Cultura
Resposta ao Tempo, “canção-prece” de Cristovão Bastos e Aldir Blanc
Cristovão, pianista e arranjador conta sobre a magnífica canção com o letrista


O compositor e arranjador Cristovão Bastos tirou a melodia de uma vez no violão. Sim, no violão. Embora seja conhecido se apresentando ao piano, suas composições são feitas acompanhadas de ambos instrumentos.
Cristovão enviou a melodia a Aldir Blanc, parceiro de outras canções e que o já tinha encaminhado canções para musicar.
O inesquecível compositor foi rápido e devolveu a letra ao pianista. “Ele fez uma coisa tão brilhante que mexe com todo mundo até hoje”, resume.
A música se chama Resposta ao Tempo. A magnífica canção foi apresentada a Nana Caymmi, que a gravou no álbum com o mesmo título, lançado em 1998. Os arranjos desse trabalho são de Cristovão Bastos.
A faixa-título abre a trabalho que deu o primeiro Disco de Ouro para a cantora. O álbum foi impulsionado também por que a canção Resposta ao Tempo acabou sendo escolhida no mesmo ano tema de abertura da minissérie de enorme sucesso Hilda Furacão, da TV Globo.
Cristovão conta que ele não tinha ideia do arranjo que ia fazer para essa música no álbum da Nana. “Coloquei a mão no piano e fiz essa introdução na hora. Essa ideia de introdução, que é muito forte, ficou marcada”.
De fato, a abertura já é suficiente para despertar emoção intensa. “Lembro que quando realizava shows com a Nana, fazia a introdução da música ao piano, era uma gritaria…”
Resposta ao Tempo tem letra e melodia impecáveis. O título da música foi dado por Aldir. “Tudo para mim nessa música foi mágico. Parecia que foi algo combinado lá de cima. Ela é quase uma prece”.
Uma versão gravada pelo próprio Aldir Blanc no seu álbum solo Vida Noturna (2005), com Cristovão Bastos ao piano, ganhou arranjos diferentes, mas é tão expressiva quanto a gravação da Nana Caymmi. A dramaticidade que Aldir impõe na gravação emociona.
Outras canções
Sobre a morte de Aldir: “Perdi um parceiro imperdível. Faz falta para tudo. Um cara humano, sensível. Um dos maiores letristas que a gente já teve nesse país”.
Os dois estreitaram amizade no disco 50 Anos (1996) de Aldir Blanc. A faixa-título, interpretada por Paulinho da Viola, desse inesquecível álbum dedicado às cinco décadas de vida do letrista, é de ambos. Cristovão fez arranjos de algumas músicas nesse trabalho.
Há um álbum gravado pela cantora Clarice Grova chamado Novos Traços (1997), lançado entre o 50 Anos e o Resposta ao Tempo, que só tem composições da dupla. São 14 no total – a Clarice assina a primeira faixa com os dois compositores.
O musical estreado em 2001 Tia Zulmira e Nós, de João Máximo, dirigida por Aderbal Freire-Filho, teve músicas de Cristovão e Aldir. O pianista está resgatando parte dessas canções apresentadas apenas na peça, para relançá-las: “Pode se dizer que elas são inéditas”.
Novos trabalhos
Por causa da pandemia, Cristovão Bastos teve vários trabalhos interrompidos. Em abril, o pianista tinha shows marcados em algumas cidades de Portugal com outros músicos.
Ele tem um trabalho pronto com o violonista Rogério Caetano, que deveria ter sido lançado. O álbum é um instrumental de piano e violão. “É a primeira vez que se tem notícia no país de uma gravação nesse duo com violão sete cordas de aço”.
O músico também estava envolvido na produção de um álbum com Áurea Martins, interrompido por conta da pandemia. Cristovão fez shows recentemente com a cantora.
O trabalho está sendo cogitado de se chamar Amizade já que ambos se conhecem há muito tempo e agora se reúnem para gravar.
Cristovão diz estar aproveitando o tempo de isolamento para estudar e compor. “Depois da pandemia, precisamos de bom senso nas nossas direções, nos nossos políticos. É uma coisa muita braba que está acontecendo em nosso país. Está muito difícil”, conclui.
O pianista, compositor e arranjador Cristovão Bastos possui inúmeros trabalhos lançados, alguns solos, outros em duo ou com vários músicos e instrumentistas. Em 2019 foi o último: ele apresentou o álbum Espelho (selo Sesc) em parceria com Maury Buchala.
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