CartaCapital
STF/ “Não é espetáculo”
Ao assumir a presidência da Corte, Fachin sugere contenção aos colegas


De perfil discreto, o ministro Edson Fachin assumiu a presidência do Supremo Tribunal Federal na segunda-feira 29, dispensando coquetéis, jantares e festas para marcar a posse. Em seu discurso, defendeu o diálogo entre os Poderes, elogiou o trabalho do colega Alexandre de Moraes na condução da ação penal da trama golpista e fez um apelo por sobriedade aos integrantes da Corte. “A independência judicial não é um privilégio, e sim uma condição republicana. Um Judiciário submisso – seja a quem for, mesmo que ao populismo – perde sua credibilidade. A prestação jurisdicional não é espetáculo, exige contenção”, afirmou.
Fachin também prometeu uma gestão austera no uso de recursos públicos. “Juízes educam por seus exemplos. Servidores públicos que somos, temos direito a um padrão remuneratório digno, que ao mesmo tempo assegure a independência funcional e não perpetue privilégios.”
O contraste com o antecessor é evidente. À frente do STF, o midiático ministro Luís Roberto Barroso sempre foi reativo às críticas sobre os gastos do Judiciário e endossou os argumentos de associações de magistrados que defendem os penduricalhos salariais. Na festa de despedida, Barroso caiu no samba e arriscou versos de Jorge Aragão ao microfone: Aí foi que o barraco desabou / Nessa que meu barco se perdeu / Nele está gravado só você e eu.
Corda esticada
Na esteira da PEC da Blindagem e em nova provocação ao Supremo Tribunal Federal, deputados aprovaram, na terça-feira 30, um Projeto de Lei que limita as decisões monocráticas de ministros da Corte. De autoria de Marcos Pereira (Republicanos) e relatado por Alex Manente (Cidadania), o texto foi aprovado em caráter terminativo na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e deve seguir diretamente ao Senado. Pela proposta, os magistrados que proferirem decisões individuais deverão justificar sua urgência e submeter o despacho à análise do plenário na sessão seguinte. Caso isso não ocorra, a decisão será automaticamente anulada.
São Paulo/ Bebida adulterada
PF investiga origem do metanol que provocou intoxicações no estado
A vigilância sanitária intensificou as fiscalizações em bares paulistas – Imagem: SSP/Polícia Civil/GOVSP
A Polícia Federal instaurou, na segunda 29, um inquérito para apurar casos de intoxicação por metanol. Cinco consumidores morreram no estado de São Paulo após ingerirem bebidas alcoólicas adulteradas com a substância, que pode causar cegueira e levar à morte.
O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, afirmou que a PF investigará a procedência do metanol, a possibilidade de sua distribuição além das fronteiras paulistas e eventuais vínculos com o crime organizado. O PCC é conhecido por utilizar o composto químico na adulteração de combustíveis.
Ainda incomodado com o protagonismo federal na Operação Carbono Oculto, que desarticulou um esquema bilionário de lavagem de dinheiro da facção criminosa, o governador Tarcísio de Freitas criticou a entrada da PF no caso: “Tudo que acontece agora é o PCC. Tem-se especulado sobre a participação do crime organizado nessa adulteração de bebida. Não há evidência alguma”.
Apesar das críticas, o governo paulista não apresentou explicações consistentes para a série de envenenamentos. Até a quarta-feira 1º, a única medida concreta havia sido o fechamento de um bar na região dos Jardins, denunciado por uma mulher que perdeu a visão após consumir caipirinhas no local. A suspeita é de que a vodca usada no coquetel estivesse misturada com metanol.
2026/ “Sou candidato à reeleição”
Após visitar Bolsonaro, Tarcísio de Freitas nega candidatura presidencial
O padrinho cobra maior empenho do governador na campanha por anistia – Imagem: Mauro Pimentel/AFP
Oxímoro ambulante, Tarcísio de Freitas vive há tempos o dilema imposto por seus apoiadores: ser, simultaneamente, bolsonarista e moderado, pacificador e incendiário. Agora, incorpora também o paradoxo de ser um presidenciável que disputará a reeleição ao governo paulista. Ao menos foi o que afirmou na segunda-feira 29, após visitar seu padrinho político, Jair Bolsonaro, que cumpre prisão domiciliar enquanto aguarda o julgamento dos recursos contra a condenação a 27 anos por tentativa de golpe de Estado. “Sou candidato à reeleição, como tenho dito. Isso está claro”, sentenciou.
Com receio de trocar uma reeleição (quase) garantida por um voo incerto rumo ao Planalto, Tarcísio pressiona por unidade na direita antes de embarcar em uma candidatura presidencial. Enfrenta a concorrência aberta de outros governadores bolsonaristas, como Romeu Zema, Ratinho Jr. e Ronaldo Caiado, além de frequentes sinalizações eleitorais vindas da própria família Bolsonaro. Além do filho Eduardo, em autoexílio nos EUA, a ex-primeira-dama Michelle também se coloca como possível sucessora. O chefe do clã, por sua vez, não descarta uma composição com Tarcísio, mas exige maior empenho do governador paulista na campanha por sua anistia.
Câmara turbinada somente em 2030
O Supremo Tribunal Federal formou maioria, na terça-feira 30, para manter o mesmo número de deputados federais das eleições de 2022 no pleito de 2026. O relator Luiz Fux havia atendido a um pedido do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (União Brasil), para que eventuais mudanças na composição da Câmara – que passaria de 513 para 531 deputados, segundo estimativas do Tribunal Superior Eleitoral – só entrem em vigor a partir de 2030. Após conceder a liminar, Fux submeteu a decisão ao plenário virtual do STF para referendo. Além do relator, votaram a favor da medida os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Nunes Marques, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Flávio Dino e Dias Toffoli.
Congresso/ Por falso testemunho
Presidente da Conafer é preso em depoimento à CPMI do INSS
Lopes foi liberado horas depois, após pagamento de fiança – Imagem: Lula Marques/Agência Brasil
O presidente da Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), Carlos Roberto Ferreira Lopes, foi preso em flagrante na madrugada da terça-feira 30, durante depoimento à CPMI do INSS. A detenção ocorreu após os parlamentares concluírem que o dirigente mentiu em várias respostas sobre o envolvimento da entidade em descontos indevidos em aposentadorias e pensões.
De acordo com o presidente da comissão, senador Carlos Viana (Podemos), Lopes cometeu o crime de falso testemunho. “Tentou de todas as formas nos convencer de que se tratava de uma operação perfeitamente legal, mas não é. Sabemos muito bem que isso é lavagem de dinheiro.”
Documentos da Controladoria-Geral da União revelam que, entre 2019 e 2023, a Conafer foi a entidade que mais cresceu em volume de descontos aplicados sobre benefícios do INSS: os valores saltaram de 400 mil para 202 milhões de reais. As investigações indicam que parte dessas cobranças foi realizada sem autorização dos segurados, com uso de assinaturas falsas – em alguns casos, de pessoas já falecidas.
Apesar da prisão em flagrante, Lopes foi liberado horas depois, após pagamento de fiança. O valor não foi divulgado pela Polícia Legislativa.
EUA/ Aviso aos “generais gordos”
Trump e seu secretário de Defesa cobram lealdade ideológica ao governo
Os oficiais das Forças Armadas aguentaram o bullying presidencial em silêncio – Imagem: Jim Watson/AFP
Donald Trump, e seu secretário de Defesa, Pete Hegseth, convocaram 800 oficiais de alta patente das Forças Armadas dos EUA para exigir enquadramento à ideologia direitista do presidente. Quem não estiver alinhado deve deixar o cargo, sugeriu Trump: “Se você não gosta do que estou dizendo, pode sair da sala. É claro, lá se vai sua patente, lá se vai o seu futuro”.
Durante o discurso de abertura, Hegseth atacou políticas de diversidade nas Forças Armadas, classificando-as como responsáveis por “décadas de decadência”. “Líderes políticos tolos e imprudentes definiram o rumo errado, e nos perdemos. Tornamo-nos o Departamento Woke, mas isso acabou”, declarou, usando o termo frequentemente empregado por republicanos e aliados de Trump para criticar pautas progressistas.
O secretário também criticou o condicionamento físico de integrantes da cúpula militar: “É completamente inaceitável ver generais e almirantes gordos nos corredores do Pentágono. A era da aparência pouco profissional acabou. Chega de barbas”. O discurso foi recebido com um silêncio constrangedor. No encerramento, a plateia reagiu com aplausos protocolares.
EUA em shutdown
O governo dos EUA iniciou a suspensão de suas operações nesta quarta-feira 1º, após o fracasso das negociações entre congressistas e o presidente Donald Trump para superar um impasse orçamentário. Este é o 15º shutdown (apagão administrativo) desde 1981 e o primeiro desde o mais longo da história, que durou 35 dias, quase sete anos atrás. A paralisação afeta o funcionamento de diversos departamentos e agências federais, interrompendo o trabalho de centenas de milhares de servidores públicos. No Senado, os republicanos tentaram aprovar um projeto de financiamento temporário, já aprovado pela Câmara dos Representantes, mas não conseguiram os votos democratas necessários para viabilizar a medida. A oposição condicionava o apoio à renovação de benefícios de saúde para milhões de norte-americanos, que expiram no fim do ano.
França/ Let it be
Sarkozy já tem trilha sonora para a temporada no cárcere
O ex-presidente da França foi condenado a cinco anos de prisão – Imagem: Julien de Rose/AFP
Condenado a cinco anos de prisão por associação ilícita, o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy confiou à esposa a missão de montar a trilha sonora para sua temporada na prisão. Em vídeo nas redes sociais, Carla Bruni aparece cantando Let it Be, dos Beatles, para o marido. A câmera parece ser operada pelo próprio Sarkozy. “Posso tocar uma canção para você, meu amor?”, pergunta Bruni, ao pegar o violão.
Sarkozy, que sempre negou qualquer conduta ilegal, foi acusado de negociar um acordo com o ditador líbio Muammar Kaddafi (1942–2011) em 2005, quando ainda era ministro do Interior, oferecendo apoio diplomático ao regime líbio em troca de financiamento eleitoral. A presidente do tribunal, Nathalie Gavarino, reconheceu que não havia provas diretas de que o dinheiro tenha de fato chegado à campanha ou de que Sarkozy tenha conduzido pessoalmente a negociação. Ainda assim, o ex-presidente foi considerado culpado por permitir que assessores próximos mantivessem contatos com a equipe de Kaddafi para tentar viabilizar o repasse.
“Dormirei na prisão de cabeça erguida”, afirmou Sarkozy ao fim do julgamento. Mesmo que recorra da sentença, o político septuagenário deverá cumprir ao menos três anos de prisão.
Publicado na edição n° 1382 de CartaCapital, em 8 de Outubro de 2025.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’
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