Beth Carvalho não escolheu o sambista, mas o samba

Cantora morta nesta terça 30 foi uma das maiores descobridoras de sucessos da música brasileira

Foto: Ivone Perez/Wikimedia Commons)

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A capacidade de um intérprete escolher uma música para registro fonográfico exige, acima de tudo, frequentar lugares para encontrar compositores, em vez de ficar em casa esperando a música cair no colo.

Beth Carvalho, morta nesta terça 30, foi sem dúvida uma das cantoras brasileiras que melhor fez isso.

Essa capacidade lhe permitiu produzir inúmeros sucessos de compositores mais diversos e desconhecidos possíveis. A busca pela melhor da produção musical do samba para apresentar em seus discos a faz ser idolatrada pelos sambistas.

Sabia-se no meio que de Beth Carvalho poderia se esperar o ouvido atento, algo raro, quando a maioria dos artistas, na primeira guinada para cima, monta seu repertório em confraria de amigos ou na expectativa de receber algo alinhado aos seus desejos musicais.

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Pois a Madrinha do Samba frequentou a vida inteira rodas de samba, onde quer que fosse, mesmo com cadeira de rodas, com a saúde já frágil, e nelas observava atentamente os trabalhos autorais nunca registrados.


Claro, ela sabia previamente onde se depararia com isso e que lhe proporcionaria algo além de sua notória presença.

Com essa conduta, lançou vários sambistas. Passou a ser uma cantora respeitada por essa garimpagem e interesse de buscar na fonte, durante sua bela carreira, ótimas composições, na maioria das vezes de gente extremamente talentosa, mas alijada do sistema musical além dos guetos do samba.

Esse exemplo maior talvez tenha sido a sua aproximação do Samba da Vela, em São Paulo, nos anos 2000. Trata-se de um dos primeiros sambas de comunidade no país no ciclo do samba pós-geração Cacique de Ramos – aliás, grupo do Rio do qual ela lançou vários compositores, que depois estabeleceram carreira solo consistente.

AFP: amigos se despedem de Beth Carvalho

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Mas o fato é que não só nas rodas de segunda do Samba da Vela ela esteve, mas também levou ao disco a gravação de alguns talentos dali surgidos. A cantora poderia não ter feito isso, como não faz vários cantores quando alcança o estrelato.

Ela, no entanto, foi beber da fonte, mesmo com o sucesso já solidificado. Continuou indo além. Saía da confortável casa conquistada na vida artística, para ir atrás da música boa, do samba solene e brilhante, escondido nos encontros de samba em botequins muitas vezes vagabundos e desprestigiados.

Beth Carvalho é exemplo do compromisso do artista com a música. O fato de ter sido pelo samba, a engrandece ainda mais, pois este gênero musical é a gênese desse país.

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