Cultura

Num ano difícil para a música, ‘lives’ mantiveram o elo entre artistas e o público

Com as pessoas em busca de afeto em meio à pandemia, Emicida, Teresa Cristina e Marcelo D2 se sobressaíram ao abraçar essa necessidade

(Fotos: Divulgação)
Apoie Siga-nos no

Não foi fácil para o meio musical ter a agenda de apresentações cancelada a partir de março por conta da pandemia – e ela continua suspensa. A principal e única fonte de renda atingiu em cheio o segmento.

Alguns resolveram se recolher ou fizeram pouquíssimas aparições, como foi o caso de artistas já consolidados e com as suas vidas resolvidas. Outros foram para o estúdio retomar projetos parados, inacabados, reunir gravações passadas ou iniciar um novo trabalho enquanto os shows não veem.

A maioria, no entanto, tentou continuar a carreira – ou pelo menos manter-se em evidência – com apresentações online regulares nas chamadas lives. A prática revelou com o tempo que só na rede social cantando para um espectador enclausurado em casa e em busca de esperança e afeto, não daria para ir muito longe. Era preciso, de alguma forma, o outro lado se sentir abraçado e tocado num momento angustiante, ainda que virtualmente.

Alguns artistas entenderam essa necessidade e conseguiram crescer em função disso ou se mantiveram presentes junto aos fãs dessa forma.

Teresa Cristina, com suas lives diárias e intermináveis, com muito papo e pouca música, se enquadrou em cheio nesse contexto. A cantora, além de ter se adaptado bem ao meio, nunca pertenceu de fato ao chamado mainstream, o que lhe deu mais liberdade de falar o que quisesse, agregando um público ávido por música e, ao mesmo tempo, uma boa conversa no fim de noite.

A intérprete é a principal integrante da geração da Lapa do Rio de Janeiro, que cantou muito nos bares por lá e fez carreira gravando samba de grandes compositores. Mas apesar de ter se projetado nacionalmente, continuou sendo uma artista independente e sem vínculos, o que lhe favoreceu agora na sua exposição nas redes sociais.

Marcelo D2 é um artista inventivo e engajado. Suas apresentações frequentes online, com interação a um público jovem, o abasteceram para fazer um dos melhores álbuns produzido e lançado na pandemia, o Assim Tocam os Meus Tambores, com vários convidados, e um filme intimista onde se pode ouvir as 12 faixas do trabalho.

Emicida, talvez o maior artista brasileiro da atualidade, fez poucos shows online, mas foi figura presente em entrevistas e conversas virtuais, com mensagens fortes, atuais e significativas às pessoas em busca de respostas nesses tempos difíceis não só por conta da pandemia, mas de um governo caótico. Nesse fim do ano, ainda lançou um documentário, o AmarElo – É tudo pra Ontem, a partir de show gravado em 2019 no Theatro Municipal de São Paulo, onde o maior ensinamento dado, além do racismo estrutural, foi o fato de mostrar o samba como a gênese cultural dessa país.

Mais trabalhos

Nessa linha de propor novas linguagens para expor seu trabalho, destaque ainda para o álbum Do Meu Coração Nu, do pernambucano Zé Manoel, lançado durante a pandemia. É um trabalho denso, lírico, original e muito bem-acabado.

Kiko Dinucci lançou Rastilho no início do ano, em um projeto excepcional e inovador de voz e violão. O músico trabalha com independência e mostra
maestria nas cordas.

A mineira Tamara Franklin lançou seu segundo trabalho, o Fugio – Rotas de Fuga para o Aquilombamento, e a paulista Tássia Reis, apresentou videoclipes ao longo de 2020. As duas revelações mostram o Rap em diálogo com outros ritmos, sem tirar a contundência nas letras, mas expressando sentimentos. As duas são revelações da música em um novo momento do gênero, com a força feminina. Edi Rock, do Racionais MC’s, lançou trabalho solo ressaltando também que as vidas negras importam.

O Ira!, de Edgar Scandurra e Nasi, apresentou ainda esse ano um projeto de inéditas, depois de 13 anos, alinhado aos novos tempos e contundente.

Fernanda Abreu colocou outro dia na rua seu DVD Amor Geral, projeto realizado de forma inusitada e retrato de como a música sofreu na pandemia. Poucas horas antes do registro fonográfico acontecer, no dia 13 de março, em um teatro na Zona Norte do Rio de Janeiro, o Governo do estado determinou, entre outras medidas, a suspensão imediata de eventos em locais fechados para conter a propagação do coronavírus.

A gravação ocorreu sem público, apesar de muita gente já ter ido à porta do local. Mas o resultado é vibrante. A cantora levou para palco grupos de dança para acompanha-la em várias músicas. Trata-se de um DVD bom de se ver e ouvir, de uma artista que completa 30 anos de carreira com personalidade.

O ano 2021, pelo menos no primeiro semestre, deve seguir a toada de manifestações artísticas tendo a internet como plataforma principal. Por conta ainda das incertezas, não dá para esperar grandes novidades.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , , , , , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo