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Os cristãos que tentam difamar a Teologia da Libertação e sua missão de paz

Não bastasse, classificam os adeptos ou simpatizantes desta Teologia como ‘comunistas’ e ‘excomungados’

Teologia da Libertação (Reprodução)
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É o mesmo Deus que, na plenitude dos tempos envia seu Filho para que feito carne, venha libertar todos os homens, de todas as escravidões a que o pecado os sujeita: a fome, a miséria, a opressão e a ignorância, numa palavra, a injustiça que tem sua origem no egoísmo humano (Jo 8,32-34). Por isso, para nossa verdadeira libertação, todos os homens necessitam de profunda conversão para que chegue a nós o “Reino de justiça, de amor e de paz”. CELAM, MEDELLÍN – 1968; 1 Justiça; II Fundamentação Doutrinal – 3

Chama-nos a atenção este pequeno texto escrito pelos Bispos Latino-Americanos na Segunda Conferência Geral do Episcopado Latino-americano no ano de 1968, ao nos depararmos com acontecimentos recentes amplamente divulgados pelos meios de comunicação retratando o uso da violência, da mentira e da opressão como meios indispensáveis para garantir a liberdade do povo e a governabilidade do País.

Ainda mais triste se torna tal realidade quando observamos que os responsáveis pela propagação e a prática dessas ideias estão infiltrados nos mais diversos segmentos da sociedade – dentre os quais o religioso -, com o intuito de convencerem a um número cada vez maior de pessoas a se tornarem adeptas e defensoras convictas de seus ensinamentos, como se estes fossem a expressão máxima da verdade.

Inseridos nas mais diferentes confissões religiosas, desenvolvem um trabalho meticuloso contra todos os movimentos de caráter humanitário e progressista, que se coloque ao lado dos mais pobres, das minorias e daqueles que hoje se vêm peregrinando pelas periferias da vida em busca de emprego, moradia, saúde e educação públicas, entre outros.

No meio cristão católico – mas não obrigatoriamente -, trabalham com afinco na difamação da Teologia da Libertação objetivando extirpar – como se isso fosse possível -, tudo que ela representou e representa para a Igreja Católica – sobremaneira na América Latina -, chegando a decretar sua morte. Não bastasse, classificam os adeptos ou simpatizantes desta Teologia como “comunistas” e “excomungados”.

Não sabem – ou se sabem omitem -, estes “doutos” perseguidores da TL, que ela surgiu em tempos marcados pela expansão de uma ampla consciência libertadora gerada pela descoberta verdadeira do outro e de seu mundo, mormente dos mais pobres e excluídos.

Neste contexto, uma teoria professada por alguns cientistas sociais latino-americanos, a “Teoria da Dependência”, contribuiu para que surgisse um novo estágio de consciência capaz de enxergar a condição de subdesenvolvimento imposta aos países latino-americanos como um – nas palavras de Gustavo Gutierrez no livro Teologia da libertação (Editora Vozes, 1975) -, “subproduto histórico do desenvolvimento de outros países”. Com esse aporte, os Teólogos da Libertação apreenderam com clareza que o desnível existente entre os países desenvolvidos e subdesenvolvidos radicaliza-se nas relações de dependência, e que somente uma “análise de classes” seria capaz de assimilar a dinâmica de oposição entre dominantes e dominados.

Para os Teólogos latino-americanos, havia um instrumento indispensável para a descontinuidade das condições sociais opressoras e marginalizantes dos pobres do continente: a libertação. Com base nesta certeza, apostaram firmemente no movimento de libertação como processo capaz de transformar profundamente a realidade.

A Teologia da Libertação também encontrou clima favorável para o seu nascimento em meio ao universo eclesiástico. Ela brota no solo fértil do Concilio Vaticano II e sua abertura para diferentes iniciativas eclesiais inovadoras. Em terras latino-americanas, o impacto do Vaticano II foi admirável. Não apenas por seu questionamento à clássica e soberana letargia eclesial reinante, mas, nomeadamente, pelas transformações proporcionadas à Igreja, que lhes trouxeram novas energias e um espírito arrojado e de iniciativa pastoral.

 

No âmbito social, as Encíclicas de São João XXIII “Mater et Magistra”, de 1961, e a “Pacem in Terris”, de 1963, foram de fundamental importância para a Teologia da Libertação. Na América Latina, a II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano realizado na cidade de Medellín na Colômbia em 1968, resgatando o espírito conciliar e enriquecendo-o com a perspectiva do pobre, foi elemento decisivo de amparo eclesial para a Teologia da Libertação. Do mesmo modo, o documento produzido pelos bispos durante o Sínodo de 1971, no que se refere à justiça no mundo contemporâneo, que afirma: “… a Igreja, no dificílimo momento histórico que atravessamos, adverte claramente o dever de envidar um novo esforço para instaurar uma justiça mais perfeita entre os homens…”, traz o discurso do Papa Paulo VI no encerramento da II Assembleia Ordinária do Sínodo dos Bispos em novembro de 1971.

Muito ainda pode ser demonstrado sobre a Teologia da Libertação e sua bela história – o que poderemos fazer em um futuro próximo. Porém, o que mais nos importa hoje é sinalizar para aqueles que se deixam levar por caluniadores, que busquem conhece-la em sua essência e compreendam o quanto ela é atual e necessária em meio a tantas injustiças incentivadas e praticadas por quem deveria combatê-las; a negociações e medidas espúrias levadas a cabo por um governo que só faz aumentar o número de oprimidos e marginalizados; a um regime de mercado que trabalha ininterruptamente com o objetivo de convencer a todos de que “o mais importante é o ter, o possuir” e não o “Ser, a Pessoa“; a um crescimento de religiões e seitas fundamentalistas capazes de semear a discórdia, o ódio e a violência entre os homens, ainda que para isso seja preciso servir-se da mentira; a Teologia da Libertação é, por certo, um magnífico instrumento capaz de educar as consciências à ação para a justiça social.

Por fim, podemos dizer sem nenhuma sombra de dúvida que a Teologia da Libertação propaga a paz e o amor entre os homens, recordando a cada um e a todos que a verdadeira paz só existirá quando formos capazes de enxergar o outro como o “próximo que devo amar como a mim mesmo”. (Cf. Mc 12, 31)

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