Cultura

Belchior, esse desespero é moda em 2016

No aniversário de 70 anos do cantor, celebrado no dia 26, selecionamos 15 versos do álbum “Alucinação”, de 1976, que ajudam a entender o Brasil hoje

Belchior, esse desespero é moda em 2016
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Eu sou apenas um rapaz latino americano sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior

Um hino para o jovem contemporâneo que está ralando para encontrar seu lugar ao sol na cidade grande e desconfia da pregação do colega dos Jardins sobre as virtudes da meritocracia. 

Sons e palavras são navalhas. E eu não posso cantar como convém sem querer ferir ninguém

Fica a dica para quem entrou nos grupos de Facebook e Whatsapp em busca de amizade e aplausos. 

O passado é uma roupa que não nos serve mais

Um lembrete para quem viu no figurino dos sobreviventes do governo Sarney um bote salva-vidas dos desafios políticos de 2016. 

Apesar de termos feito tudo o que fizemos ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais

Sobretudo quando ouvimos, em pleno 2016, que o homem (49% da população, 90% no Congresso) não leva jeito para ajudar nas tarefas de casa, que o sonho de toda mulher é casar, ser mãe e cuidar do lar e que ela e suas roupas são as únicas responsáveis pela violência de gênero. 

Quem me deu a ideia de uma nova consciência e juventude está em casa, guardado por Deus contando vil metal

Ou virou apelido na planilha da Odebrecht. 

Ano passado eu morri. Mas neste ano eu não morro.

Mantra para o que sobrar de nós em 2017 

A única forma que pode ser norma é nenhuma regra ter, é nunca fazer nada que o mestre mandar, sempre desobedecer, nunca reverenciar.

Repare que quem mais reverencia as velhas autoridades (religiosas, políticas, financeiras) é justamente quem mais confunde pensamento crítico com doutrinação. Sabem de nada, mas não são inocentes. 

Minha alucinação é suportar o dia a dia. Meu delírio é a experiência com coisas reais.

Porque hoje em dia, quando se anuncia o perigo da invasão russa pelo Twitter, está tudo tão de ponta-cabeça que, mesmo sóbrios, já não sabemos quando a notícia é delírio e quando o delírio é notícia. A lucidez é insuportável 

Amar e mudar as coisas me interessa mais

Ou, num mundo de privilégios consolidados, podemos agir como haters – aqueles sujeitos online que berram, xingam, latem e mordem a qualquer sinal de mudança 

Não cante vitória muito cedo. Não me leve flores para a cova do inimigo. As lágrimas dos jovens são fortes como um segredo: podem fazer renascer um mal antigo

Um alerta aos que imaginavam que a guerra estava ganha ao fim da ditadura e agora não sabem explicar tantos cartazes espalhados pela Paulista em dia de protesto. 

Sempre é dia de ironia no meu coração

Ainda hoje é, às vezes ou quase sempre, o único remédio. 

Se você vier me perguntar por onde andei no tempo em que você sonhava, de olhos abertos lhe direi: amigo, eu me desesperava

O velho conflito hamletiano dos que veem o mundo e se desesperam e os que não veem, ou fingem não ver, e esperam sentados o paraíso, a salvação, a canonização, as férias, as fotos do jantarzinho top, etc  

Tenho 25 anos de sonho, de sangue e de América do Sul

Por aqui, as veias seguem abertas para quem, após os 25, não tem como única saída o aeroporto para fazer compras na América do Norte 

São Paulo violento, corre o rio que me engana

E, agora, acelera! 

Quero desejar, antes do fim, pra mim e os meus amigos, muito amor e tudo mais; que fiquem sempre jovens e tenham as mãos limpas, e aprendam o delírio com coisas reais.

Faz 40 anos. E ainda não aprendemos

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