“Não Sou Nenhum Roberto, mas às Vezes Eu Chego Perto”
– Nando Reis
Em 1996, a parceira Cássia Eller gravou Nenhum Roberto, de Nando Reis, que continha os versos agora transformados no título de Não Sou Nenhum Roberto, Mas às Vezes Eu Chego Perto, álbum todo dedicado por Nando à obra mais romântica de Roberto Carlos. Não parece uma boa hora para fazê-lo, dado o significado da obra do “Rei” junto à ditadura civil-militar de 1964, a mesma que insinua se repetir feito farsa nos dias que correm.
Nando Reis pratica a mais franca fuga da realidade em Não Sou Nenhum Roberto, deixando para lá os hits do “rei do iê-iê-iê” e focando na obra ultrarromântica que varre dos anos 1970 aos 1990, do soul de transição Todos Estão Surdos (1971) até a mela-cueca Alô (1994), e privilegia canções menos óbvias de Roberto e Erasmo Carlos, com exceção da apetitosa Amada Amante (1971).
O ultrarromantismo extemporâneo canta alto em faixas como De Tanto Amor (1971), Você em Minha Vida (1976), Vivendo por Viver (1978, transformada em country rock), Me Conte a Sua História (1979, acrescida de um matador poema declamado) e Procura-Se (1980).
O espectro religioso de Roberto aparece apimentado por alguma ironia na épica A Guerra dos Meninos (1980), com intervenção tropicalista de Jorge Mautner, e no hino de igreja Nossa Senhora (1993), que Nando apenas cantarola, sem utilizar a letra devota do melhor amigo da ditadura passada.
Os arranjos brandos são esmerados e o romantismo exacerbado acalenta ouvidos cansados, mas em plena era bolsonarista é inviável deixar de demarcar que a fuga da realidade também é, em si, um ato político.
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