“A crítica do presente só faz sentido se abrir porta pro futuro”, é o que diz Eugênio Lima, diretor do espetáculo “Black Brecht: E se Brecht Fosse Negro?”, que está em cartaz no Sesc Pompeia até o dia 5 de maio e leva ao palco um roteiro livremente inspirado na peça “O Julgamento de Luculus”, do dramaturgo alemão Bertolt Brecht.
O projeto teve a semente plantada em meados de 2016 durante ensaios do coletivo Legítima Defesa, que atualmente é formado por onze atores negros. O diretor conta que durante ensaios alguém brincou “e se Brecht fosse negro?”, fazendo com que a frase virasse praticamente um bordão entre eles. Foi depois de muito ouvi-la e repeti-la que os artistas começaram a fazer reais reflexões a respeito do assunto: “se ele fosse negro, a gente o conheceria?”, “quem ele seria exatamente?”, “como as classes sociais seriam representadas?” e muitos outros questionamentos.
As crescentes discussões sobre o tema fizeram a equipe realizar em 2017 o Estudos e Dramaturgia, projeto de imersões abertas ao público. Já em 2018, intervenções urbanas em ruas e exposições, como a Histórias Afro-atlânticas, no MASP, foram os principais trabalhos do grupo e também, segundo Eugênio, os primeiros momentos de resistência negra do Legítima Defesa. “Ensaios, estudos de imersão e intervenção urbana foram os pilares de todo processo construtivo”, defende ele.
Enegrecer o enredo
Em junho de 2018, o projeto Black Brecht: E se Brecht fosse Negro? foi contemplado com o Prêmio Zé Renato de apoio à produção e desenvolvimento da atividade teatral para a cidade de São Paulo. A peça é apresentada em três linhas narrativas: a dos vivos, os não nascidos e os mortos. A ideia é retratar como o futuro é algo subtraído das vidas negras de diversas maneiras. A iconografia da base conceitual e visual do espetáculo é inspirado em três conceitos teóricos: afrotopia, afropolitanismo e afrofuturismo.
Perante o Supremo Tribunal do Reino das Sombras apresenta-se Luculus Brasilis, o general civilizador, que precisa prestar contas da sua existência na Terra para saber se é digno de adentrar no Reino dos Bem-Aventurados. Sob a presidência do juiz dos Mortos, cinco jurados participam do julgamento: um professor, uma peixeira, um coveiro, uma ama de leite e um não-nascido. Estão sentados em cadeiras altas, sem mãos para segurar nem bocas para comer, e os olhos há muito apagados. Incorruptíveis. A partir deste enredo, o texto foi adaptado para o contexto da sociedade negra brasileira.
Trazendo o questionamento de “quais são as vidas descartáveis no Brasil?”, a obra traz consigo duas grandes reivindicações: o tempo e o futuro. “É para, por e com a memória de nossos ancestrais. Um grito poético que diz querer a sua matriz de volta”, afirma o diretor.
Serviço
Temporada: até 5 de maio de 2019
Quando: quinta a sábado, às 21h; domingo às 18h. Dia 1º de maio às 18h
Ingressos: 7,50 (credencial plena/trabalhador no comércio e serviços matriculado no Sesc e dependentes); 12,50 (pessoas com +60 anos, estudantes e professores da rede pública de ensino) e 25 (inteira)
Duração: 90 minutos
Endereço: Sesc Pompeia (Rua Clélia, 93, São Paulo)
Não recomendado para menores de 18 anos
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