Cultura

Sugestões de Bravo! para ler

Nesta semana, a seção sugere Almeida Júnior, Gestos Feitos de Tinta, sobre a obra do pintor paulista, e Como Mudar o Mundo: Marx e o Marxismo 1840-2011, do historiador britânico Eric Hobsbawm

Gestos Feitos de Tinta
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Livros

Almeida Júnior, Gestos Feitos de Tinta

Daniela Carolina Perutti


Alameda Editorial,


294 págs., R$ 68

Ao universo de estudo da pintura de Almeida Júnior (1850-1899), que parecia bem atendido, a antropóloga Daniela Carolina Perutti vem somar uma singular contribuição. Em seu livro Almeida Júnior, Gestos Feitos de Tinta, ela se detém, entre outros aspectos, naquele que chama de corporal nas telas do pintor paulista, ou seja, a representação da situação física dos personagens e seu significado. Parece complicado? Não quando o leitor tiver em mente as imagens recorrentes do artista que se dedicou ao homem do interior. Entre elas, são simbólicas já no título Caipira Picando Fumo, Derrubador Brasileiro, Caipiras Negaceando, Amolação Interrompida e O Violeiro.

De todo modo, o estudo não chega até esta tese das mais interessantes, senão principal, pois foco da dissertação de mestrado da autora, sem se munir de detalhada documentação histórica e biográfica. Trata-se de uma biografia interessada, no dizer da professora Lilia Moritz Schwarcz na apresentação, ao contornar uma noção geral de trajetória e preferir um estudo pontual de educação, formação, carreira e atividade num círculo político e social de São Paulo. Assim, da genealogia do pintor nascido em Itu, passando pelo ingresso na Academia Imperial de Belas Artes, no Rio, e a bolsa para estudos em Paris, até o exercício no ateliê paulistano como retratista da burguesia, tem-se a construção de uma personalidade coerente com as raízes modestas.

É um dos benefícios da intersecção das áreas de estudo, no caso da arte com as ciências sociais. Diferentemente de questões artísticas já aprofundadas, como o distanciamento de Almeida Júnior das normas do estilo acadêmico, tem-se aqui uma relação com autores e obras voltados à contextualização do ambiente do artista e seu trabalho. São autores como Raymond Williams (O Campo e a Cidade), Antonio Candido (Parceiros do Rio Bonito) e, mais determinante ao conceito físico, o antropólogo francês Marcel Mauss e seu entendimento de como o corpo é utilizado em cada sociedade. Os pés descalços dos caipiras, por exemplo, sugerem a relação direta com a terra, enquanto a ação de enrolar folhas de fumo, uma alteração do entorno, assim como a enxada que faz morrer plantas e árvores. Atitudes fortuitas, mas de sentido maior agora esclarecido. – Orlando Margarido

 

Ainda que tardia

Corpo, Envelhecimento e Felicidade


Mirian Goldenberg


Civilização Brasileira,


392 págs., R$ 44,90

 

Quando tinha por volta de 40 anos, a antropóloga Mirian Goldenberg, professora da UFRJ, foi a um dermatologista que enxergou em sua pele rugas jamais percebidas por ela própria. Resistiu bravamente, com alguma crise, às sugestões do médico para esticar aqui e ali. Hoje, aos 54 anos e sem intervenções no rosto, diz que se sente cada vez melhor. Acadêmica e escritora, em suas linhas de pesquisa Mirian canaliza esforços para compreender a complexidade da velhice.

Autora de mais de 20 livros, ela organizou esta coletânea de 16 artigos escritos por especialistas de diversas áreas. Os textos foram produzidos para o seminário que leva o nome do livro, realizado na UFRJ, em 2010, e refletem pesquisa, por ela coordenada. As discussões englobam sexualidade, estética, consumo, virilidade, cor da pele, qualidade de vida, asilos e finitude. A brasileira, no geral, diz Mirian, envelhece subjetivamente pior do que os homens. E cedo: aos 30 anos, ou antes, já está preocupada em evitar a decadência do corpo. Neste ritmo, o que esperar da velhice?

A autora propõe uma discussão sobre perdas e ganhos do envelhecimento, partindo do pressuposto do corpo como capital importantíssimo em nosso meio. Com ele fora do padrão, é difícil ser feliz, provoca. Desde 2007 a pesquisadora faz questionários com homens e mulheres entre 50 e 90 anos. Nesta faixa etária, constata, sobressaem os ganhos.  As mulheres relatam que envelhecer lhes trouxe liberdade e felicidade jamais experimentadas. Já não se sentem obrigadas a travar nenhuma luta para aparentar a idade que não têm.

Mirian tem o grande mérito de abrir para o debate uma importante questão contemporânea: nunca vivemos tanto e, no entanto, nunca fomos tão forçados a ocultar a idade.

O olhar crítico da pesquisadora não embaçou sua avidez por propor mudanças nem lhe ceifou a ternura. Os temas foram selecionados de forma a convergir para um desejo explícito da antropóloga: buscar saídas para que os brasileiros se sintam autenticamente felizes por estarem vivendo mais. Mas, principalmente, descubram isso antes dos 60 anos. – Maria Lígia Pagenotto

 

Marx vai bem, o marxismo vai mal

Como Mudar o Mundo: Marx e o Marxismo 1840-2011

Eric Hobsbawm Companhia das Letras


424 págs., R$ 57

A julgar pelo livro Como Mudar o Mundo: Marx e o marxismo 1840-2011, do famoso historiador britânico Eric Hobsbawm, publicado no Brasil pela Companhia das Letras, imediatamente após o lançamento original em inglês, Marx vai muito bem, obrigado, mas o marxismo vai muito mal. Para Hobsbawm, as teses centrais de Marx continuam válidas ainda hoje, mas no século XX o único marxista digno de nota foi o italiano Antonio Gramsci. Os demais, como Lenin e Trotsky, não contam – e no século XXI não há ninguém. Desta obra, o leitor sai sem saber como o mundo pode mudar, pois Hobsbawm só propõe obviedades. Mas como ele é um historiador, e não um líder político, o livro é um apanhado muito bom sobre como Marx e o marxismo mudaram o mundo durante mais de um século.

Nos informamos muito claramente sobre como Marx lidou com a movimentação intelectual e política de sua época. Temos importantes distinções sobre o que muitas vezes se confunde: Hobsbawm observa que uma coisa é o movimento trabalhista, outra coisa é o movimento socialista. Afinal, não é de hoje que o socialismo marxista e as aspirações dos trabalhadores seguem trilhas separadas. – Renato Pompeu

Livros

Almeida Júnior, Gestos Feitos de Tinta

Daniela Carolina Perutti


Alameda Editorial,


294 págs., R$ 68

Ao universo de estudo da pintura de Almeida Júnior (1850-1899), que parecia bem atendido, a antropóloga Daniela Carolina Perutti vem somar uma singular contribuição. Em seu livro Almeida Júnior, Gestos Feitos de Tinta, ela se detém, entre outros aspectos, naquele que chama de corporal nas telas do pintor paulista, ou seja, a representação da situação física dos personagens e seu significado. Parece complicado? Não quando o leitor tiver em mente as imagens recorrentes do artista que se dedicou ao homem do interior. Entre elas, são simbólicas já no título Caipira Picando Fumo, Derrubador Brasileiro, Caipiras Negaceando, Amolação Interrompida e O Violeiro.

De todo modo, o estudo não chega até esta tese das mais interessantes, senão principal, pois foco da dissertação de mestrado da autora, sem se munir de detalhada documentação histórica e biográfica. Trata-se de uma biografia interessada, no dizer da professora Lilia Moritz Schwarcz na apresentação, ao contornar uma noção geral de trajetória e preferir um estudo pontual de educação, formação, carreira e atividade num círculo político e social de São Paulo. Assim, da genealogia do pintor nascido em Itu, passando pelo ingresso na Academia Imperial de Belas Artes, no Rio, e a bolsa para estudos em Paris, até o exercício no ateliê paulistano como retratista da burguesia, tem-se a construção de uma personalidade coerente com as raízes modestas.

É um dos benefícios da intersecção das áreas de estudo, no caso da arte com as ciências sociais. Diferentemente de questões artísticas já aprofundadas, como o distanciamento de Almeida Júnior das normas do estilo acadêmico, tem-se aqui uma relação com autores e obras voltados à contextualização do ambiente do artista e seu trabalho. São autores como Raymond Williams (O Campo e a Cidade), Antonio Candido (Parceiros do Rio Bonito) e, mais determinante ao conceito físico, o antropólogo francês Marcel Mauss e seu entendimento de como o corpo é utilizado em cada sociedade. Os pés descalços dos caipiras, por exemplo, sugerem a relação direta com a terra, enquanto a ação de enrolar folhas de fumo, uma alteração do entorno, assim como a enxada que faz morrer plantas e árvores. Atitudes fortuitas, mas de sentido maior agora esclarecido. – Orlando Margarido

 

Ainda que tardia

Corpo, Envelhecimento e Felicidade


Mirian Goldenberg


Civilização Brasileira,


392 págs., R$ 44,90

 

Quando tinha por volta de 40 anos, a antropóloga Mirian Goldenberg, professora da UFRJ, foi a um dermatologista que enxergou em sua pele rugas jamais percebidas por ela própria. Resistiu bravamente, com alguma crise, às sugestões do médico para esticar aqui e ali. Hoje, aos 54 anos e sem intervenções no rosto, diz que se sente cada vez melhor. Acadêmica e escritora, em suas linhas de pesquisa Mirian canaliza esforços para compreender a complexidade da velhice.

Autora de mais de 20 livros, ela organizou esta coletânea de 16 artigos escritos por especialistas de diversas áreas. Os textos foram produzidos para o seminário que leva o nome do livro, realizado na UFRJ, em 2010, e refletem pesquisa, por ela coordenada. As discussões englobam sexualidade, estética, consumo, virilidade, cor da pele, qualidade de vida, asilos e finitude. A brasileira, no geral, diz Mirian, envelhece subjetivamente pior do que os homens. E cedo: aos 30 anos, ou antes, já está preocupada em evitar a decadência do corpo. Neste ritmo, o que esperar da velhice?

A autora propõe uma discussão sobre perdas e ganhos do envelhecimento, partindo do pressuposto do corpo como capital importantíssimo em nosso meio. Com ele fora do padrão, é difícil ser feliz, provoca. Desde 2007 a pesquisadora faz questionários com homens e mulheres entre 50 e 90 anos. Nesta faixa etária, constata, sobressaem os ganhos.  As mulheres relatam que envelhecer lhes trouxe liberdade e felicidade jamais experimentadas. Já não se sentem obrigadas a travar nenhuma luta para aparentar a idade que não têm.

Mirian tem o grande mérito de abrir para o debate uma importante questão contemporânea: nunca vivemos tanto e, no entanto, nunca fomos tão forçados a ocultar a idade.

O olhar crítico da pesquisadora não embaçou sua avidez por propor mudanças nem lhe ceifou a ternura. Os temas foram selecionados de forma a convergir para um desejo explícito da antropóloga: buscar saídas para que os brasileiros se sintam autenticamente felizes por estarem vivendo mais. Mas, principalmente, descubram isso antes dos 60 anos. – Maria Lígia Pagenotto

 

Marx vai bem, o marxismo vai mal

Como Mudar o Mundo: Marx e o Marxismo 1840-2011

Eric Hobsbawm Companhia das Letras


424 págs., R$ 57

A julgar pelo livro Como Mudar o Mundo: Marx e o marxismo 1840-2011, do famoso historiador britânico Eric Hobsbawm, publicado no Brasil pela Companhia das Letras, imediatamente após o lançamento original em inglês, Marx vai muito bem, obrigado, mas o marxismo vai muito mal. Para Hobsbawm, as teses centrais de Marx continuam válidas ainda hoje, mas no século XX o único marxista digno de nota foi o italiano Antonio Gramsci. Os demais, como Lenin e Trotsky, não contam – e no século XXI não há ninguém. Desta obra, o leitor sai sem saber como o mundo pode mudar, pois Hobsbawm só propõe obviedades. Mas como ele é um historiador, e não um líder político, o livro é um apanhado muito bom sobre como Marx e o marxismo mudaram o mundo durante mais de um século.

Nos informamos muito claramente sobre como Marx lidou com a movimentação intelectual e política de sua época. Temos importantes distinções sobre o que muitas vezes se confunde: Hobsbawm observa que uma coisa é o movimento trabalhista, outra coisa é o movimento socialista. Afinal, não é de hoje que o socialismo marxista e as aspirações dos trabalhadores seguem trilhas separadas. – Renato Pompeu

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