Cultura

“Cidade hostil, ocupação da rua no carnaval de São Paulo é um fenômeno”

Pesquisador diz que esgotamento de carnavais famosos e crise impulsionam folia paulistana

Carnaval de rua em São Paulo. Foto: Vagner Medeiros/SMPR (Secretaria Municipal das Subprefeituras)
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O historiador e pesquisador da cultura popular brasileira, Bruno Baronetti, atribui o crescimento do carnaval de rua de São Paulo na última década ao esgotamento da folia em locais tradicionais, como Salvador, e ainda a crise. Esse ano, mais de 800 blocos devem ir às ruas da capital paulista. Um recorde.

Com livros lançados sobre a história das escolas de samba da cidade e um de memórias de Seu Carlão do Peruche, baluarte do carnaval paulistano, o estudioso lembra que sempre existiram blocos em São Paulo, mas agora ganharam outra dimensão.

“Essas cidades pelo Brasil que eram conhecidas pelo carnaval de rua começam a ficar congestionadas, sem infraestrutura. Com a crise que se instaura no país, a partir de 2014, com as pessoas sem dinheiro, aí começa o movimento definitivo de se organizar blocos por aqui”, afirma.

Bruno ressalta, porém, que sempre teve espaço em São Paulo para se desenvolver o carnaval de rua. Inclusive, depois da criação do Sambódromo do Anhembi (1991), quando as escolas de samba e blocos oficiais deixaram de desfilar nas ruas, muito se questionou o modelo do carnaval paulistano realizado em local fechado.

O apoio aos blocos na gestão de Fernando Haddad, a partir de 2012, foi decisivo para o crescimento do carnaval de rua na cidade.

O pesquisador conta que ele formou um cordão em 2007 com pessoas que trabalhavam no Carnaval. “Fazíamos um trajeto ali no bairro da Bela Vista no dia seguinte ao desfile das campeãs no Sambódromo. Vinha polícia contra a gente. Era tumultuado. Com incentivo da prefeitura, aí vem junto o banheiro químico. A Companhia de Engenharia de tráfego (CET) fecha a rua, acompanha. Começa a ter ampliação desses blocos, na medida que dá certo.”

Carnaval democrático

São Paulo já deixou de exportar gente no carnaval e agora tem um efeito inverso de receber cada vez mais turistas durante a folia. Algo inimaginável a uma década atrás.

Um outro aspecto interessante observado pelo historiador é o fato da onda recente do carnaval paulistano estar aberto a experimentar outras influências além do samba.

Maioria dos blocos ainda acontece na região da Sé e da Vila Madalena

“Aqui, os blocos desfilam com o som do Beatles, do frevo, do axé. Desassociam o samba do carnaval. O fenômeno dos blocos de carnaval não tem muito a ver com samba. É uma coisa democrática.”

O estudioso de cultura popular menciona ter desde blocos em São Paulo seguindo o modelo do Nordeste, com trio elétrico, até os que usam ritmistas de bateria de escola de samba.

A questão, no entanto, mais fundamental para Bruno Baronetti, com referência ao atual carnaval de São Paulo, é o estabelecimento de uma nova relação de seus moradores com a cidade.

“É a ocupação do espaço público. A experiência de vivenciar a rua. Em um momento em que as pessoas se fecham em condomínios por conta da insegurança e da verticalização urbana, tornando São Paulo uma cidade hostil, ocupar as avenidas e ruas dela é um fenômeno muito interessante.”

História

São Paulo sempre teve blocos, mas nunca foram muito grandes. O que se tornou grande nas últimas décadas foram os desfiles das escolas de samba da cidade. O pesquisador aponta que haviam bandas que funcionavam como blocos também.

“Os blocos não pegavam na cidade como um todo. Mas se percebe que nas antigas agremiações a renovação delas foram lentas, mas ainda são reconhecidas em suas localidades”.

Com relação aos novos blocos que surgiram nessa onda, ele não sabe se terá vida longa e, inclusive, alguns já se acabaram. “São Paulo aprendeu a ocupar o espaço público. Isso será perene”, acredita.

O carnaval de rua de são Paulo começou no início do século passado, destaca o pesquisador. “Nas décadas de 1940 e 1950 arrastavam multidões, sobretudo no centro.”

Além disso, as escolas de samba sempre desfilaram em seus bairros de origem, mantendo um vínculo forte com suas comunidades.

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