CartaCapital
Poder/ Acabaram as aparências
O governo demite indicados dos traidores do “Centrão”


O Palácio do Planalto parece ter se cansado das sucessivas traições dos partidos do “Centrão” que ocupam cargos no Executivo, mas agem como oposição. A ministra Gleisi Hoffmann, das Relações Institucionais, deu início à exoneração dos indicados depois da derrubada da medida provisória que taxava bets e fintechs. São 368 afilhados das legendas, mas nem todos serão defenestrados. A intenção é demarcar terreno, mas manter alguns canais de diálogo. Por enquanto estão salvos, entre outros, os apadrinhados do deputado Arthur Lira, ex-presidente da Câmara, essencial na aprovação da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até 5 mil reais. Para o governo, a derrubada da MP traça uma linha entre quem é minimamente confiável e quem entrou de cabeça na campanha eleitoral de 2026. As ameaças não tardaram e vão da ressurreição do projeto de anistia a pautas-bombas. Sem se identificar, uma liderança do “Centrão” soprou o seguinte no ouvido de jornalistas: “Se o governo acha que não precisa mais da gente, beleza. Estão contando com Senado e Judiciário”, diz esse deputado. “Só que (o governo) esquece que tem uma gama de projetos que, se a Câmara começar a pautar, fica insustentável.”
P.S.: A vingança do Congresso ainda está longe do fim. Os 63 vetos do presidente Lula ao chamado “PL da Devastação”, que flexibilizou as normas ambientais, foram derrubados pelo Senado. O Palácio do Planalto foi avisado com antecedência da derrota. O mais provável é que a pendenga entre o Legislativo e o Executivo acabe no Supremo Tribunal Federal. Enquanto isso, a boiada vai passar à vontade.
Apagão na madrugada
Uma falha em uma subestação no Paraná, causada por um incêndio, interrompeu brevemente o fornecimento elétrico em todas as regiões do País na madrugada da terça-feira 14. A falta de luz durou entre oito minutos e uma hora. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, negou escassez no fornecimento. “Não é falta de energia, é um problema na infraestrutura (…) Quando se fala em apagão, a gente sempre se lembra daqueles tristes episódios de 2001 e 2021, que na verdade aconteceram por falta de energia e de planejamento. Hoje não, hoje temos muita energia.”
STF/ Fofoqueiros no banco de réus
Começa o julgamento do núcleo golpista das fake news
Barros, Denicoli, Rodrigues, Abreu, Moretzsohn, Bormevet e Almeida: as “candinhas” do golpe – Imagem: Redes Sociais
Na primeira intervenção do julgamento do núcleo golpista responsável pela divulgação de mentiras e desinformação a respeito do processo eleitoral e da independência da Justiça, o procurador-geral, Paulo Gonet, defendeu a condenação dos réus. “Foi por meio da contribuição desse núcleo de acusados que a organização criminosa elaborou e disseminou narrativas falsas quanto ao processo eleitoral, quanto aos poderes funcionais e às autoridades que os representam, dando surgimento e impulso à instabilidade social ensejadora da ruptura institucional”, afirmou na manhã da terça-feira 14. Dos sete acusados, cinco integravam o Exército, na ativa ou na reserva: os majores Ailton Barros e Ângelo Denicoli, o subtenente Giancarlo Rodrigues, o coronel Reginaldo Abreu e o tenente-coronel Guilherme Almeida. Completam o núcleo Carlos Moretzsohn, presidente do Instituto Voto Legal, e Marcelo Bormevet, agente da Polícia Federal. Pelo andar da carruagem, os disseminadores de fake news terão muito tempo para tricotar, como “candinhas”, durante os banhos de sol da cadeia.
Boi nuclear
A J&F, holding controlada pelos irmãos Joesley e Wesley Batista, adquiriu por 535 milhões de reais a participação da Eletrobras na estatal Eletronuclear, responsável pela operação das usinas Angra I e Angra II. A aquisição deu-se por meio da Âmbar Energia, um dos braços do grupo. Segundo a empresa, a compra amplia e diversifica o portfólio de geração, que inclui usinas solares, hidrelétricas, termelétricas movidas a biodiesel, biomassa, biogás e gás natural. “A energia nuclear combina estabilidade, previsibilidade e baixas emissões”, afirmou Marcelo Zanatta, presidente da Âmbar.
Argentina/ Esmola e chantagem
Trump ameaça suspender socorro se Milei perder eleição
O argentino foi paparicar o boss – Imagem: Daniel Torok/Casa Branca Oficial
O presidente da Argentina, Javier Milei, foi à Casa Branca na terça-feira 14 beijar a mão de seu salvador. O almoço com Donald Trump aconteceu uma semana depois de os Estados Unidos terem lançado uma boia de 20 bilhões de dólares e impedido o derretimento completo do peso e do mercado acionário de Buenos Aires. Acossado por escândalos de corrupção – a irmã, Karina, é acusada de receber propina na compra de remédios e seu grande trunfo eleitoral, José Luis Espert, viu-se obrigado a desistir da disputa por ligações com um narcotraficante –, Milei ganhou uma sobrevida. Pelo sim, pelo não, Trump achou por bem ser direto na chantagem aos argentinos. Caso o aliado seja derrotado nas eleições legislativas deste mês, ameaçou, a esmola de Washington deixará de pingar. “Se ele perder, não seremos generosos com a Argentina. Nossos acordos estão sujeitos a quem vencer a eleição. Porque, com um socialista, fazer investimentos é muito diferente.” Trump aproveitou a deixa para encaminhar algumas das contrapartidas a tanta generosidade. Quer que a Argentina se afaste da China, grande compradora de matéria-prima do país, e feche um acordo de livre-comércio com os EUA. Resta saber se os argentinos aceitarão a faca no pescoço.
Madagáscar/ A primavera dura pouco
Militares tomam o poder após a fuga do presidente
A revolta civil serviu de pretexto aos fardados – Imagem: Luis Tato/AFP
A exemplo das “Primaveras” árabes do início do século, os protestos liderados pela geração Z de Madagáscar não chegaram ao verão. Na terça-feira 14, militares rebeldes anunciaram o controle do país depois da fuga do presidente, Andry Rajoelina, que havia fracassado em uma tentativa de dissolver o Parlamento. “Tomamos o poder”, afirmou o coronel Michael Randrianirina em cadeia de rádio. Não se sabe se e quando pretendem devolvê-lo aos civis. As manifestações começaram por causa de cortes no fornecimento de água e eletricidade, mas evoluíram para as críticas à corrupção e pelos pedidos de renúncia de Rajoelina. Confrontos com forças de segurança deixaram ao menos 22 mortos. Um dos países mais pobres do mundo, Madagáscar enfrenta sucessivos levantes desde sua independência da França, em 1960. As mais recentes revoltas, de 2009, levaram à queda do então presidente Marc Ravalomanana. Rajoelina emergiu justamente no vácuo do poder. Governou o país entre 2009 e 2014 e de 2019 a 2023, quando foi reeleito, em disputas marcadas por contestações e boicotes da oposição.
Maduro no alvo
A Casa Branca autorizou ações secretas da CIA na Venezuela, segundo informações divulgadas pelo jornal The New York Times e confirmadas pelo próprio Donald Trump. Isso incluiria “operações letais” contra o presidente Nicolás Maduro e outros integrantes do governo venezuelano. Na terça-feira 14, um barco próximo à costa do país caribenho foi bombardeado e os seis passageiros morreram. Os EUA alegam, sem provas, que tem atacado embarcações carregadas de drogas. Na quarta-feira 15, três bombardeiros B–52 sobrevoaram o Mar do Caribe. Washington não descarta a disparada de mísseis em território venezuelano. O objetivo é derrubar o atual governo.
Estados Unidos/ Desvio de rota
As medidas restritivas do governo Trump afastam os turistas
Las Vegas implora pela volta de canadenses e mexicanos – Imagem: iStockphoto
“Por favor, venham. Amamos vocês, precisamos de vocês e sentimos sua falta”, implorou aos canadenses a prefeita de Las Vegas, Shelley Berkley. As ameaças de anexação e as tarifas impostas por Donald Trump afastaram os vizinhos dos cassinos – e de outras partes dos Estados Unidos. “Temos um mercado muito grande com os canadenses, mas ele passou de uma torneira aberta para um gotejamento”, insistiu Berkley em entrevista à BBC. “E o mesmo acontece com o México. Costumávamos ter vários grandes apostadores que agora não estão interessados em vir.” Em julho, pelo sétimo mês consecutivo, o setor de turismo na cidade registrou queda no número de visitantes. Foram 3,2 milhões no total, 12% a menos em relação ao ano anterior. O turismo representa 3% do PIB dos Estados Unidos. O WTC, conselho mundial do setor, prevê uma redução de 12 bilhões de dólares no faturamento da cadeia norte-americana neste ano, em comparação com 2024. Segundo o WTC, os EUA serão o único país do mundo no qual os gastos de visitantes internacionais vão cair.
Publicado na edição n° 1384 de CartaCapital, em 22 de outubro de 2025.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’
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