Quadrinsta

Jandira Feghali: “Brasil não se dirige com núcleo pequeno de esquerda”

Deputada exalta necessidade de unidade da esquerda no país, critica “toma lá, dá cá” de Temer e corneta o baterista Eduardo Cunha na Quadrinstrevista

Jandira Feghali toca bateria, assim como o ex-deputado e agora presidiário Eduardo Cunha
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Às vésperas da votação da primeira denúncia contra o Presidente Michel Temer na Câmara, Brasília registra mais negociações que a Zona Franca de Manaus. Para entender os bastidores deste balcão de negócios e o momento político do país, a Quadrinstrevista deste mês traz a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ). 

Com 30 anos dedicados à vida pública, a deputada pontua sua trajetória no parlamento pela defesa dos direitos humanos e ocupação da mulher nos espaços sociais: “As mulheres que chegam aos poderes institucionais não podem se comportar reproduzindo as relações de dominação e precisam se relacionar com as mulheres, digamos assim, não empoderadas”. 

Crítica contumaz do impeachment de Dilma Rousseff, a parlamentar aborda na entrevista temas como a crise no Rio de Janeiro, reformas, instabilidade política, denúncia contra Temer e lamenta a falta de unidade dos partidos de esquerda. 

“Temos de parar com esse discurso puro de que uma força sozinha governa um País desse tamanho, isso não vai existir, mas podemos ter alianças mais programáticas e governar com a sociedade”, ressalta Jandira. 

A atuação política, aliás, não é a única vocação da parlamentar. Jandira é graduada em medicina e tem relação umbilical com a música, toca bateria – recentemente deu “canja” em show de João Donato – e é irmã de Ricardo Feghali, integrante do grupo Roupa Nova. Para trilha sonora do golpe, a parlamentar citou dois ícones do rock nacional: “Acho que vou de Legião Urbana, ‘Que país é esse?’, ou então ‘Burguesia’, do Cazuza”. 

Quadrinsta – A internação do governador Pezão em um spa de luxo mostra que hospital público no Rio de Janeiro não é para quem quer, é para quem não pode? 

Jandira Feghali – Sou médica e não sei em que fase está a doença e as necessidades que o governador tem. Certamente deve precisar de repouso de algum tipo de tratamento, então não quero olhar pela ótica desumana do processo. O problema é a forma com que foi estabelecido, enquanto os servidores estaduais estão sem salário. A divulgação foi feita indicando que ele iria para um spa de luxo, pago parece que por uma empresa do setor privado que tem relação com fornecimento para o estado, isso que acho acintoso, violento e grave. Não tenho como opinar sobre a necessidade de repouso, de cuidados com a saúde, mas essa não é postura de alguém que deveria se comportar como homem público. Agride o sentimento das pessoas que estão sem como fazer supermercado e vivendo de cesta básica. 

Q – Em 2017, a senhora completa 30 anos de atividade pública institucional. Não acha melhor se aposentar antes que a reforma da Previdência seja aprovada? 

JF – Adoraria sair da atividade pública institucional, é meu sonho de consumo, tenho até feito esse esforço. Há dois mandatos tento não ser candidata, não por achar que não contribua, até acredito que dou uma contribuição importante como mulher na política, que são muito poucas, também pela necessidade conjuntural, partidária, mas aposto sempre na renovação, em colocar novas lideranças nesses espaços. Desejo continuar contribuindo, não necessariamente no parlamento. Tentei concorrer à prefeitura e não tive êxito na eleição majoritária. De qualquer maneira, meu esforço tem sido de buscar novas lideranças para ocupar o espaço parlamentar. 

Chega um momento em que você mesmo se sente esgotado, cansado desta atividade. Acho que já dei uma contribuição grande, mas preciso auxiliar para que outra pessoa ocupe esse espaço com viabilidade eleitoral, para que não falte essa contribuição do PCdoB a partir do Rio de Janeiro no parlamento brasileiro. Nosso estado precisa muito de boa representação, que tenha vínculo com a luta social, que compreenda o estado, que compreenda estrategicamente a política nacional. Não pode ficar um rombo de representatividade porque já temos muitos “vereadores federais” que não pensam o Brasil.  Jandira Feghali 1

A angústia dessa reforma política é que se fazemos uma reforma democratizante, seria muito bom, mas esse não é o raciocínio. O raciocínio tem sido por uma reforma política de restrição. Isso é preocupante para a esquerda inteira, principalmente para os partidos de tamanho menor, e isso vale para o PCdoB, PSOL, Rede, PV, PPS, porque as exigências acabam excluindo esses partidos da luta política brasileira, principalmente da luta institucional. 

Q – Reforma trabalhista sancionada. Precarização das relações de trabalho, o acordado sobre o legislado, trabalho intermitente. Quando vão construir as senzalas? 

JF – Na minha opinião, já construíram. Temos um congresso patronal, predominantemente empresarial. As senzalas hoje não são no modelo dos séculos XVIII, XIX, mas são reais, são senzalas com aspectos modernos, mas com regimes de trabalho que chegarão a isso. A vida das pessoas vai se transformar na senzala. Quando você usa essa imagem de casa grande e senzala estabelece um símbolo de polarização de classes. Há um antagonismo de classes entre capital e trabalho, não adianta mentir, ele existe.

Existe um antagonismo de classes que a lei do trabalho regula, media, porque o capital é muito mais forte nas relações não mediadas pelo estado. Quando você retira uma regulação mínima, o capital engole, a não ser que esse mundo do trabalho se organize e enfrente. É essa organização que precisamos ter para voltarmos a estabelecer uma regulação e para que, em algum momento da história da humanidade, esse trabalho possa de fato comandar o processo. Neste momento, a senzala está estabelecida depois da reforma trabalhista. 

Q – Numa avaliação do governo Temer, com quantos cargos se faz uma reforma? 

JF – Com milhares de cargos e milhões de dólares, cada vez de forma mais escancarada, mais abjeta, uma coisa revoltante para a sociedade brasileira. É como diz aquele deputado do Pará, o Wladimir Costa [SD]: “ué, se tenho que ajudar, vou correr atrás, preciso do hospital”. E ele fala isso como se fosse algo natural. O que quero dizer com isso? Simbolicamente, a política virou um “toma lá, dá cá” institucionalizado. Para o cidadão que ganha salário mínimo, que está desempregado, ele ouve falar em R$ 500 mil em malas por mês durante 30 anos e não consegue imaginar aquele volume de dinheiro. Isso é dramático porque as pessoas vão se achar cada vez mais distantes da política, esse é o prejuízo maior.

A líder do PSB na Câmara, Tereza Cristina (MS) vai à Receita Federal porque o Temer pediu para resolver um problema, aí o outro resolve não sei quantos cargos, isso é diferente de dizer que há uma coalizão que apoia e governa junto. Se os partidos ganham uma eleição, eles governam juntos, existe uma repartição política de ministérios, de uma aliança em tese programática que vai tocar o país. Isso que está aparecendo hoje é nojento e a sociedade está cada vez mais longe, com maior repulsa política, É um drama e vamos demorar muito tempo para reconquistar a confiança, a credibilidade do povo na política. 

Q – Qual é a chance de sair da Câmara a aceitação da denúncia contra o Temer ao invés de uma pizza? 

JF – A chance hoje, neste momento, é de sair uma pizza. Até 2 de agosto, dia do início da votação da denúncia na Câmara, não sei o que pode acontecer porque a conjuntura está mudando a cada meia hora. Mas digo uma pizza com olhar contextualizado. Hoje os dois lados estão com problema, situação e oposição. A situação não tem quórum para abrir a sessão, então a oposição pode avaliar o momento de dar esse quórum e, em abrindo a sessão, nós não temos os 342 votos para aprovar a denúncia. Isso é hoje, com esse toma lá, dá cá, com esses milhões de reais envolvidos, mas há uma movimentação política acontecendo. Delações de Lúcio Funaro, de Eduardo Cunha, agora Marcos Valério e tantos outros, e, ao mesmo tempo, uma movimentação do DEM e de quem tem interesse direto nessa conjuntura que é o Rodrigo Maia. 

Pode ser que até lá, o cenário seja outro. Ou então eles “esquentam” esse bastidor, todo mundo pega o resultado do que foi a compra e venda do seu voto, e, numa segunda denúncia, derruba o Temer. Dentro dessa conjuntura política, pode ser que avaliemos valer a pena dar quórum na sessão do dia 2 para aprovarmos a denúncia e o Rodrigo Maia assumiria automaticamente, independente de eleição indireta, porque ele é o sucessor natural. O ideal para nós é a antecipação das eleições com novo critério, porque se o Supremo levar seis meses para o julgamento definitivo da denúncia contra o Temer, estaremos em 2018.  Jandira Feghali 2

Q – Ano passado tivemos um show de horrores na sessão que deu admissibilidade ao processo de impeachment da presidenta Dilma na Câmara. O que a senhora dirá no seu discurso durante o voto da denúncia contra Temer? Vai agradecer ao Rodrigo Janot? 

JF – Ainda não sei o que falarei na hora, só sei que certamente não será algo pitoresco, será algo muito sério, vou usar os 15 segundos obviamente a favor da denúncia. Agora como vou falar, dependerá da emoção do momento. 

Q – Uma série de parlamentares, especialmente do PSB, tem negociado durante o recesso a troca de partido e o DEM é o destino mais cobiçado, mas o presidente Temer também tem se envolvido no processo. Essa dieta de engorda do DEM é feita à base de quê? 

JF – É feita à base de poder. Se na linha de sucessão Rodrigo Maia é o que chega ao Planalto, é a sedução daquela cadeira e o que está em torno dela. A direção nacional do PSB decidiu passar para a oposição e muitos parlamentares resistem a essa hipótese. Há alguns que dizem “hay gobierno, soy a favor”. O Temer se mete nessa movimentação porque não confia no Rodrigo Maia. É óbvio que ali há uma disputa real, não há confiança. Então quando o DEM seduz, o Temer já está imaginando que vão votar contra ele, mas aí negam, fazem um jantarzinho achando que todo mundo é idiota. Você tem um jogo que é sinistro de um lado, mas eles subestimam a inteligência de quem está dentro dessa superestrutura no Legislativo, Judiciário, Ministério Público.

Não existe lealdade de ninguém com ninguém, há uma imensa disputa, mas Rodrigo Maia não pode parecer que articula por baixo dos panos. Acho até que é uma articulação mal feita. A líder do PSB declara as duas articulações e tanto Temer, como Maia negam. Me parece que há uma ineficácia nesse jogo e que a elite não se unificou. Na hora em que se unificar em torno do nome do Rodrigo Maia, a queda do Temer será imediata. O problema é que o Maia não é um nome que unifica, ele foi delatado e há outras questões em jogo.

Eles não estão divididos em agenda, mas sim em quem comanda. Se houvesse unidade em torno de um terceiro nome, Temer teria renunciado porque o Rodrigo Maia assumiria só para convocar eleições indiretas, e esse terceiro nome seria viabilizado. Não haveria um processo de denúncia para o Maia assumir com o julgamento no Supremo. Mas há unidade na agenda, reforma trabalhista, previdenciária, agora a ANP [Agencia Nacional do Petróleo] acabou de reduzir as exigências para conteúdo nacional no próximo leilão. A indústria nacional vai acabar, para o Rio de Janeiro isso é a morte de toda cadeia produtiva de óleo e gás, todo setor de indústria naval.

Essa agenda de desnacionalização crescente da economia, de interrupção de várias cadeias produtivas nacionais, a questão da previdência privada, da reforma trabalhista favorecendo setores empresariais é uma agenda que eles precisavam viabilizar e o fizeram com o impeachment. Nossa agenda internacional é horrível, somos um vexame. É um governo atrasado politicamente, no vocabulário, o Temer fala umas bobagens no exterior, as políticas de direitos civis são completamente atravessadas. Do ponto de vista do projeto nacional, dos direitos sociais, estamos voltando ao final do século XIX. A elite brasileira é míope, para não dizer cega. Quem comanda o golpe depende de quem puder persistir mais tempo na presidência. 

Q – Além de deputada, a senhora tem proximidade com a música. É irmã do Ricardo Feghali, integrante do grupo Roupa Nova, e toca bateria, assim como o ex-deputado Eduardo Cunha. Por que Cunha abandonou a bateria para se dedicar às quadrilhas? 

JF – Ele toca muito mal, aliás. Não é baterista, só tem um pouquinho de coordenação motora, a única vez que vi, achei um horror. Também não vou falar em quadrilha porque é algo tão bonito, pelo menos nas festas juninas, e a dele é quadrilha do crime organizado. Não conheço muito a história do Eduardo Cunha, apesar de ser do Rio. A impressão que tenho é que o objetivo dele ao se envolver na política foi ganhar dinheiro, ele não fez política por compreender ser um instrumento de luta, ele se meteu dentro de uma visão de poder para enriquecimento. A primeira vez que ouvi falar do Cunha foi quando eleita deputada federal e ele se tornou presidente da Telerj no governo Collor, e já começou a ter escândalo naquela época. Acho que ele já foi para a política dentro de um esquema delituoso. 

Q – A participação feminina no cenário político é irrisória em relação à proporção e à importância das mulheres na sociedade. Como exemplo, a Câmara conta é composta atualmente por 45 deputadas e 468 homens, menos de 10% da totalidade de parlamentares. O que deve ser feito para termos mais mulheres na política? 

JF – Se olharmos do ponto de vista da legalidade, dos instrumentos institucionais, o instrumento mais forte para mudarmos esse quadro é aprovação da PEC que está na Câmara e fala da reserva de 30% de cadeiras para as mulheres. Seria uma reserva de cadeiras porque a cota de chapa não resolveu. As chapas são cartoriais, as mulheres se candidatam, mas de fato não têm campanha, os dirigentes de partidos colocam o nome das secretárias só para dizer que há uma chapa, mas as candidaturas não são verdadeiras.

A reserva de cadeiras sim, é algo que existe em vários países do mundo, é uma cota de espaço nos parlamentos. Mas não basta isso, é necessário dar uma distribuição regional, pelo menos uma vaga por estado, para não se eleger todo mundo de São Paulo, do Rio de Janeiro ou de estados grandes, para que haja uma diversidade cultural, realidades diferentes. Do ponto de vista cultural e econômico, temos de enfrentar uma luta anti-opressão.  Jandira Feghali 3

A questão de gênero não é um direito social, não é uma luta corporativa, é uma luta estrutural anti-opressão que piorou com a estruturação capitalista. Há uma relação de dominação, então ela tem de ser encarada como uma luta de mudança de relações de poder. É uma luta mais profunda que precisa ser construída dentro dos partidos e da sociedade. As mulheres que chegam aos poderes institucionais precisam ter um comportamento que expresse permanentemente isso, elas não podem se comportar reproduzindo as relações de dominação e precisam se relacionar com as mulheres, digamos assim, não empoderadas. Elas têm de usar esse espaço para gerar consciência do lado de fora e trazer a sociedade para essa visão de luta, de mudanças de relação. O feminismo na verdade é isso, não é uma luta contra os homens, é instrumentalizar a sociedade para mudar essa relação de poder. A criação de instrumentos que gerem políticas afirmativas para que as mulheres ocupem esse espaço é fundamental. 

Q – Só o feminismo tira o Bolsonaro das pessoas? 

JF – Há o feminismo, mas, mais do que isso, existe a luta até por uma educação melhor, porque além de tudo ele é grosseiro. As pessoas democráticas não suportam Bolsonaro porque é fascista, autoritário, não ouve a divergência. Ele é etnocêntrico, hitleriano, não aceita os diferentes. Em um dos debates para a prefeitura no ano passado, quando o filho dele [Flávio Bolsonaro] passou mal, não deixou nem eu chegar perto, disse que comunista não pega no filho dele. O Bolsonaro não gosta nem do filho, eu era a única médica ali, se o Flávio estivesse morrendo, não me deixaria atender. 

Além disso, odeia mulher. Não sei qual é o problema dele, mas não gosta de mulher. Não estou falando da sexualidade do Bolsonaro, estou dizendo que não gosta de mulher, que tem um problema de rejeição e acho que o feminismo pode dar uma grande contribuição para a sociedade rejeitá-lo, mas o Brasil não elege Bolsonaro na eleição majoritária. A sociedade não é majoritariamente fascista, antidemocrática e contra os diferentes. 

Q – O que fazer para encerrar a fila da tornozeleira eletrônica em Brasília? 

JF – A luta anticorrupção é nossa, a esquerda tem de assumir permanentemente essa agenda. A luta pode diminuir muito se tivermos marcos regulatórios de gestão pública mais transparentes, rígidos e mais controle externo de gestão. Não só no Executivo, tem juiz vendendo sentença. Quem faz controle externo do Judiciário? Onde se pune juiz? O Conselho Nacional de Justiça não pune ninguém, é um órgão de controle interno de juiz para juiz onde não se vê punição, é quase tudo arquivado. É preciso ter um controle externo da sociedade sobre o poder hermético não eleito, que é o Judiciário, e sobre o seu eleito, que é o deputado. Talvez o recall, aquela forma de interromper mandatos quando há comprovação, e não por ilação e delação sem provas. 

E, sinceramente, precisamos ter mais politização da sociedade. Acho que um dos problemas que tivemos nos nossos governos de esquerda é que o nível de desigualdade e o desafio eram tão grandes que muita coisa avançou, mas a organização, a politização, a educação política da sociedade ficou a desejar. Mas nisso há um aspecto que foi o problema estrutural mais grave que não enfrentamos que é a democratização da comunicação. Não há como informar as pessoas se existe um monopólio da informação. Não é impedir que os meios de comunicação funcionem, mas é necessário multiplicar os outros meios com financiamento, com qualidade, com possibilidade de funcionamento. 

Essa oligopolização de um mesmo meio, de rádio, jornal, televisão, não existe em nenhum lugar do mundo. É necessária regulação econômica, financiar outros instrumentos. A radiodifusão comunitária é de baixa qualidade não porque os profissionais são fracos, mas porque os instrumentos são ruins, as pessoas não têm salário. Quebrar a oligopolização da comunicação e possibilitar que todas as parcialidades possam acontecer é uma maneira de informar, e informação não é necessariamente conhecimento. Você tem de gerar conteúdo, pluralidade, dentro e fora da escola. Acho que essa foi uma deficiência estrutural dos governos que iniciaram de esquerda-centro, depois viraram de centro-esquerda, depois a esquerda perdeu o comando. 

Já tínhamos uma democracia de baixa intensidade e o déficit democrático aumentou. Por isso é necessária essa politização, essa geração de consciência, de educação política, sem isso não há como reduzir a corrupção, ter governos que programaticamente se identifiquem mais. Sempre precisaremos ter forças amplas, coalizões, é mentira que você governa com um núcleo pequeno de esquerda um país desse tamanho. Temos de parar com esse discurso puro de que uma força sozinha governa um país desse tamanho, isso não vai existir, mas podemos ter alianças mais programáticas e governar com a sociedade, com instrumentos diretos de participação, mais democracia da informação.  Jandira Feghali 4

Q – O juiz Sérgio Moro acaba de condenar o presidente Lula a 9 anos e meio de prisão. Será que só uma filiação ao PSDB pode livrá-lo da cadeia? 

JF – É claro que dentro do plano do chamado golpe, eles não imaginavam dois anos depois o Lula voltar para o governo. Esse golpe se consolida tirando o Lula do jogo, mas uma eleição sem ele é fraudulenta. Tirar uma liderança como o Lula do jogo sem provas é terrível para a democracia, o mundo inteiro está enxergando isso. A imprensa do mundo inteiro está sendo mais honesta que a nossa. Deixa ele disputar, se vai se eleger ou não é outro problema, mas tirar o Lula da eleição é fraude.

Acho que a rua precisa se manifestar. Tivemos manifestações em algumas capitais, mas esse jogo tem de crescer, e não é quem goste ou não do Lula, é a preservação democrática. Não é para a candidatura dele, é simplesmente estabelecer um conceito, não podemos condenar sem provas, a perseguição é nítida. Isso vale hoje para o Lula e pode valer amanhã para qualquer um, é um jogo democrático que estamos disputando. A luta nas ruas tem de crescer para que a eleição seja democrática. 

O Sérgio Moro será desmoralizado no meio jurídico, aliás, já está sendo. Será lançado um livro em 11 de agosto, no dia do advogado, de quase 700 páginas, com 100 juristas, e o mundo jurídico vai isolar o Moro. Espero que o Tribunal Regional Federal tenha essa sensibilidade de absolver o Lula. Na verdade, se analisarmos tecnicamente, o certo era a anulação do impeachment, mas está nas mãos do Supremo. Mas o que será de 2018, ninguém sabe.

Q – A última pergunta é do nosso seguidor nas redes sociais Rafael Weiblen, de Porto Alegre-RS. Além do voto, que mecanismos de controle popular sobre os políticos deveriam existir? 

JF – Alguns mecanismos, como plebiscito, referendo, deviam ser usados com mais frequência. O recall, que existe em outros países e estamos tentando discutir aqui no Brasil, é outro, essa possibilidade de interrupção do mandato conforme análise dos eleitores. Acho que deveríamos usar mais os mecanismos virtuais e digitais de controle, de transparência. Aliás, a Câmara dispõe de vários mecanismos interessantes que são poucos divulgados para o povo.

As comissões funcionam, existe lá um e-democracia, mas poucos deputados respondem, o meu gabinete até funciona bem. Precisávamos usar mais mecanismos de interatividade. Há a comissão de participação legislativa que pouca gente usa, os projetos de iniciativa popular. Já existe matéria na Câmara que reduz o número de assinaturas para tramitação de projetos de lei. Deveríamos reduzir as exigências para que as iniciativas populares pudessem valer. As conferências, os conselhos, tudo isso parou de ser utilizado.

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