Opinião

Sugestão ao Itamaraty: cursos de culinária para futuros embaixadores

Ainda bem que o precavido presidente Jair Bolsonaro achou no filho Eduardo um expert em hambúrguer, prato-símbolo da rica cozinha de Tio Sam

Ernesto Araújo e Eduardo Bolsonaro. Foto: Arthur Max/Ministério das Relações Exteriores
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Dirijo aos meus atentos botões um cacho de perguntas. É admissível que o embaixador do Brasil no Reino Unido não saiba executar com êxito absoluto a receita da sopa de Stilton? É aceitável que o embaixador na Itália não saiba levar à mesa um bollito misto à moda de Módena por ele mesmo preparado (indispensáveis, mas cozidos em separado, zampone, cotechino, língua, músculo e testina, e uma enchova na salsetta verde), ou uma pasta con le sarde àlla siracusana? É aceitável que o embaixador em Portugal não saiba preparar com suas próprias mãos diplomáticas um bacalhau à Zé do Pipo ou um arroz de pato? Em uníssono, do paletó à camisa, os botões clamam: nunca, de jeito algum.

Ainda bem que o precavido presidente Jair Bolsonaro achou no filho Eduardo um expert em hambúrguer, prato-símbolo da rica cozinha de Tio Sam, a qualificá-lo inequivocamente como embaixador em Washington. E ainda falam em nepotismo… Permito-me aproveitar a preciosa deixa da lavra sábia do ex-capitão para formular a proposta de CartaCapital: instituir no Itamaraty cursos de culinária avançada, de sorte a definir os atributos de cada qual entre aqueles que amadurecem para o posto de embaixador.

Diga-se que, nesta conjuntura, outra ideia me ocorre. E não seria o caso de transformar este heb-domadário em revista de humor? A mudança facilitaria a nossa árdua tarefa de praticar o jornalismo como convém e buscar uma forma mais condizente de lidar com a demência impavidamente generalizada. Excluímos os nossos leitores do atual manicômio e eis a questão: aprovariam eles a alteração de rota? Talvez fosse recomendável uma pesquisa, convenhamos, no entanto, que pouco resta a dizer depois de constatar o progresso inexorável da epidemia.

O Brasil, como é próprio da doença que o acomete, adapta-se à realidade insana e finge viver a normalidade, ou acredita em quimeras, sem deixar de incluir no enredo os cidadãos incapazes de se perceber como primeiras vítimas da desgraça. A maioria é uma grei acossada por lobos. E se Bolsonaro afirma que os indicadores econômicos são muito bons, ninguém o contesta baseado nas evidências contrárias. Assistimos à demolição do País sem maiores resistências. Onde está a oposição parlamentar, obrigada a sofrer, inclusive, as consequências da índole nativa inclinada à fuga e à traição para padecer baixas de hipócritas e covardes?

 

Nunca foi tão evidente o fracasso da pretensa esquerda, incapaz de conduzir o povo à consciência da cidadania, sempre disposta à ideia da conciliação, enquanto a casa-grande e a senzala permanecem de pé. A mansão senhorial soube como se aproveitar da situação. Nesta edição, a capa nos traz a peculiar figura de Deltan Dallagnol, às vezes ensombreada pelas poses do inquisidor-mor Sérgio Moro. Mesmo assim, CartaCapital jamais o perdeu de vista. Já o enxergou no papel de Pedro, o Eremita, pregador da Primeira Cruzada, e hoje banalizado por seus comportamentos, a mostrar que a brasilidade tem inúmeras formas de se exibir. Personagem central do inaudito processo que sem provas condenou e prendeu o ex-presidente Lula, objetivo final do golpe de 2016, cuja pedra angular é a Lava Jato. Nunca esqueceremos o fatídico PowerPoint apresentado por Dallagnol, a declinar as razões de um crime inexistente com o aval de uma Suprema Corte de fancaria contra o nosso único líder popular. E contra o Brasil.

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