Cultura

Nós, os torcedores

Assisti a um jogo em que algumas pessoas por pouco escaparam do infarto. E sabe por quem torciam? Por uma empresa

Assisti a um jogo em que algumas pessoas por pouco escaparam do infarto. E sabem por quem eles torciam? Por uma empresa. Foto: iStockphoto
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Pouco entendo de futebol e não digo isso com o orgulho esnobe de quem não quer misturar-se ao povo, mas com a humildade de quem gosta de ver um bom jogo sem entender muito bem tudo o que acontece no espetáculo. Existe uma falta, por exemplo, que sempre anuncio para o lado contrário. Não consigo entender como é que um jogador se atira sobre o outro, com o risco de saírem os dois machucados (dizer “contundido” já seria desmentir a declaração inicial), e o juiz o beneficia com uma falta contra sua vítima, o jogador agredido.

Sei que são vinte e sete envolvidos diretamente. Se você, caro leitor, não acredita nesses números, é porque nunca meditou sociologicamente sobre o assunto, como já o fez Monteiro Lobato lá pelos inícios do século passado. Não nos esqueçamos de que o juiz e seus quatro auxiliares são peças mais do que importantes no espetáculo, contribuindo, em geral, com suas genitoras em função altamente relevante, pois são elas o alvo de torcedores com tensões das mais diversas origens, que, naquele momento, encontram seu desabafo, como a válvula na panela de pressão. E como os vinte e sete envolvidos (se é que o convenci) são seres humanos, outras lições consigo tirar de uma partida de futebol.

Terminar o primeiro tempo com a “taça na mão”, com um resultado muito favorável, quando se é inexperiente, é o caminho mais curto para a derrota. A emoção da vitória vislumbrada, para quem ainda não a conhece, é tão grande que desnorteia, tira qualquer lucidez do coitado do jogador.

Qualquer um de nós sabe, por exemplo, que cada pessoa tem o direito de torcer por quem bem quiser. Este é o axioma fundamental do torcedor: a liberdade de escolha. Como única exceção, conhecemos os casos de pais que já enfeitam o berço do futuro varão com as cores de seu time. Pouco importa, uma vez que nossa liberdade de escolha, em geral, vem do berço ou da tela da televisão. Pois bem, mas não se torce apenas por times de futebol. O Aurélio, no conceito número 24, informa que “torcer” significa: “Desejar os proveitos de alguém em detrimento de outrem…” De onde posso inferir que torcida é adesão, empatia, vinculação de um destino individual ao destino de uma entidade, de uma instituição, e, às vezes, como acontece com a torcida em novelas, até ao destino de uma persona. Mas adesão e vinculação voluntária, simplesmente porque a entidade, a instituição, a pessoa sintetizam aspirações, ideais, desejos; carregam em si valores que se quer vistos vitoriosos.

Ontem assisti a um jogo em que algumas pessoas por pouco escaparam do infarto. E sabem por quem eles torciam? Por uma empresa. Uma empresa, sim. Com dono (aquele que aplica seu capital para que seja multiplicado), funcionários de vários níveis, beneficiários, “maleficiários” e tudo o mais. Enfim, uma empresa, como tantas há por aí. Esta é outra coisa que não consigo entender do futebol. Como pode um cidadão (às vezes um pequeno grupo de cidadãos) manipular as emoções de um grande grupo, chamado de “torcida”, a fim de que esta última seja capaz de arriscar a própria vida para que o capital do cidadão ou pequeno grupo de cidadãos seja multiplicado?

Pouco entendo de futebol e não digo isso com o orgulho esnobe de quem não quer misturar-se ao povo, mas com a humildade de quem gosta de ver um bom jogo sem entender muito bem tudo o que acontece no espetáculo. Existe uma falta, por exemplo, que sempre anuncio para o lado contrário. Não consigo entender como é que um jogador se atira sobre o outro, com o risco de saírem os dois machucados (dizer “contundido” já seria desmentir a declaração inicial), e o juiz o beneficia com uma falta contra sua vítima, o jogador agredido.

Sei que são vinte e sete envolvidos diretamente. Se você, caro leitor, não acredita nesses números, é porque nunca meditou sociologicamente sobre o assunto, como já o fez Monteiro Lobato lá pelos inícios do século passado. Não nos esqueçamos de que o juiz e seus quatro auxiliares são peças mais do que importantes no espetáculo, contribuindo, em geral, com suas genitoras em função altamente relevante, pois são elas o alvo de torcedores com tensões das mais diversas origens, que, naquele momento, encontram seu desabafo, como a válvula na panela de pressão. E como os vinte e sete envolvidos (se é que o convenci) são seres humanos, outras lições consigo tirar de uma partida de futebol.

Terminar o primeiro tempo com a “taça na mão”, com um resultado muito favorável, quando se é inexperiente, é o caminho mais curto para a derrota. A emoção da vitória vislumbrada, para quem ainda não a conhece, é tão grande que desnorteia, tira qualquer lucidez do coitado do jogador.

Qualquer um de nós sabe, por exemplo, que cada pessoa tem o direito de torcer por quem bem quiser. Este é o axioma fundamental do torcedor: a liberdade de escolha. Como única exceção, conhecemos os casos de pais que já enfeitam o berço do futuro varão com as cores de seu time. Pouco importa, uma vez que nossa liberdade de escolha, em geral, vem do berço ou da tela da televisão. Pois bem, mas não se torce apenas por times de futebol. O Aurélio, no conceito número 24, informa que “torcer” significa: “Desejar os proveitos de alguém em detrimento de outrem…” De onde posso inferir que torcida é adesão, empatia, vinculação de um destino individual ao destino de uma entidade, de uma instituição, e, às vezes, como acontece com a torcida em novelas, até ao destino de uma persona. Mas adesão e vinculação voluntária, simplesmente porque a entidade, a instituição, a pessoa sintetizam aspirações, ideais, desejos; carregam em si valores que se quer vistos vitoriosos.

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