra Royal, Solta o Cano ironiza a blindagem que políticos do PSDB costumam ter no Judiciário. A composição associa os vazamentos da Lava Jato aos de um cano hidráulico. A solução é fechar o registro para a “casa não cair”. O duplo sentido fica evidente no refrão: “Solta o cano que não cai/Já vai baixar a pressão/Solta o cano que tá tranquilão”. 

Você dizia X eu eu sorria

Recém-saída do forno, a marchinha “Você dizia X e eu sorria”, também de Os Marcheiros, repercute a mais recente fase da Lava Jato, que determinou a prisão do empresário Eike Batista, incluído na lista de procurados da Interpol. A relação de políticos com o dono do grupo EBX, ao qual pertence a OGX, braço que atua na exploração de petróleo, é a inspiração desta marchinha. “Você dizia “O” e eu tremia/ Você dizia “G”, eu me rendia/ Você dizia “X” e eu sorria”.  

 

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