Projeto Brasil

Por que dizemos não à reforma administrativa?

Para André Figueiredo, ‘na crise gerada pela Covid-19, o neoliberalismo se vê inteiramente nu’

O ministro da Economia, Paulo Guedes, criticou funcionalismo público ao defender reforma administrativa. Foto: Alan Santos/PR
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Por André Figueiredo, deputado federal (PDT-CE) e líder da Oposição na Câmara

O debate em torno de uma Reforma Administrativa entra novamente na agenda política nacional e levanta questionamentos sobre a eficácia da máquina pública.

Será que a proposta acaba com privilégios? O Brasil tem um número exagerado de servidores públicos? A solução é desmontar e enfraquecer o serviço público brasileiro? Não existem pautas que precedem esse debate como a urgência de uma reforma do nosso sistema tributário, para simplificá-lo, modernizá-lo e, sobretudo, torná-lo mais progressivo e justo?

O governo do presidente Jair Bolsonaro diz que a reforma vem apenas para acabar com privilégios e diminuir o excessivo número de servidores públicos. Não é verdade. Infelizmente, isso é mais uma tentativa de manipular a opinião pública.

A maior parte dos mais de 12,4 milhões de servidores públicos brasileiros ganham menos de 3 salários mínimos. Aqui estamos falando de profissionais da saúde, professores(as) e profissionais de limpeza, cujos rendimentos precisam ser melhorados e não o contrário.

A outra mentira que temos que desmistificar é a de que temos um número alto de servidores públicos.

Em pesquisa* feita em 32 países, a OCDE apontou que a média de servidores públicos é de 18% sobre o total de trabalhadores dos respectivos países.

Nos EUA, o mais liberal entre os países desenvolvidos, os servidores públicos são 15% dos trabalhadores. No Reino Unido, 16%. Em Israel, nação tão louvada por Bolsonaro, são 20%. Nos países da Escandinávia, onde o capitalismo encontrou o seu equilíbrio mais perfeito (em termos de qualidade de vida, liberdade política e proteção social), a participação dos servidores no total de empregos está em torno de 30%.

No Brasil, os servidores são apenas 12% da massa de trabalhadores. Ou seja, é mentira que o Estado brasileiro é inchado.

O desmonte do serviço público está alinhado aos valores ultraliberais de Paulo Guedes, uma pessoa que não cansa de demonstrar sua total subserviência ao sistema financeiro, de onde veio e para onde pretende voltar quando sair do governo.

Este modelo, que enfraquece o serviço público, nunca deu certo em lugar algum no mundo. Os países mais desenvolvidos nunca o adotaram, como se vê no enorme peso que o funcionalismo público ainda tem neles.

No Brasil, o modelo neoliberal, nunca devidamente enfrentado, nem mesmo durante governos dito de esquerda, tem gerado aumento das desigualdades e causado enorme sofrimento às famílias.

Na crise gerada pela Covid-19, o neoliberalismo se vê inteiramente nu, sem disfarces: é um regime político retrógrado, baseado em mentiras, que os países ricos tentam aplicar nos países pobres.

Milhões de nossos irmãos estão perdendo seus empregos e passando por enormes dificuldades financeiras. Nas periferias de nossas cidades ainda se experimenta uma dramática ausência dos serviços públicos essenciais, como limpeza, segurança, saúde e educação. O foco do governo, nesse momento, deveria ser ampliar o alcance dos serviços públicos, e não diminuí-los!

Somos a favor da modernização do serviço público. Topamos analisar soluções que tragam maior equilíbrio salarial entre os servidores. Acreditamos na necessidade de promover um amplo programa de qualificação.
Entretanto, uma reforma administrativa legítima, conectada às necessidades de superamos a condição de um país subdesenvolvido, deveria fortalecer o serviço público, e não fragiliza-lo! O Estado ainda é deficitário em médicos, pesquisadores, professores, cientistas, engenheiros, profissionais de segurança. Precisamos contratar mais, e qualificar melhor os que temos.

No Brasil, o modelo neoliberal, nunca devidamente enfrentado, tem gerado aumento das desigualdades

Nós, trabalhistas, temos um Projeto Nacional de Desenvolvimento, fundamento moral e político de todas as nossas ações. Desenvolvimento, no caso brasileiro, significa modernizar e fortalecer a indústria nacional, qualificar a educação pública, aprimorar o sistema universal de saúde, oferecer uma segurança mais eficaz e mais inteligente aos cidadãos, revolucionar a mobilidade urbana em nossas cidades.

É evidente que esses objetivos apenas serão alcançados com a existência de um servidor público altamente qualificado, confiante, independente, remunerado de maneira digna!

Se o governo quer economizar dinheiro, seja para contentar os sanguessugas do rentismo, seja para promover algum tipo de demagogia barata, que cobre mais impostos do sistema financeiro, para onde ainda escorre boa parte da renda nacional, ao invés de empurrar uma reforma administrativa de mentirinha, que não tocará nos setores realmente privilegiados, que punirá os servidores mais humildes, e que apenas provocará ainda mais desigualdade, instabilidade e violência.

Uma reforma que desqualifique o servidor, que o humilhe, que reduza sua independência, que o sobrecarregue, que mine sua confiança em seus próprios méritos, não nos interessa e iremos combatê-la com todas as nossas forças!

* Link da OCDE: https://bityli.com/SYe7r

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