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8 de Janeiro/ Zagueiros do bolsonarismo

André Mendonça e Nunes Marques socorrem aliados do ex-capitão no STF

8 de Janeiro/ Zagueiros do bolsonarismo
8 de Janeiro/ Zagueiros do bolsonarismo
Imagem: Nelson Jr./STF e Carlos Alves Moura/STF
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Mesmo após a vitória de Lula nas urnas, os ministros André Mendonça e Kassio Nunes Marques não disfarçam a atuação em favor do bolsonarismo na Suprema Corte. Nomeados por Jair Bolsonaro, os magistrados estão sempre socorrendo aliados do ex-capitão. Na terça-feira 3, Nunes Marques suspendeu a quebra dos sigilos ­bancário, fiscal, telefônico e telemático de ­Silvinei Vasques, ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal, medida aprovada pela CPI do 8 de Janeiro. Um dia antes, Mendonça pediu para levar ao plenário presencial o julgamento de dois réus dos ataques golpistas.

Na prática, essa última manobra atrasa o resultado das audiências, por obrigar os ministros do Supremo Tribunal Federal a ler os seus votos presencialmente, em vez de simplesmente depositá-los no sistema virtual. Ao todo, a Procuradoria-Geral da República denunciou 1.390 cidadãos por envolvimento nos atos que destruíram as sedes dos três poderes.

Ainda que a PGR tenha sido autorizada a fechar acordos com réus confessos, dezenas, talvez centenas de bolsonaristas serão levados a julgamento na Corte. Sem a agilidade do plenário virtual, levará anos para concluir todas as audiências. Ao justificar sua decisão, Mendonça afirmou haver a necessidade de “exame do caso com maior detença”, visando “prestigiar o princípio da individualização da conduta”.

Em setembro, durante o julgamento de um desses réus, Mendonça disse estranhar o fato de o Ministério da Justiça de Lula ter demorado a apresentar vídeos dos ataques, insinuando que o novo governo teria permitido a devastação de Brasília para colher frutos políticos. Na ocasião, até o colega Alexandre de Moraes perdeu a paciência: “Vossa excelência vem ao tribunal para dizer que houve conspiração do governo contra o próprio governo? Tenha dó”.

Já Nunes Marques alegou não ver “situação concreta” relacionada ao ex-diretor da PRF “que legitime a suspeita de que ele teria cometido ilícitos ligados aos eventos de 8 de janeiro último”. Vasques é, porém, investigado por diferentes órgãos, entre eles a Polícia Federal, por montar operações em rodovias, sobretudo no Nordeste, visando impedir o deslocamento de eleitores de Lula durante a votação no segundo turno. Com os símbolos da PRF, ele também pediu votos para Bolsonaro durante a campanha, razão pela qual o Ministério Público Federal pediu sua condenação por improbidade administrativa. A Justiça Federal no Rio de Janeiro aceitou a denúncia.

Greve para deter as privatizações

Funcionários do Metrô, da CPTM e da Sabesp fizeram uma paralisação, na ­terça-feira 3, para protestar contra as privatizações alardeadas pelo governador paulista Tarcísio de Freitas. Além da motivação trabalhista, em defesa dos empregos ameaçados pela venda das empresas públicas, a greve tem interesse social, argumenta Camila Lisboa, presidente do Sindicato dos Metroviários. “Estão em jogo as condições e a qualidade de serviços essenciais para a população, tanto no caso do transporte público quanto no de abastecimento de água e saneamento básico.” O movimento acabou sabotado pelas milionárias multas impostas pela Justiça do Trabalho, sobretudo após os trabalhadores descumprirem a ordem de manter 100% da operação dos trens e do metrô no horário de pico e de 80% nos demais horários. Os sindicatos recorrem das decisões e prometem manter a mobilização antiprivatista.

Justiça/ No rastro do mandante

Delator cita conselheiro do Tribunal de Contas e caso Marielle vai ao STJ

Denunciado em 2019 por obstrução da Justiça, Brazão agora é alvo de delação – Imagem: Tércio Teixeira

O inquérito que apura o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes foi enviado ao Superior Tribunal de Justiça após surgirem novos indícios da participação de Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro. O caso não foi federalizado. As investigações continuam sob responsabilidade da Polícia Civil e do Ministério Público fluminense, mas as decisões judiciais relacionadas ao suspeito, com direito a foro privilegiado, agora são da competência de ministros do STJ.

Deputado estadual por cinco mandatos, Brazão voltou a ser alvo após ser citado na delação do ex-policial militar Élcio Queiroz, que admitiu ter conduzido o carro usado na emboscada para que o seu comparsa, Ronnie ­Lessa, efetuasse os disparos. Um relatório da Polícia Federal de 2019 apontou Brazão como “suspeito de ser autor intelectual” do crime.

À época, ele foi denunciado pela então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, por obstrução da Justiça, mas o pedido foi rejeitado pelo juiz André Ricardo de Franciscis Ramos, da 28ª Vara Criminal. Dodge também solicitou a federalização do caso e o STJ recusou. Em fevereiro deste ano, o ministro da Justiça, Flávio Dino, colocou a PF para auxiliar nas apurações. Ainda assim o caso permanece na jurisdição estadual.

Brazão voltou a negar o envolvimento no assassinato de Marielle Franco: “Vou buscar na Justiça as reparações de todo o dano à imagem e perturbação com a minha família”.

Tio Sam escanteado

Em agosto, a Eldorado Brasil, fabricante de celulose sediada em São Paulo e com representação em Xangai, na China, despachou um carregamento do produto do Porto de Santos para o de Qingdao. Pela primeira vez na história, toda a transação comercial ocorreu em circuito fechado com as moedas locais, dispensando o dólar. A exportação foi financiada pelo Banco da China Brasil S.A. e liquidada em yuans, e depois convertida diretamente para reais. A desdolarização do comércio internacional é uma bandeira do presidente Lula. Em abril, ele assinou com Xi Jinping um memorando de entendimento para promover o comércio bilateral nas moedas locais. A iniciativa visa reduzir a dependência dos EUA e fortalecer as relações multilaterais.

Rio de Janeiro/ Na bancarrota

Claudio Castro pede a Haddad renegociação de dívida de 8 bilhões

O governador foi prejudicado por benesse eleitoral de Bolsonaro – Imagem: Rogério Santana/GOVRJ

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, pediu ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a renegociação do acordo firmado pelo estado com a União. O regime de recuperação fiscal fluminense prevê um aumento escalado do valor das parcelas até o término do contrato. Para 2024 estão previstos pagamentos que somam 8 bilhões de reais, mas Castro alega só ter condições de honrar os 3 bilhões pagos no decorrer do atual ano.

“Entendo as dificuldades que o ministro Haddad enfrenta, mas, se a gente não avançar nisso, haverá quebradeira nos estados”, declarou. Segundo Castro, a capacidade de pagamento dos governos estaduais foi alterada quando o então presidente Jair Bolsonaro, na tentativa de conter a inflação em ano eleitoral, limitou a cobrança do ICMS sobre os combustíveis. Ao todo, o Rio de Janeiro devia à União 148,1 bilhões de reais em 2022.

Vaticano/ Amor cristão

O papa abre a possibilidade de bênção a casais do mesmo sexo

Caridade e compreensão, prega Francisco – Imagem: Felippo Monteforte/AFP

“Não podemos ser juízes que apenas negam, rejeitam e excluem.” Com estas palavras, o papa Francisco busca uma brecha para uma pequena revolução na Igreja: a possibilidade de padres concederam a bênção a casais do mesmo sexo. Em resposta a cinco cardeais, todos conservadores, Bergoglio tomou o cuidado de expor que a bênção não pode ser confundida com o ritual do casamento. Seu posicionamento é, porém, um avanço diante da proibição explícita do gabinete doutrinal do Vaticano em 2021. “A caridade pastoral deve permear todas as nossas decisões e atitudes”, acrescentou. Segundo Francis DeBernardo, diretor-executivo do New Ways Ministry, que promove a aproximação da Igreja com católicos da comunidade LGBT, a declaração, apesar de não ser um “endosso pleno e sonoro”, é o reconhecimento de que “o amor sagrado pode existir entre casais do mesmo sexo e que esse amor espelha o de Deus”.

Gatinho mimoso

A mídia brasileira insiste em chamar Javier Milei, o Bolsonaro argentino, de ultraliberal. Licença poética. Milei é pior: um mentiroso contumaz, negacionista em essência. No primeiro debate presidencial, o “ultraliberal” minimizou os crimes da ditadura argentina, fartamente documentados nas últimas décadas. “Não foram 30 mil desaparecidos”, declarou na tevê. “Foram 8.753.” O candidato que venceu as prévias e tem grande chance de passar ao segundo turno defendeu ainda a dolarização da economia, o fechamento do Banco Central e a privatização selvagem. Em referência às rebeldes madeixas do extremista, Myriam Bregman, candidata da Frente de Esquerda e Trabalhadores, o chamou de “gatinho mimoso do poder econômico”.

Ucrânia/ O custo da guerra

Arrefece a disposição ocidental de bancar a defesa de Kiev

Sem a retaguarda de Washington, Zelensky fica à deriva – Imagem: Presidência da Ucrânia

Empoderado, como diriam os modernos, pelo dinheiro e as armas ocidentais, Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia, permanece irredutível no propósito de derrotar o inimigo russo. A pergunta é se o ímpeto continuará o mesmo se a fonte de recursos secar – ou for drasticamente reduzida. As notícias vindas do Oeste não são animadoras. Principais financiadores da defesa ucraniana, os Estados Unidos parecem cansados do conflito e mergulhados em problemas internos mais urgentes – praticamente a um ano das eleições presidenciais. No acordo entre democratas e republicanos que evitou o colapso dos serviços públicos norte-americanos, o novo pacote de apoio financeiro de Kiev ficou de fora. Para piorar, o comando do Pentágono informou que os dispêndios com a guerra na Ucrânia esvaziaram os cofres das Forças Armadas norte-americanas e tornaram-se um risco à segurança do próprio país. Diante das más notícias, o presidente Joe Biden veio a público reafirmar o compromisso de Washington com os ucranianos. Sem o dinheiro dos EUA, afirma Zelensky, ­logo faltarão munições. O ­momento é crucial: Moscou anuncia uma nova ofensiva ­para o outono europeu. A Ucrânia ainda não resolveu o mal-estar com a Polônia, depois de acusar o aliado de concorrência desleal no comércio de ­cereais. E a Eslováquia, ­outra aliada, acaba de eleger o ­pró-russo Robert Fico.

Publicado na edição n° 1265 de CartaCapital, em 11 de outubro de 2023.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’

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