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Um mercado em transformação

Vinicius Pagin fala sobre as mudanças na aquisição e distribuição de filmes após a pandemia e o streaming

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Conclave, com Ralph ­Fiennes, e Maria Callas, protagonizado por ­Angelina Jolie, escolhidos, respectivamente, para o encerramento do Festival do Rio, no domingo 13, e para a abertura da Mostra de S. Paulo, na quarta-feira 16, têm uma marca em comum: ambos serão distribuídos no Brasil pela Diamond Films.

E não se trata de coincidência. A empresa tem, até 2026, mais de 60 longas-metragens a estrear no País. Apenas este ano, no Festival de Cannes, o selo adquiriu 12 títulos – dez dos quais a ser lançados no Brasil.

Pertencem também à Diamond alguns dos mais badalados filmes de gênero deste ano, como o terror Long Legs – Vínculo Mortal, com Nicholas Cage, a ação Guerra Civil, que traz Wagner Moura no elenco, além de dramas e comédias.

“Chamamos de produção independente tudo aquilo que não é produzido pelos cinco grandes estúdios (Universal, Paramount, Warner Bros., Walt Disney e Sony)”, explica Vinicius Pagin, diretor da distribuidora que está no Brasil desde 2013, mas que, após a pandemia, conquistou novo status.

Isso não se deveu apenas ao volume, mas ao fato de virem sendo lançadas por eles muitas das obras selecionadas para festivais relevantes, além das produções da A24, que, em 2023, venceu as categorias principais do Oscar, com Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo e A Baleia.

Nesta conversa com CartaCapital, na sede da empresa, em uma rua tranquila e arborizada na Zona Oeste de São Paulo, Pagin, com a cautela de quem trabalha para um grupo internacional, falou sobre as transformações no mercado de aquisição e distribuição de conteúdo audiovisual.

CartaCapital: A pandemia e o ­streaming tiveram grande impacto sobre a distribuição de filmes – quebrou-se, inclusive, a antiga ordem de janelas, que significava lançar primeiro no cinema e depois, em prazos mais ou menos preestabelecidos, em outras mídias. Como você define o momento atual?
Vinicius Pagin: Com a pandemia, testou-se de tudo: estreia simultânea em salas e streaming, janela de dez dias, lançamento direto nas plataformas, mas, agora, o padrão é a janela de 45 dias para cinema. O que a pandemia fez foi acelerar o processo de verticalização dos estúdios, que hoje podem adquirir cinemas (uma lei da década de 1940 impedia a prática nos EUA). O único dos cinco grandes a não criar a própria plataforma foi a Sony. Então, para ter acesso a todo o conteúdo, o consumidor tem de assinar vários serviços. Nessa verticalização, a Diamond soube encontrar seu espaço, voltando-se para as produções independentes – as plataformas precisam desse conteúdo.

CC: Qual é a origem da Diamond?
VP: A empresa nasceu na Argentina, na década de 1960, como produtora de conteúdo para tevê e, a certa altura, para ampliar o portfólio, passou a fazer aquisição de filmes. Mas eles perceberam que era mais fácil adquirir os direitos para a América Latina toda, e para diferentes janelas, do que apenas para a televisão argentina. Em 2010, a empresa adquiriu os direitos de O Discurso do Rei, lançado com parceiros em todos os mercados da América Latina. A partir de 2013, a Diamond abriu um escritório no Brasil, e passou a distribuir seus filmes diretamente.

CC: A empresa atua em que países?
VP: Os maiores mercados da Diamond, em volume de ingressos vendidos, são México, Brasil e Espanha. Em dólares, a Espanha chega a passar o Brasil em alguns títulos. Mas o Brasil, muito frequentemente, fica entre os cinco maiores mercados do mundo.

“O México, com metade da população do Brasil, tem quase o dobro de salas”

CC: O que é particular no mercado de salas brasileiro?
VP: O País tem mais de cem exibidores, e isso significa, para uma distribuidora, negociar com um número grande de empresas. Nos outros países, o mercado é mais concentrado. No México, por exemplo, a Cinépolis tem 70% das salas. Outra dificuldade é que a maioria dos complexos tem quatro salas ou menos. O México, com metade da população do Brasil, tem quase o dobro de salas.

CC: O público ainda não voltou ao patamar pré-pandêmico, e não se sabe se voltará. Como fazer um lançamento em cinema se pagar?
VP: Lançar um filme envolve escolher a data certa e decidir o tamanho do lançamento e dos investimentos em ­marketing. Esse é o grande xadrez, porque os filmes não têm os mesmos valores de aquisição ou lançamento. E, no caso do cinema independente, esses valores não são diretamente ligados ao valor de produção, como nos estúdios. Um catálogo grande é o que nos permite ter um projeto que dá certo e outro não.

CC: Anatomia de Uma Queda, por exemplo, pagou-se nas salas de cinema?
VP: Sim, ele saiu no azul. Zona de Interesse também foi muito bem no Brasil. Esse tipo de filme costuma a ir bem aqui– e também na Argentina e no Chile. Mas, por exemplo, Uma Prova de Coragem foi muito melhor no México e na Colômbia do que aqui. Tem aquela frase: “Todo filme é bom para alguém. Se a pessoa vai pagar ingresso para ver, já é outra história”.

CC: Quais foram os melhores resultados da Diamond, em cinema, nos últimos anos no Brasil?
VP: Em 2022, a Órfã 2: A Origem; em 2023, Fale Comigo, um filme adquirido ainda no roteiro; e, em 2024, Guerra Civil.

CC: Depois do cinema, muitos filmes da Diamond vão para a Prime ­Video. Como é esse acordo?
VP: Temos títulos em diversas plataformas de streaming, além de parceiros de aluguel de filmes e negociações com canais de televisão aberta e fechada por toda a América Latina. Nosso catálogo é vasto e temos os direitos de exploração comercial por vários anos, ampliando o potencial comercial dos filmes. •

Publicado na edição n° 1332 de CartaCapital, em 16 de outubro de 2024.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Um mercado em transformação’

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