CartaCapital

assine e leia

Legislativo/ Foragidos federais

Deputados fujões custam mais de 400 mil reais por mês e ainda aprovam emendas milionárias

Legislativo/ Foragidos federais
Legislativo/ Foragidos federais
Ramagem, Zambelli e Eduardo Bolsonaro não votam, mas pesam no orçamento da Câmara – Imagem: Gage Skidmore e Zeca Ribeiro/Agência Câmara
Apoie Siga-nos no

Fora do Brasil há meses e impedidos de exercer seus mandatos, Alexandre Ramagem, Carla Zambelli e Eduardo Bolsonaro, todos do PL, ainda custam 400 mil reais por mês aos cofres da Câmara dos Deputados. Embora seus salários e cotas parlamentares estejam bloqueados, os gabinetes seguem ativos, sustentados com recursos públicos. E, ao que tudo indica, essa situação deve continuar­ assim por um bom tempo, graças ao inestimável apoio de colegas dispostos a tolerar parlamentares foragidos da Justiça.

Na terça-feira 2, o deputado Diego Garcia (Republicanos) deu uma bela mostra dessa tolerância. Relator do processo contra Zambelli­ na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, ele apresentou parecer contrário à cassação do mandato da parlamentar. Condenada duas vezes pelo Supremo Tribunal Federal – a dez anos de prisão por falsidade ideológica e invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça, e a 5 anos e 3 meses por porte ilegal de arma e constrangimento ilegal no episódio da perseguição a um eleitor de Lula pelas ruas de São Paulo – a deputada está presa na Itália, onde aguarda o julgamento do seu processo de extradição.

O STF já reconheceu o “trânsito em julgado” em ambos os casos. Ou seja, não há possibilidade de recursos. Mesmo assim, Garcia resolveu inovar. “Analisei toda a ação e todos os documentos aos quais tive acesso e o que encontrei foram suspeitas, mas não há certeza de que a deputada tenha ordenado as invasões”, disse o parlamentar, ao recomendar a manutenção do mandato de Zambelli.

Já Ramagem, condenado a 16 anos de prisão por sua participação na trama golpista, além da perda do mandato e da suspensão dos vencimentos, está foragido nos EUA desde setembro. Seu salário, de 46,3 mil reais, só foi bloqueado pela Câmara na segunda-feira 1º, em cumprimento de uma decisão do STF. Mas seu gabinete continua ativo e o fugitivo conseguiu o feito de aprovar 40,2 milhões de reais em emendas no orçamento de 2026.

Eduardo Bolsonaro também conseguiu emplacar igual valor em emendas, mesmo em seu autoexílio nos EUA desde março. Réu por coação no curso do processo – por sua atuação para que o governo Trump aplicasse sanções contra autoridades responsáveis pela investigação e julgamento do seu pai –, ele ainda não é considerado um foragido da Justiça, mas está, desde agosto, impedido de registrar presença e votar nas sessões da Câmara. Ainda assim, seus colegas relutam em cassar seu mandato.

CNH sem autoescola

O Conselho Nacional de Trânsito (Contran) aprovou, em 1º de dezembro, uma resolução que simplifica a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). A principal mudança é o fim da obrigatoriedade de frequentar aulas em autoescolas na preparação para os exames teórico e prático. A Secretaria Nacional de Trânsito estima a existência de 20 milhões de motoristas não habilitados no País. “Baratear e desburocratizar a obtenção da CNH é uma política pública de inclusão produtiva, porque habilitação significa trabalho, renda e autonomia. Estamos modernizando o sistema, ampliando o acesso e mantendo toda a segurança necessária”, afirmou o ministro dos Transportes, Renan Filho. O texto proposto pela pasta foi aprovado por unanimidade e entrará em vigor após publicação no Diário Oficial da União.

Justiça/ Golpistas na enfermaria

Moraes determina perícia em general Heleno para comprovar Alzheimer

O ex-ministro pleiteia a prisão domiciliar – Imagem: Ton Molina/STF

Não é apenas Jair Bolsonaro, tão orgulhoso do seu “histórico de atleta” no auge da pandemia de Covid–19, que viu a saúde se deteriorar repentinamente após a condenação por tentativa de golpe de Estado. Recentemente, o general Augusto Heleno surpreendeu a muitos – quase todos – com a revelação de que padece de Mal de Alzheimer desde 2018. A revelação veio à tona em uma avaliação clínica a que foi submetido no Comando Militar do Planalto, em Brasília, onde começou a cumprir a pena de 21 anos de prisão. Pouco depois, sua defesa tratou de ajustar a narrativa, esclarecendo que o diagnóstico seria de 2025, e não de sete anos antes, como o próprio militar havia dito à equipe médica.

Seria, de fato, um escândalo se o general admitisse ter ocultado um quadro de demência progressiva durante os quatro anos em que comandou o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, ao qual está subordinada a Agência Brasileira de Inteligência. Dias depois, a Procuradoria-Geral da República manifestou-se favorável à concessão de “prisão domiciliar humanitária”. Desconfiado, o ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal sobre a trama golpista no Supremo Tribunal Federal, determinou que a defesa de Heleno apresentasse todos os exames e relatórios médicos relacionados ao Alzheimer desde 2018. Só então os advogados retificaram a informação, afirmando que a descoberta da doença é recente. A confusão de datas talvez seja apenas mais um sintoma do conveniente diagnóstico, que agora será submetido a perícia requisitada por Moraes à Polícia Federal.

No bunker da Lava Jato

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, autorizou buscas na 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba, onde o ex-juiz e atual senador Sergio Moro, do União Brasil, atuou no processo da Lava Jato. Conduzida pela Polícia Federal, a recente operação mira arquivos mencionados em denúncias do ex-deputado estadual Tony Garcia, que em 2023 afirmou ter sido obrigado por Moro a gravar ilegalmente políticos, magistrados e autoridades no caso Banestado, em 2004. Toffoli determinou apreensão de inquéritos, acordos de colaboração premiada, mídias e, em especial, uma caixa amarela de arquivos com as supostas gravações clandestinas.

2026/ Retrato rasgado

Michelle e filhos de Bolsonaro travam disputa por espólio do capitão

A ex-primeira-dama rejeita um apoio do PL a Ciro Gomes no Ceará – Imagem: Marina Uezima/Brazil Photo Press/AFP

Após Michelle Bolsonaro criticar a articulação do PL para apoiar a candidatura de Ciro Gomes (PSDB) ao governo do Ceará, os quatro filhos de Jair Bolsonaro se uniram para atacar a madrasta. O estopim da enésima crise familiar foi aceso em um comício em Fortaleza, no qual a ex-primeira-dama condenou a “precipitação” do deputado André Fernandes, presente no ato, ao buscar uma aproximação com Ciro. “Fazer aliança com o homem que é contra o maior líder da direita não dá”, afirmou no palanque.

Flávio Bolsonaro foi o primeiro a repreender a madrasta. “Michelle atropelou o presidente Bolsonaro, que havia autorizado o movimento”, disse ao portal Metrópoles. Carlos, o filho “Zero Dois”, reforçou o recado nas redes sociais: “Meu irmão está certo”. Eduardo, o “Zero Três”, em autoexílio nos EUA, classificou a declaração da ex-primeira-dama como “injusta e desrespeitosa”. Por sua vez, Jair Renan, o “Zero Quatro”, limitou-se a republicar as postagens dos irmãos.

Com mais seguidores nas redes que cada um dos enteados, Michelle manteve a crítica: “Respeito a opinião deles, mas penso diferente”. Desta vez, a vontade da primeira-dama prevaleceu e as negociações de alianças no Ceará foram suspensas pela direção do PL. Pelo visto, nem precisou esperar o corpo esfriar para a disputa pelo espólio do capitão esquentar.

Rio de Janeiro/ O infiltrado

Presidente da Alerj é preso por suspeita de vazar informações de operação contra TH Joias

O deputado teria alertado o colega sobre a iminente prisão, em setembro – Imagem: Thiago Lontra/Alerj

O presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Rodrigo Bacellar, do União Brasil, foi preso na quarta-feira 3 pela Polícia Federal, durante a Operação Unha e Carne. Ele é suspeito de repassar informações sigilosas da Operação Zargun, que resultou na prisão do então deputado estadual ­Thiego Raimundo dos Santos Silva, o TH Joias. ­Bacellar teria telefonado para o investigado na véspera, dando orientações sobre a ação.

A prisão foi determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Segundo a PF, Bacellar alertou TH Joias sobre a iminente operação para prendê-lo. Ciente da ameaça, o investigado apagou informações do seu aparelho celular e se desfez de objetos de sua casa. Com um novo aparelho, o investigado chegou a gravar um vídeo mostrando os itens que manteria em casa e enviou ao presidente da Alerj.

Preso em setembro, TH Joias é acusado de negociar drogas, armas e drones para o Comando Vermelho. Então filiado ao MDB, ele foi expulso do partido e afastado do mandato. Em sua decisão, Moraes destacou que o presidente da Alerj atuou para “obstruir investigações envolvendo facção criminosa e ações contra o crime organizado, inclusive com influência no Poder Executivo Estadual”. Até recentemente, Bacellar era um denodado aliado do governador Cláudio Castro, mas a relação se deteriorou nos últimos meses, em meio a disputas relacionadas a pretensões eleitorais em 2026.

O clamor do papa no Oriente Médio

Em sua primeira viagem internacional após assumir o comando da Igreja Católica, o papa Leão XIV pediu o fim dos “ataques e hostilidades” no Líbano. O país é alvo frequente de bombardeios das forças israelenses, em meio ao frágil cessar-fogo entre o governo de Israel e o Hezbollah. “O Oriente Médio precisa de novas abordagens para romper a mentalidade de vingança e violência, superar divisões políticas, sociais e religiosas e abrir novos capítulos em nome da reconciliação e da paz”, afirmou o pontífice durante uma missa em Beirute. “O caminho da hostilidade mútua e da destruição no horror da guerra já durou tempo demais, com resultados deploráveis. Precisamos educar nossos corações para a paz.”

STF/ Aí não, Gilmar

O ministro extrapola ao interferir em uma prerrogativa do Senado

Mendes: solução errada para uma preocupação legítima – Imagem: Rosinei Coutinho/STF

Entende-se o escopo da decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, a ser referendada ou não pelo plenário da Corte. Ao determinar que só e apenas só o procurador-geral da República teria poderes para ingressar com um processo de impeachment contra integrantes do STF, Mendes busca uma vacina contra o vírus autoritário que continua vivo nas veias do bolsonarismo e é potencializado pelo oportunismo do “Centrão”. Essa turma não esconde os planos para 2026. Como anda cada vez mais difícil arrumar um candidato para derrotar o presidente Lula, a prioridade passou a ser formar uma maioria no Senado capaz de aprovar a cassação de magistrados do tribunal e complicar a vida do Executivo. A reação preventiva de Mendes não é, porém, o melhor caminho – nem para a Corte nem para a consolidação de uma democracia. Trata-se de um abuso, uma interferência indevida nas prerrogativas do Poder Legislativo. Só aumenta o tumulto e dá margem às críticas, em geral infundadas, ao ativismo e à politização do Judiciário. É preciso encontrar outra maneira de deter o projeto nefasto da extrema-direita. A começar pelas urnas. Se o voto dos brasileiros frustrar as maquinações bolsonaristas, não só o STF estará a salvo. O País também.

Publicado na edição n° 1391 de CartaCapital, em 10 de dezembro de 2025.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Depois de anos bicudos, voltamos a um Brasil minimamente normal. Este novo normal, contudo, segue repleto de incertezas. A ameaça bolsonarista persiste e os apetites do mercado e do Congresso continuam a pressionar o governo. Lá fora, o avanço global da extrema-direita e a brutalidade em Gaza e na Ucrânia arriscam implodir os frágeis alicerces da governança mundial.

CartaCapital não tem o apoio de bancos e fundações. Sobrevive, unicamente, da venda de anúncios e projetos e das contribuições de seus leitores. E seu apoio, leitor, é cada vez mais fundamental.

Não deixe a Carta parar. Se você valoriza o bom jornalismo, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal da revista ou contribua com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

10s