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Um jeito diferente de fazer jihad

O momento em que vivemos é o momento de preservar as nossas vidas, as vidas de quem amamos e dos outros que não têm a ver conosco também

Um jeito diferente de fazer jihad
Um jeito diferente de fazer jihad
FOTO: AHMAD AL-RUBAYE / AFP FOTO: AHMAD AL-RUBAYE / AFP
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A pandemia de coronavírus ainda é, e por um bom tempo será, a pauta principal do mundo. Enquanto este novo vírus vai sendo contaminado principalmente nas américas, no país epicentro dele, na China, há o risco da segunda onda e novos contágios. Infelizmente, já temos, segundo os “números oficiais”, mais de 1 milhão de brasileiros contaminados, além daqueles que não foram registrados. Já o número de mortes passou de 50 mil no Brasil. Enquanto isso, há em certos lugares a flexibilização do isolamento e abertura gradual e condicional do comércio. É claro que não se pode negar o fato de que a manutenção da economia é importante para a manutenção da vida humana financeiramente. Por tal razão, acredito que seja normal esta reabertura gradual e condicional do comércio. Porém, isto não é o significado de sermos livres para sair às ruas deliberadamente e lotar os mercados e os locais de comércio.

Em um hadice mencionado por Baihaqî, o profeta Muhammad afirma, enquanto ele e o seu exército retornavam de uma batalha: “Estamos voltando do jihad menor para o jihad maior.” Perguntaram-lhe: “O que é o jihad menor e qual é o maior?” Respondeu: “O jihad menor era essa guerra de qual acabamos sair e o jihad maior é a luta que teremos contra nossos desejos e nossa tendência à maldade.”

Reflexões em torno do conceito de jihad são demasiadas e são fáceis de acesso na internet. Enquanto algumas destas reflexões visem apenas a um aspecto do jihad que é tido como “a guerra”, outros tentam explanar este termo de maneira mais vasta. Aqui faremos uma pequena análise do conceito em questão.

A palavra jihad deriva da raiz jahada em árabe que significa “esforço”. Terminologicamente, no âmbito teológico, o jihad é definido como esforço empenhado para tirar os obstáculos entre Deus e o seu servo. Este esforço inclui tanto a luta interna do ser humano para seguir o caminho de Deus, pois é algo que exige muita perseverança, ou seja, para retirar o maior obstáculo do meio que é o próprio ser, tange ao lado metafísico; como também para retirar os obstáculos físicos que podem ser outras pessoas ou fatores externos que podem impedir o servo de adorar ou de manter sua ligação contínua por Deus. Por isso existe a definição do jihad maior que é o esforço interno e o jihad menor que é o desempenho contra os fatores externos. Quanto a este segundo aspecto do jihad, inclui-se também a ideia da preservação da vida. Pois, como mencionamos em um dos artigos recentes, a preservação da vida humana sobressai a qualquer coisa para o islam. Como as religiões se baseiam na existência da vida humanas, aliás, para o isla, o universo existe porque Deus criou o ser humano, a vida humana é sacra e intocável. Por isso, a defesa dela também é uma forma de praticar o jihad.

Embora o jihad seja um conceito islâmico, neste último aspecto supracitado ele ultrapassa os limites da religião. Preservar a vida humana não é algo da religião, mas sim, da própria humanidade.

Já ouço as perguntas de “o que isso tem a ver com o primeiro parágrafo e com o momento atual?”. A resposta é simples: o ser humano é criado para ser livre. No momento, a crise pandêmica nos priva desta liberdade parcialmente. E por esta tendência à liberdade é que nós buscamos sair às ruas assim que for possível. Somos uma espécie sociável e isso consiste na nossa natureza. Seja qual for a nossa religiosidade ou irreligiosidade, esta realidade não muda. Porém, o momento em que vivemos é o momento de preservar as nossas vidas, as vidas de quem amamos e dos outros que não têm a ver conosco também. Enfrentar por um tempo o nosso desejo de sair às ruas é uma forma de jihad mesmo sem ser muçulmano ou sem ter alguma religião.

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