Cultura

De marca

Sobre crianças e cachorros

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Não sou de dar muito crédito ao que me conta meu compadre Adamastor, principalmente depois que descobri sua vocação de ficcionista. Por tal razão, reproduzo aqui a história que ele me contou, sem botar minha mão no fogo por ela, mas também sem nenhuma incredulidade. Vai sem qualquer comentário abonador ou de censura.

Conta-me meu amigo que na pequena cidade Sales Oliveira, do interior paulista, e lá se vão vários anos do ocorrido, havia um bairro pobre onde grande quantidade de crianças passavam necessidades. A palha de milho já era um bom negócio, mas nem todos usufruíam de suas benesses.

Preocupadas com a situação geral daquelas crianças, as pessoas dignas da cidade, as assim chamadas pessoas de bem, que lá não eram poucas, resolveram fundar uma entidade que se preocupasse com o destino das crianças que não eram de marca.

Pois sabiam, como todo mundo sabe, que somos todos iguais só que alguns são mais iguais que outros. Alguém, não me lembro quem, me antecedeu no jogo de palavras, mas, como não patenteou, também posso usar.

Em uma assembleia com debates acalorados, criou-se a Sociedade Protetora das Crianças. E alguém antes de mim eu sei já ter dito que criança também é animal. Merece, portanto, alguma proteção, apesar de estarem sendo substituídas no ambiente doméstico, as crianças, por caninos de todos os tamanhos como membros da família. 

Não se sabe, não há registro disso, qual foi a duração da Sociedade, extinta por absoluta falta de utilidade. Explica-se: com dois, três anos de proteção às crianças, estas apresentaram tais progressos, sobretudo sanitário-nutricionais, que a Sociedade deixou de ser necessária. Algumas coisas ainda funcionam neste mundo, para me desmentir mantendo uns restos de esperança na humanidade.

Desde então, na próspera cidade de Sales Oliveira, as pessoas podem dedicar-se à proteção de outros seres, que já não competem mais com os seres humanos, uma vez que estes últimos têm todos os seus problemas resolvidos. E a palha de milho, uma lâmina áspera que se costuma jogar fora, tem parte da responsabilidade pelo que aconteceu.

Se a história é verdadeira ou não, só quem pode atestar é o Adamastor, que visita com bastante frequência a cidade desde que chegou ao Brasil.

E como havia prometido não comentar a história, encerro por aqui meu relato sobre seres humanos, de duas ou quatro pernas.

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