Cultura

A casa da mãe joana

A Câmara Federal está perdendo uma bela oportunidade de se apresentar à nação como guardiã da decência

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Depois desse pingue-pongue que se começou a jogar na Câmara Federal, principalmente tendo em vista o que aconteceu em seu Conselho de Ética, começo a desconfiar do sistema republicano/representativo. Aliás, cá entre nós, começo a desconfiar de sistema. 

Meu amigo Adamastor, o mais antigo de todos os gigantes do sul da África, afirma com sua fé na humanidade que não houve intenção irônica na escolha da designação daquele conselho.

Acompanhei o trabalho dos senhores deputados durante algum tempo, ouvi as desculpas de um deles, que disse ter bebido um pouco a mais que sua medida, misturando o álcool a medicamentos de faixa preta, pois não é que com essa alegação tentou justificar uma assinatura falsa?

Nas escolas onde estudei, todos nós aprendemos que isso é crime comum, passível de prisão. Bem, mas o indigitado é membro do Conselho de Ética, ele pode.

Frustrado em minhas expectativas patrióticas, fui apelar à ciência de meu amigo Deonísio da Silva, que ele compartilhou conosco em seu livro A vida íntima das frases.

Eu precisava saber, até por uma questão de equilíbrio emocional, a origem da expressão “a casa da mãe Joana”. O significado, esse eu já intuía, pois basta que nós, como nação, nos olhemos no espelho.

Deve-se a expressão à condessa de Provença e rainha de Nápoles, que se chamava Joana, claro. Isso foi no século XIV. Por alguma razão política, a rainha Joana viu-se obrigada a refugiar-se em Avignon, cidade ao sul da França, já perto do Mediterrâneo.

Uma das medidas que tomou, enquanto viveu na cidade, foi a regulamentação dos bordéis, sendo uma das normas: “O lugar terá uma porta por onde todos possam entrar”. Não entendi muito bem a norma, mas meu amigo Adamastor vive dizendo que padeço de alguma deficiência de cognição. Então tá.

Essas casas em que todos podiam entrar passaram a ser conhecidas como as “casas de mãe Joana”. Em português de dia de semana, costumamos designá-las com o substantivo “zona”, o mesmo que prostíbulo.

Confesso que não me sinto nada confortável morando numa verdadeira “casa de mãe Joana”, mesmo que contra minha vontade. Acontece que, por alguns efeitos residuais do modo como me ensinaram a ver o mundo e a vida, bem que eu preferia morar em casa de maior respeitabilidade.

O que falta ainda para que o povo deste país descreia inteiramente de suas instituições?
A Câmara Federal está perdendo uma bela oportunidade de se apresentar à nação como guardiã da decência. 

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