Cultura

Músico da Velha Guarda da Portela grava o esquecido samba de terreiro

Marquinho do Pandeiro registra composições da época em que as escolas eram polo de criação de samba

Foto: Thaís Monteiro/Divulgação Foto: Thaís Monteiro/Divulgação
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Marquinho do Pandeiro lança seu primeiro trabalho solo aos 74 anos. Ele integra desde 2004 a Velha Guarda da Portela, que acaba de comemorar 50 anos de existência. O álbum do músico resgata o samba de terreiro, que era composto e cantado nas escolas de samba, além do que se fazia para os desfiles de Carnaval.

“Antigamente, tinha o nome de samba de terreiro por que o local era de chão batido. Depois, com as quadras das escolas de samba com piso de cimento, passou a se chamar samba de quadra”, lembra o sambista nascido em Oswaldo Cruz, bairro carioca da nata do gênero.

“O pessoal se reunia para cantar seu samba (fora do período de Carnaval). Ia de escola em escola”, lembra ele, citando nomes com quem conviveu: Mano Décio da Viola, Silas de Oliveira, Candeia, Zé Keti, Jair do Cavaquinho e Nelson Sargento.

“Os cantores do rádio iam ouvir e gravava”, lembra. Ele conta que Jamelão, apesar de mangueirense, gostava muito de frequentar as rodas de samba de quadra na Portela.

“Aí ele ouviu ‘Quando vem rompendo o dia, eu me levanto, começo longo a cantar’. Ele disse que esse samba era bonito e queria gravar a música, mas pediu a parceria ao seu único autor, Bubu da Portela”, conta Marquinho.

Essa música chama-se Esta Melodia (gravada por Jamelão em 1959), uma das grandes obras do samba e muito bem registrada por Marisa Monte no disco Verde, Anil, Amarelo, Cor-de-Rosa e Carvão (1994), com a participação da Velha Guarda da Portela.

Marquinho é frequentador da Portela desde pequeno. Hoje vive em Bento Ribeiro, bairro vizinho a Oswaldo Cruz: “Sempre morei na região do samba”.

O álbum solo de Marquinho do Pandeiro, de nome Claridade da Portela, é uma celebração ao samba de quadra cada vez mais ausente das escolas de samba, já há algum tempo muito centradas nos grandiosos desfiles de carnaval.

Ele acha que a morte de sambistas antigos prejudicou a manutenção do samba de quadra. “A garotado dificilmente dá continuidade a isso. A Portela tenta cuidar. Hoje, o samba que se faz não chega aos pés do samba de terreiro”.

Monarco

As escolas faziam até concursos para eleger os melhores sambas de quadra. Hoje, algumas agremiações ainda tentam manter essa tradição.

O sambista diz ter muita coisa guardada no baú, que eram músicas produzidas para apresentar ao longo do ano. No álbum, por exemplo, ele gravou O Seresteiro, feita há cerca de 50 anos.

A bela Exaltação à Bahia, que é um samba de roda, de ritmo próximo do samba de terreiro, é outra criada por Marquinho, inspirada quando foi a Bahia, no início dos anos 1970.

“Tenho luminosidade por Monarco”, revela sobre o maior baluarte vivo do samba hoje no país. Ambos fizeram durante um show em Brasília da Velha Guarda A Grande Conquista (ele compôs a primeira parte e Monarco, a segunda), gravada no Claridade da Portela com participação do próprio Monarco. A música, depois, acabou ganhando um concurso de samba.

Outra que ganhou festival de samba de quadra e foi registrada no álbum é Mundo Infinito, de Marquinho do Pandeiro, Juan Espanhol e Sylvio Paulo.

Tem ainda uma música no álbum com sambista paulista muito ligado à Velha Guarda, Tuco Pellegrino, que é um parceiro mais recente: Turbilhão de Melodias.

Tuco é também produtor do primeiro trabalho de Marquinho do Pandeiro, gravado antes da pandemia, e faz participação no álbum.

Para realizar o seu primeiro registro solo, o sambista teve grande ajuda de um fã da Velha Guarda, Rodrigo Godoy, que faz questão de citar. “Ele perguntou porque ainda não tinha gravado um disco. Falei para ele: ‘Me vestir eu sei, só não tenho roupa’. No fundo, quis dizer: mas cadê o dinheiro para gravar. E aí ele ajudou”.

Chama a atenção na ficha técnica do álbum Claridade da Portela (aliás, faixa-título em homenagem a Clara Nunes) a presença nas gravações das músicas o violão sete cordas de João Camarero. O violonista é a maior revelação do instrumento da atualidade no país.

Marquinho do Pandeiro, quando foi para o exército, se dedicou a profissão de motorista de carro pesado. Trabalhou em ônibus de linha interestadual, e dirigiu caminhões articulados e carreta. Por fim, virou taxista, onde trabalha até hoje.

“Dei uma parada por conta da pandemia”. Aliás, o sambista teve covid-19. Foi parar numa unidade de pronto atendimento com sintomas na manhã de 17 de maio e liberado na madrugada do dia seguinte.

Diz que quer continuar cantando, enquanto não veste o ‘paletó de madeira’: “Não quero ver a grama por baixo, mas por cima”.

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