Augusto Diniz | Música brasileira

Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.

Augusto Diniz | Música brasileira

Incertezas rondam o rádio nos 100 anos de sua 1ª transmissão no País

O meio mantém elevada audiência, mas a migração da execução de música para outras plataformas refletirá na radiodifusão

Foto: Freepik
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Foi no dia 7 de setembro de 1922 que se realizou a primeira transmissão de radiodifusão no Brasil – pelo menos no registro oficial. Pelas ondas do rádio o então presidente Epitácio Pessoa discursava sobre o centenário da Independência do País.

Chegamos agora ao bicentenário do fim do domínio de Portugal. E o rádio alcançou 100 anos em meio à maior revolução vivida pela mídia em todos os tempos. Muito maior do que o surgimento da televisão, nos anos 1950, época que fez até alguns temerem o fim do rádio. Mas ele sobreviveu, embora a TV tenha absorvido parte importante do modelo de sustentação do meio.

Uma pesquisa da Kantar Ibope Media divulgada em setembro, feita em 13 grandes centros urbanos de todas as regiões do País (menos a Norte), apontou que o rádio é ouvido por 80% da população. Isso é 2% maior em relação à mesma pesquisa feita em 2020.

Mais adiante, a Kantar mostra quais as plataformas de áudio mais acessadas na internet. O YouTube ganha disparado com 59% do público pesquisado. As de streaming (tipo Spotify) atingem 37%. Podcasts, 31%.

Só depois aparece o rádio: 18% ouvem rádio online que transmite a mesma programação do rádio AM ou FM convencional; 8% escutam playlist de rádio na internet; 5% ouvem programação gravada de rádio na internet e 5% acompanham rádio na web que não tem no dial tradicional AM/FM.

É notório o avanço exponencial das plataformas de áudio na pandemia. Por outro lado, em meio ao confinamento obrigatório da população, o rádio avançou como elemento intrínseco de sua existência: o companheiro de todas as horas.

Jabá

Conteúdos musicais e noticiosos dominam de longe a programação das emissoras de rádio. Tirando o item relacionado às notícias, já que isso também constitui a essência de um veículo de comunicação, sobra o conteúdo voltado à música, o qual o rádio tem ligação histórica – agora, pela primeira vez, de fato ameaçada.

Vale hoje um artista investir a aparição de suas canções nas rádios, por meio de pagamento para execução (mais conhecido como jabá)? A prática é amplamente realizada em milhares de rádios espalhadas pelo País – e muitas sobrevivem com o jabá. Mas até quando duraria isso com o crescimento de outras plataformas de áudio?

O que restaria do rádio sem o jabá? Sabe-se que a rádio tem hoje participação baixa no bolo publicitário de anunciantes. A mesma pesquisa da Kantar Ibope Media diz que investimento publicitário no rádio, no primeiro semestre de 2021, cresceu 16% em relação ao mesmo período de 2020. Mas num comparativo do primeiro semestre de 2019 com o mesmo período do ano passado, o investimento de publicidade no rádio havia caído 36%.

Nos anos anteriores (ou antes da pandemia) já era notório o aumento gradativo da internet no bolo publicitário em todos os levantamentos feitos sobre o assunto. Nesse cenário, seria natural o rádio operar mais na internet em sistema multiplataforma, com podcasts, playlists de música, transmissão ao vivo do estádio (não só com áudio, mas com vídeo), para tentar conquistar parte desse bolo.

Mas e os 80% da população que ouve rádio (aliás, a maioria por meio de aparelho convencional de rádio, com dial e tudo), índice apontado na pesquisa da Kantar Ibope Media e informado no início deste texto? A internet cresce, mas as pessoas ainda sintonizam enormemente emissoras de AM e FM. Qual é a explicação disso? Gratuidade do rádio, seu enorme alcance e simplicidade de acesso? Sim. O relacionamento mais próximo que mantém com o ouvinte? Provavelmente.

Conduzido pelo Ministério das Comunicações e Anatel, as emissoras de rádio AM no Brasil ainda fazem a migração para FM, que possui mais qualidade de transmissão. Em outra vertente, não foi definido o sistema brasileiro de rádio digital – hoje, o sinal é analógico embora existam testes do sistema digital. Mesmo com esses dois marcos da radiodifusão definidos, não é certo que refletirá sobremaneira na audiência.

O rádio completa 100 anos no Brasil, mas incertezas imperam. É possível que o meio caminhe ainda mais para segmentação ou atendimento de público específico, sem grandes investimentos por não possuir nem recurso para tal. O problema é reter ouvinte com conteúdo suficiente e adequado – com aposta maior ao noticioso e aprofundamento de temas, já que execução musical está migrando para outros meios. E é como se dará essa nova forma de ouvir música pelas pessoas, que ditará o futuro do rádio.

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