Cultura

Dançando sobre o milho

Você sabe por que precisa estudar?

Apoie Siga-nos no

Mês de junho, fim do semestre, fim das aulas. Fico imaginando o que passa pela cabeça das crianças. Uns vão à escola porque as mães não os aguentam mais dentro de casa. Dá para se dizer que vão expulsos para a escola. Fazer o quê, com essas crianças durante um mês inteiro aporrinhando a paciência dentro de casa. Outros, mais numerosos, talvez, suportam desde cedo o sonho de um dia passar no vestibular. E outros motivos, é claro, hão de existir. 

Como andam erradas as coisas. Dá pena ver uma criatura que desde cedo é obrigada a carregar os sonhos frustrados dos pais. Nesses casos, pode-se dizer que o diploma vai servir principalmente para esfregar na cara de alguns parentes e de todos os vizinhos, em primeiro lugar daqueles que viviam dizendo que aquele lá, o filho do vizinho, aquilo não vira gente, de jeito nenhum.

São estes últimos os alunos que chegam à escola e perguntam: Mas pra que droga eu tenho de aprender geografia? Não é pra tirar o diploma, não, minha pobre e mal encaminhada criança. O diploma é apenas o atestado de que você aprendeu alguma coisa que a sociedade considera útil. Entendeu?

Isso me faz lembrar um conto do Luiz Vilela. Uma velhinha, no meio de sua horta, morria de medo dos aviões que passavam e perguntava aos filhos se a guerra era longe. Quanto assombro, quanto medo desnecessário! Ela não tinha noção de que a guerra acontecia do outro lado do oceano. E talvez nem soubesse o que era o oceano. 

Sabe-se que os astecas mantinham uma tradição religiosa, ligada ao cultivo do milho. Depois de jogar as sementes na cova e cobri-las, eles dançavam sobre a roça, caso contrário não choveria e as sementes não germinariam. Era sua compreensão das relações de causa e efeito. Sua dança trazia a chuva. 

Muitas vezes, nos tempos em que ganhava a vida dando aula, respondi, quando ouvia a pergunta desafiadora “Pra que é que eu tenho de estudar geografia?” Muito simples, meu jovem, é pra que você não fique dançando em cima do milho.

Parece impossível, mas não é. Em pleno século XXI tem muita gente acreditando em Saci, mesmo que lhe tenham retirado o cachimbo. Esses, pode-se dizer que ainda dançam. Em cima do milho ou de qualquer outra coisa. Mas dançam.  

Você já imaginou um médico que saiba um pouquinho de química e bastante de biologia, mas só isso? Ele vai olhar para o céu morrendo de medo dos aviões que passam. Espera-se deles que não tenham feito aquele tipo de perguntas. 

ENTENDA MAIS SOBRE: ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.