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Justiça Eleitoral/ Um morto-vivo no Senado

TSE livra Sergio Moro da cassação, mas o ex-juiz segue isolado na política

Justiça Eleitoral/ Um morto-vivo no Senado
Justiça Eleitoral/ Um morto-vivo no Senado
O parlamentar ainda procura se enturmar no Congresso – Imagem: Jefferson Rudy/Ag. Senado
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O Tribunal Superior Eleitoral rejeitou, na terça-feira 21, os recursos que pediam a cassação do senador Sergio Moro, do União Brasil. Todos os ministros acompanharam o voto do relator Floriano de Azevedo, que considerou “censuráveis” os vultosos gastos na pré-campanha, sobretudo “por candidatos que empenharam a bandeira da moralidade na política”. Ponderou, porém, que não restou provada a conduta fraudulenta ou o desvio de finalidade. “É preciso mais do que o estranhamento, indícios, suspeitas ou convicção. É preciso haver prova, e prova robusta.”

O principal ponto da acusação é que o ex-juiz se beneficiou da pré-campanha à Presidência da República pelo Podemos, na qual teria torrado ao menos 2 milhões de reais do Fundo Partidário, antes de mudar de planos e se candidatar ao Senado pelo União Brasil do Paraná. A acusação apontou ainda indícios de caixa 2, como a contratação do escritório de advocacia de um dos suplentes de Moro, que faturou 1 milhão de reais em três meses.

“Os boatos sobre a cassação de meu mandato foram exagerados”, afirmou Moro, ao celebrar a “decisão técnica” do TSE. Convenientemente, esqueceu-se de mencionar que ele próprio acreditou nos “boatos”, a ponto de escalar a esposa para disputar sua vaga numa eventual eleição suplementar para o Senado – a deputada Rosângela Moro chegou a transferir o domicílio eleitoral de São Paulo para o Paraná, além de ter o nome testado em pesquisas. Da mesma forma, olvidou a peregrinação que fez nos gabinetes de lideranças políticas e ministros das cortes superiores para tentar salvar o próprio mandato. Em uma dessas ocasiões, teria até sido comparado a um “ladrão de galinhas” por Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal, versão amplamente noticiada pela mídia e jamais desmentida.

Desprezado pela classe política e desmoralizado com o melancólico fim da Operação Lava Jato, o ex-juiz conseguiu preservar o mandato, mas segue isolado no Senado, sempre à margem das articulações políticas. Azar da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que também estava de olho na vaga de Moro e liderava as pesquisas de intenção de voto no Paraná.

Outro cadáver da Lava Jato

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, determinou a anulação de todos os atos da Lava Jato contra o executivo Marcelo Odebrecht. No despacho de mais de cem páginas, assinado na terça-feira 21, o ministro considerou que houve conluio entre o então juiz Sergio Moro e procuradores da República que integraram a operação. “O que poderia e deveria ter sido feito na forma da lei para combater a corrupção foi realizado de maneira clandestina e ilegal, equiparando-se órgão acusador aos réus na vala comum de condutas tipificadas como crime.”

Crime organizado/ A serviço do cangaço

Operações da PF miram policiais e CACs envolvidos em venda ilegal de armas

A Polícia Federal confiscou um verdadeiro arsenal com os criminosos – Imagem: PF/PMSP/GAECO

A Polícia Federal deflagrou, na terça-feira 21, duas operações para desmantelar esquemas criminosos de desvio e venda ilegal de armas de fogo e munições. Uma delas, realizada em parceria com o Gaeco paulista, grupo de combate ao crime organizado do Ministério Público de São Paulo, tem como alvo uma quadrilha especializada em roubos que disseminam o terror em cidades do interior, fenômeno conhecido como “novo cangaço”.

Foram cumpridos 13 mandados de prisão temporária e 24 mandados de busca e apreensão. Alguns dos presos têm ligação com o PCC, facção hegemônica nos presídios paulistas. “Além disso, constatou-se que os principais fornecedores das armas de fogo e das munições utilizadas pela organização criminosa são CAC’s (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador)”, informa a PF por meio de nota.

A outra operação, batizada de Fogo Amigo, mira policiais militares da Bahia e de Pernambuco. Os agentes são acusados de desviar, em conluio com donos de lojas de armas e CACs, um arsenal para facções criminosas que ­atuam nos dois estados e também em Alagoas. Ao autorizar a operação, a Justiça determinou ainda o sequestro de bens e bloqueio de valores de até 10 milhões de reais dos investigados.

Réus por invasão no sistema do CNJ

A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade, tornar a deputada federal Carla Zambelli, do PL de São Paulo, e o hacker Walter Delgatti Neto réus por invasão a sistemas do Poder Judiciário, entre eles o Banco Nacional de Mandados de Prisão, mantido pelo Conselho Nacional de Justiça. Ambos responderão pelos crimes de invasão de dispositivo informático e falsidade ideológica, que, somados, podem chegar a seis anos de reclusão, além de multa. A denúncia foi apresentada pela Procuradoria-Geral da República em abril. Em depoimento à Polícia Federal, Delgatti confessou a invasão e afirmou ter recebido 40 mil reais da deputada para inserir uma ordem de prisão falsa contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. A deputada nega ter encomendado o crime.

Judiciário/ Ficou barato

CNJ afasta por 90 dias desembargadora que atacou Marielle Franco

A magistrada se declara vítima do “mau humor profundo” da esquerda – Imagem: Redes sociais

O Conselho Nacional de Justiça condenou, na terça-feira 21, a desembargadora Marília de Castro Neves Vieira, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, à pena de disponibilidade por 90 dias. Nesse período, ela ficará proibida de atuar e terá o salário reduzido, proporcional ao tempo de magistratura. A sanção pode parecer simbólica (e é mesmo), mas é terceira mais grave que um juiz pode sofrer, depois da aposentadoria compulsória e da demissão.

Vieira foi condenada por desvio de conduta em uma série de publicações de cunho político e preconceituoso nas redes sociais. Dias após o assassinato de Marielle Franco, em 2018, a desembargadora escreveu que a vereadora estava “engajada com bandidos” e havia sido eleita com a ajuda de uma facção criminosa. “Seu comportamento, ditado por seu engajamento político, foi determinante para seu trágico fim”.

A magistrada também postou que Guilherme Boulos, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, seria recebido “na bala” após Jair Bolsonaro facilitar a posse de armas e que o ex-deputado Jean Wyllys não escaparia de um “fuzilamento profilático”. Depois, em entrevista ao site Consultor Jurídico, alegou tratar-se de uma brincadeira. “A esquerda é dona de um mau humor profundo.”

Argentina/ Bolsonaro ao quadrado

Javier Milei mostra talento para se tornar um pária mundial

O argentino se supera – Imagem: Vox Espanha

Ernesto Araújo, o esquecível chanceler do governo Bolsonaro, se orgulhava do “sucesso” em transformar o Brasil em um pária na diplomacia internacional. O terraplanista nativo e seu chefe fizeram escola. O presidente argentino, Javier Milei, parece empenhado em superar o aliado ideológico em velocidade, gênero, número, grau e estupidez. Antes de completar seis meses de mandato, Milei jogou por terra décadas, senão séculos, de política externa do vizinho: xingou Lula, desdenhou de Joe Biden, entrou em conflito aberto com a Venezuela e a Colômbia, destratou a China, maior parceiro comercial do país, e acaba de provocar o estremecimento diplomático com a Espanha. Na terça-feira 21, o Ministério dos Negócios Estrangeiros espanhol anunciou a saída­ definitiva da embaixadora em Buenos Aires, um passo rumo ao rompimento das relações. A decisão é uma resposta às declarações de Milei durante uma convenção do partido Vox, de extrema-direita, em Madri. O argentino, que cumpriu uma agenda extraoficial na Espanha (não se reuniu com representantes do governo ou da monarquia), atacou a mulher do primeiro-ministro, Pedro ­Sánchez, alvo de uma falsa denúncia de corrupção. “Que cambada de gente parafusada ao poder e que níveis de abuso pode gerar”, discursou, ao criticar o “socialismo maldito e cancerígeno”. “Mesmo quando tem uma mulher corrupta, digamos suja, e tira cinco dias para pensar nisso.” Milei tem se recusado a pedir desculpas. Não só. Prometeu voltar à Espanha em breve para se reunir com extremistas. Nessa toada, restarão as portas abertas do Paraguai e do Uruguai.

Muy amigo

Uma das testemunhas centrais do julgamento do ex-presidente Donald Trump em Nova York por falsificação dos registros de pagamento em troca do silêncio de uma atriz pornô com quem manteve relações, Michael Cohen, ex-advogado e ex-amigo do magnata, admitiu ter desviado dinheiro das organizações Trump. A defesa do republicano tenta minar a credibilidade do depoimento de Cohen, responsável pelos pagamentos, por ordem do antigo chefe, à atriz Stormy Daniels. Os defensores de Trump argumentam que a compra do silêncio de Daniels não é crime. A promotoria aponta fraude eleitoral.

Irã/ Mistério e sucessão

Ebrahim Raisi, presidente, foi uma das vítimas da queda de um helicóptero

Raisi era candidato a suceder o aiatolá Khamenei – Imagem: Atta Kenare/AFP

Falha técnica? Condições climáticas adversas? O pouso forçado do helicóptero que transportava o presidente do Irã, Ebrahim Raisi, está envolto em mistérios e provavelmente assim permanecerá. O mandatário voltava da inauguração de uma barragem na fronteira com o Azerbaijão e estava acompanhado de três autoridades, entre elas o ministro das Relações Exteriores, Hossein ­Amirabdollahian, e três tripulantes. Não há sobreviventes. O helicóptero, um Bell 212, foi lançado pelos Estados Unidos na década de 1960 e não é mais fabricado, uma mostra dos efeitos do bloqueio internacional liderado por Washington. Mohammad ­Mokhber, primeiro-vice-presidente, comandará o ­país até as eleições presidenciais, em princípio marcadas para 28 de junho. Raisi era o segundo na hierarquia iraniana e favorito para suceder o líder supremo, o aitolá Ali ­Khamenei, de 85 anos. A morte abre caminho para Mojtaba, filho de Khamenei, que disputava o posto com o falecido. Clérigo linha-dura, Mojtaba cultiva a confiança da guarda revolucionária, responsável por manter o regime de pé e a “ordem social”.

Zelensky fica

Na segunda-feira 20, chegou ao fim, oficialmente, o mandato do presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. A lei marcial imposta em fevereiro de 2022, quando a Rússia invadiu o país, impede, no entanto, a realização de eleições e perpetua a permanência do comediante no poder. Zelensky tem rechaçado as conversas sobre sucessão. Em novembro, afirmou que qualquer questionamento a sua legitimidade seria uma “narrativa (sic) hostil”. O presidente conta com apoio popular para permanecer no comando até o desfecho da guerra: 69% dos ucranianos dizem confiar em Zelensky, segundo pesquisas recentes.

Justiça/ Assange ganha tempo

Criador do Wikileaks está autorizado a recorrer da extradição

Assange: uma vitória entre vários reveses – Imagem: Jack Taylor/AFP

Após vários reveses, Julian Assange, fundador do ­Wikileaks, obteve uma vitória na Justiça britânica. Os magistrados Victoria Sharp e ­Jeremy Johnson admitiram o direito do jornalista de contestar a ordem de extradição para os Estados Unidos, o que, no mínimo, prolongará o processo por alguns meses. Os juízes cobram de Washington garantias “satisfatórias” quanto à possibilidade de Assange invocar a primeira emenda da Constituição norte-americana, uma proteção à liberdade de expressão, e uma negativa da possibilidade de aplicação da pena de morte. Os EUA acusam o australiano de 18 crimes de espionagem e intrusão informática. Em 2010 e 2011, o Wikileaks expôs documentos oficiais com registros de violações de direitos humanos cometidos por soldados norte-americanos no Iraque e no Afeganistão. Caso seja extraditado e julgado com base na Lei de Espionagem de 1917, Assange pode ser condenado a até 175 anos de prisão. Na terça-feira 21, o primeiro-ministro da ­Austrália, Anthony Albanese, voltou a pedir a libertação do compatriota. “Continuamos a trabalhar em estreita colaboração (com a Justiça britânica) para alcançar este resultado”, disse a jornalistas.

Publicado na edição n° 1312 de CartaCapital, em 29 de maio de 2024.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’

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