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Salas cheias, e com aplausos

‘Ainda Estou Aqui’, dirigido por Walter Salles, devolve ao cinema brasileiro parte do público perdido nos últimos anos

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Fernanda Torres pode ser indicada ao Oscar por sua memorável atuação como Eunice Paiva – Imagem: Alile Dara Onawale
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Fernanda Torres disse, em entrevistas sobre Ainda Estou Aqui, que adoraria que esse fosse um filme que trouxesse o público de volta para o cinema no Brasil. O desejo da atriz concretizou-se no último fim de semana, quando o longa-metragem vendeu 360 mil ingressos, e ficou no topo das bilheterias (ver quadro na página ao lado).

O produtor e cineasta Paulo Sergio Almeida que, desde 1997, coleta e analisa dados sobre o mercado cinematográfico brasileiro, no Filme B, farejou o estouro na estreia, na quinta-feira 7. No dia seguinte, o Filme B publicou que Ainda Estou Aqui havia faturado, no primeiro dia em cartaz, 1 milhão de reais. A informação disseminou-se pela mídia e pelas redes sociais.

Embora a palavra “milhão” impressione, esse valor, em se tratando de bilheterias, não é necessariamente alto – e pode, inclusive, ser baixo. Mas, no caso desse filme, a cifra traduz, de fato, um estouro e indica estarmos diante de um acontecimento cultural muito relevante.

“O filme resgata o público brasileiro para os cinemas”, diz Almeida, respondendo ao anseio não só de Fernanda, mas de vozes menos famosas do setor audiovisual. “A grandiosidade do resultado não reside só na bilheteria, mas na relevância do filme, no boca a boca que tem gerado e no resgate de uma coisa que a gente costuma chamar de cinema ‘de prestígio’.”

Almeida refere-se ao prêmio que o lapidado roteiro de Murilo Hauser e Heitor Lorega recebeu no Festival de Veneza; ao fato de a Sony Classics distribuir o filme nos Estados Unidos e em outros territórios; e às concretas chances de uma indicação brasileira ao Oscar de Melhor Filme Internacional passados 26 anos da última delas, por Central do Brasil.

Almeida acredita que a produção chegue a 1,5 milhão de ingressos – Imagem: Micheli Castilho

Nas sessões da campanha pelo prêmio, que teve início em Los Angeles, na semana passada, a Sony tem trabalhado também outras seis indicações: diretor (Walter Salles), atriz (Fernanda Torres), ator coadjuvante (Selton Mello), roteiro adaptado (Hauser e Lorega) e montagem (Affonso Gonçalves). Não seria de surpreender se a direção de arte de Carlos Conti também estivesse na lista.

Ainda Estou Aqui vai, assim, se sedimentando como o grande filme brasileiro sobre a ditadura, que consegue ser, a um só tempo, elaborado e acessível, tanto em termos estéticos quanto narrativos.

Também isso, diz Almeida, torna a produção um marco: “Passamos por um ciclo muito forte de comédias, mas, com o tempo, o próprio mercado foi ficando saturado de comédias de baixa qualidade. Parte do público quer ir ao cinema para ver algo que considere relevante”.

O mapa das bilheterias é elucidativo disso que o criador do Filme B quer dizer. O Espaço Augusta e o Cine Marquise, salas de rua da região da Avenida Paulista, em São Paulo, foram as que tiveram melhor resultado. Nas zonas mais populares, o filme teve desempenho mediano.

Na estimativa de Almeida, Ainda Estou Aqui pode chegar à marca de 1,5 milhão de ingressos, um feito e tanto para este momento. Em 2024, os dois filmes brasileiros mais vistos em salas foram as comédias Minha Irmã e Eu e Os Farofeiros 2, que venderam, aproximadamente, 2 milhões de ingressos cada uma.

Fonte: Filme B

Desde 2020, ano em que Minha Mãe É Uma Peça fez 10,9 milhões de espectadores, o cinema brasileiro tem apresentado resultados sofríveis. No ano passado, embora tenham estreado 161 filmes nacionais, eles responderam por apenas 3,2% dos ingressos vendidos – 96,8% do público viu filmes estrangeiros.

“Não tenho dúvida de que os próximos lançamentos, como O Auto da Compadecida e Chico Bento se beneficiarão do clima gerado por Ainda Estou Aqui, e também por Arca de Noé, filme infantil que, em sua segunda semana em cartaz, vai se beneficiar dos feriados”, diz ele, que estima que o cinema brasileiro termine o ano com um market share em torno de 10%.

Rodrigo Teixeira, produtor de Ainda Estou Aqui, havia dito a CartaCapital, na semana passada, que a imagem de Salles, como cineasta, é imediatamente atrelada, aqui e no exterior, ao Brasil, e que isso também contribui para a onda que se formou: “É um pouco como se ele carregasse a bandeira do Brasil”.

E, como lembra André Sala, da Sony Pictures, há ainda Fernanda Torres e Fernanda Montenegro a contribuir para o “carinho e orgulho” vocalizados nas redes sociais e materializados, em várias sessões do último fim de semana, nos aplausos de plateias emocionadas. •

Publicado na edição n° 1337 de CartaCapital, em 20 de novembro de 2024.

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