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Justiça/ Lenta e incompleta

Os assassinos de Marielle estão condenados. Agora faltam os mandantes

Justiça/ Lenta e incompleta
Justiça/ Lenta e incompleta
Lessa e Queiroz assinaram acordos de delação premiada e podem ter as penas reduzidas – Imagem: Redes sociais
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Após dois dias de julgamento, o 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro condenou, na ­quinta-feira 31, os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz pelos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, em março de 2018. Autor dos disparos, Lessa foi sentenciado a 78 anos e 9 meses de prisão. Queiroz, que conduziu o carro usado no crime, recebeu uma pena de 59 anos e 8 meses.

Os réus participaram do julgamento por videoconferência. Eles estão presos em unidades diferentes: Lessa em Tremembé, no interior paulista, e Queiroz na Papuda, no Distrito Federal. Ambos foram condenados por duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, mediante emboscada e com uso de recurso que dificultou a defesa das vítimas), por tentativa de homicídio contra Fernanda Chaves, assessora de Marielle e única sobrevivente do atentado, e pela receptação de um carro roubado. Como firmaram acordo de delação premiada, podem ter as penas reduzidas.

Lessa e Queiroz terão ainda de pagar 706 mil reais de indenização por danos morais a cada um dos seguintes parentes das vítimas: Marinete da Silva (mãe de Marielle), Mônica Benício (viúva), Luyara Franco (filha), Agatha Arnaus (viúva de Anderson) e Arthur (filho). Da mesma forma, deverão pagar uma pensão ao filho de Anderson, até ele completar 24 anos.

Primeiro a assinar um acordo de delação, Queiroz confessou que dirigiu o carro usado na emboscada, enquanto o comparsa disparou contra Marielle e Anderson. Já Lessa apontou o deputado Chiquinho Brazão e o conselheiro Domingos Brazão como os mandantes do assassinato da vereadora. Os irmãos Brazão, assim como o ex-delegado Rivaldo Barbosa, acusado de ajudar a planejar o crime, estão presos e aguardam julgamento.

Ao ler sua sentença, a juíza Lúcia Glioche mandou um recado aos sicários que ainda atuam no Rio de Janeiro: “A Justiça, por vezes, é lenta, cega, burra, injusta, errada e torta, mas ela chega”, afirmou. “A Justiça chega para aqueles que acham que jamais serão atingidos por ela.”

Neste caso, a Justiça demorou seis anos para sentenciar os sicários. Faltam os mandantes. Até lá, além de lerda e torta, continuará incompleta.

Acorrentada ao Xandão

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, ordenou que Maria de Fátima Mendonça Jacinto Souza, conhecida como Fátima Tubarão, comece a cumprir sua pena de 17 anos por participação nos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023. Em vídeos gravados no interior do Palácio do Planalto, a mulher de 67 anos aparece enrolada em uma bandeira do Brasil incentivando a depredação do local. “Quebrando tudo e cagando nessa bosta aqui”, afirmou a entusiasmada patriota do município catarinense de Tubarão, antes de mandar um recado para Moraes: “Vamos para a guerra, é guerra agora. Vamos pegar o Xandão”. Condenada pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, associação criminosa armada, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado, ela não tem mais possibilidade de recurso.

Orçamento/ Por pressão do STF

Câmara aprova projeto com novas regras para emendas parlamentares

O texto prevê limites para o crescimento dos gastos e regras de transparência – Imagem: Mário Agra/Agência Câmara

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na terça-feira 5, o projeto de lei que regulamenta a execução das emendas parlamentares. A proposta é fruto de um acordo entre o Legislativo e o Executivo, com o objetivo de resolver o impasse com o Judiciá­rio sobre o pagamento dos recursos. Após a aprovação de um requerimento de urgência, o texto-base obteve 330 votos favoráveis, 74 contrários e duas abstenções. PSOL, Rede e Novo orientaram voto contra, enquanto o PL liberou sua bancada.

Agora, o projeto segue para análise no Senado, com expectativa de votação já na próxima semana, segundo o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, do PSD. O texto prevê limites para o crescimento das emendas, mecanismos para evitar o congelamento de pagamentos, definição de áreas prioritárias e regras de transparência, uma das exigências impostas pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal. A proposta também limita o contingenciamento das emendas, estabelecendo que ele deve ser feito na mesma proporção das demais despesas discricionárias.

Faroeste amazônico

A Polícia Federal concluiu que o assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, ocorrido em junho de 2022 no Vale do Javari, norte do Amazonas, foi motivado pelas atividades de fiscalização do servidor licenciado da Funai. O inquérito apontou Rubén Dario da Silva Villar, conhecido como “Colômbia”, como mandante do crime, e indiciou outras oito pessoas por envolvimento nos assassinatos. O grupo de “Colômbia” atuava com pesca e caça ilegais na região, inclusive dentro de terras indígenas. Além do duplo homicídio, ele é investigado por tráfico de drogas e está preso desde dezembro de 2022. O caso foi encaminhado ao Ministério Público Federal.

Investigação/ As saúvas do Dnit paranaense

Operação investiga esquema de corrupção em obras de rodovias

Os valores desviados dos contratos somam quase 76 milhões de reais – Imagem: Fernando Ogura/GOVPR

Na terça-feira 5, a Controladoria-Geral da União, a Polícia Federal e a Receita Federal deram início à segunda fase da Operação Rolo Compressor, com o objetivo de desarticular um esquema de corrupção, licitação fraudulenta e desvios de recursos públicos envolvendo servidores do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes do Paraná.

Na atual fase, os investigadores apuram irregularidades nas obras de readequação da rodovia BR-163, entre as cidades paranaenses de Toledo e Marechal Cândido Rondon, e na restauração e pavimentação da BR-487, entre Porto Camargo e Serra dos Dourados, também no Paraná. As rodovias são essenciais para o escoamento da produção agrícola no estado.

Os contratos sob análise somam quase 694 milhões de ­reais, dos quais 75,8 milhões teriam sido desviados. Auditorias da CGU apontaram superfaturamento e deficiências na execução das obras que não estavam em conformidade com as normas técnicas. Realizada com o apoio do Ministério Público Federal, a operação resultou no cumprimento de 54 mandados de busca e apreensão em seis estados e no Distrito Federal. O esquema de corrupção no Dnit estaria em funcionamento desde 2011.

Venezuela/ Panos quentes?

O Brasil decide, por ora, não responder a Maduro com a mesma moeda

O presidente venezuelano aponta sua ira à diplomacia brasileira – Imagem: Juan Barreto/AFP

O Itamaraty não tem nenhuma intenção, por enquanto, de convocar a embaixadora em Caracas, Gilvânia Maria de Oliveira. O gesto pretende manter aberto algum canal de diá­logo com o presidente venezuelano Nicolás Maduro. A relação entre os dois países atingiu o ponto mais baixo em duas décadas. O Brasil vetou a entrada do vizinho nos BRICS e se recusa a reconhecer a vitória de Maduro nas eleições presidenciais enquanto o tribunal eleitoral local não divulgar as atas de votação para comprovar os resultados. Na quarta-feira 30, a Venezuela solicitou o retorno do seu embaixador em Brasília, Manuel Vadell, forma de demonstrar insatisfação e primeiro passo para a ruptura. Em comunicado, o governo bolivariano culpa o ex-chanceler Celso Amorim, atual assessor especial de Relações Exteriores do Palácio do Planalto, pela “quebra de confiança” entre as ­duas nações. O ex-ministro brasileiro fez críticas ao processo eleitoral venezuelano durante uma audiência na Câmara dos Deputados. “Amorim tem se comportado mais como um mensageiro do imperialismo norte-americano”, rebate o texto.

Ultraje. Mais um

Israel informou às Nações Unidas na segunda-feira 4 a decisão de banir a UNRWA, agência de apoio aos refugiados palestinos, que operava na região desde 1967. Os israelenses acusam o organismo de abrigar militantes do Hamas, de ter preconceito com o país e de perpetuar o conflito. A direção da UNRWA chamou de “ultrajante” a decisão do Parlamento em Tel-Aviv. Segundo Adnan Abu Hansa, porta-voz da agência, a expulsão implicará o colapso humanitário na Palestina.

Reino Unido/ Distopia na terra de Orwell

Filha de pais nigerianos é a nova líder do Partido Conservador

Badenoch terá de juntar os cacos dos Tories – Imagem: Chris McAnderson/UK Parliament

Negra, descendente de imigrantes, Kemi Badenoch personifica um tipo bastante comum da historiografia, desde tempos imemoriais: o oprimido a serviço do opressor. Eleita nova líder dos Tories, o Partido Conservador britânico, a ex-ministra de Comércio Internacional dos vexatórios governos de Liz Truzz e Rishi Sunak destacou-se na arena política por apoiar as políticas de deportação para Ruanda, mediante uma compensação financeira ao país africano, de migrantes ilegais, negar o racismo (ela diz só ter sofrido preconceito de “esquerdistas”), descrever-se como uma feminista “crítica” e por ser contra a permissão de autodeclaração de transgêneros. O messianismo meritocrático contamina as suas intervenções. Em uma entrevista após ser indicada para a liderança da legenda, saiu-se com esta: “Voltei para este país com 16 anos e agora estou concorrendo a primeira-ministra. Não é incrível? Nasci neste país, mas não cresci aqui. Não entendo por que querem ignorar todas as coisas boas e focar apenas nas coisas ruins, e usar as coisas ruins para contar a história”. Apesar do esforço para agradar, Badenoch está longe de ser unanimidade no partido. Mas, claro, isso nada tem a ver com a cor da sua pele e origem.

Publicado na edição n° 1336 de CartaCapital, em 13 de novembro de 2024.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’

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