Cultura

Mestre de folguedos teme continuidade de grupos pós-coronavírus

Companhias de moçambique e congada podem perder apoio

Foto: Fábio Gomes Foto: Fábio Gomes
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Presença tradicional nesse período do ano nas festas religiosas do Divino e de padroeiros, como Santo Antônio, São João e São Pedro, os grupos de moçambique e congada fazem lives para manter seus componentes unidos com o cancelamento dos eventos por conta do novo coronavírus.

“A minha preocupação com isso é que o apoio aos grupos deixe de acontecer, já que o período de festejos está acabando e talvez não tenha mais nenhuma apresentação esse ano”, diz Geraldo de Paula Santana, o Mestre Paizinho, líder da Companhia de Moçambique Unidos a São Benedito do Parque Bandeirantes, em Taubaté, fundada em 1947.

Ele é um dos mais respeitados mestres de cultura tradicional do Vale do Paraíba paulista, região marcada por manifestações de moçambique, congada, catira, dança da fita, jongo, folia de reis, entre outras.

“No Vale existem vários grupos folclóricos e eles podem ser considerados de resistência.”

Mestre Paizinho conta que em Taubaté, há cerca de 30 anos, chegou a ter 18 grupos de moçambique, oito de congada e dez de folias de reis. Hoje, no município, há apenas três grupos de moçambique, um de congada e três de folia de reis.

Moçambique é um dança-cortejo de origem afro-brasileira que utiliza bastões que dão o ritmo, além de instrumentos de percussão e cordas e paiás (tornozeleiras de guizo) amarradas às pernas dos dançarinos; congada é outro folguedo antigo e sincrético, de passos e cantos; e folia de reis, com cantos e elementos musicais que celebram a visita dos Reis Magos ao menino Jesus.

Transmissão oral

“Muitas vezes os filhos acompanham a trajetória de seus pais e veem todos os desafios que eles têm para manter o grupo. Com o falecimento dos pais, eles tinham a missão de dar continuidade, mas não querem assumir a bandeira devido as dificuldades. Infelizmente, o apoio é muito pouco”.

Em geral, essas tradições são passadas de pai para filho através da oralidade. “Na época de meu pai o moçambique era dançado com os pés no chão porque o ele dizia que quando dançava com os pés no chão sentia a energia que vinha da terra. Então, estou há 20 anos como líder de Moçambique (no lugar do pai, o Mestre Paizão)”.

Desde 2002 Mestre Paizinho é responsável por projeto cultural que leva danças populares às escolas da região. Segundo ele, as oficinas já atingiram um total de 130 mil alunos de cerca de 50 estabelecimentos de ensino, incluindo escolas de educação especial.

“Quando vou as escolas falo da importância da preservação cultural. Cultura é um grande tesouro. Se nós mestres não transmitirmos de coração, corpo e alma todos os ensinamentos passados de pai para filho através da oralidade, isso vai se perder no tempo”.

A Companhia de Moçambique liderada por Mestre Paizinho conta com cerca de 30 pessoas, alguns tem trabalho fixo, outros são aposentados. O grupo de dança do mestre vive de apoios e participação em eventos.

“Sobrevivo de cultura, mas quando acontece uma fase como essa, a gente tem que se apoiar nas orações e acreditar que tudo vai passar. A cultura precisa continuar. O apoio vai acontecer e novas portas irão se abrir”.

Mestre Paizinho está recebendo auxilio emergencial do governo. A mulher trabalha numa escola e ganha salário mínimo, o que está ajudando a manter as despesas da casa.

“O coração ficou muito apertado porque foram muitas festas canceladas. Mas o sonho não pode acabar”, diz com a certeza de quem conhece bem as dificuldades de manter viva uma manifestação popular.

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