O Mundo É uma Bola

A visão de Luiz Gonzaga Belluzzo sobre esporte e sociedade

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Histórias de São Paulo x Palmeiras

Não é de hoje que se sucedem os desentendimentos e bate-bocas entre são-paulinos e palmeirenses

Palmeirenses da velha guarda perdoam, mas não esquecem as dores que os maltrataram. Registro do Mundial Interclubes de 1951
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O jogo São Paulo x Palmeiras pelo Campeonato Paulista terminou em um empate. Foi 1×1 o resultado, contestado pelos tricolores, insatisfeitos com a arbitragem. O acesso aos vestiários do Morum(BIS?) foi atormentado por protestos violentos e virulentos contra a arbitragem, Os são paulinos questionavam a não-expulsão de Richard Rios,  a marcação de um pênalti para o Palmeiras e a não-marcação de uma penalidade máxima (assim falavam os da antiga) para o São Paulo.

Não é de hoje que se sucedem os desentendimentos e bate-bocas entre são-paulinos e palmeirenses. Os desencontros e desentendimento acontecem ano sim, outro também.

Vamos à história:

Transferido para São Paulo naqueles anos, o capitão Adalberto Mendes apaixonou-se pelo clube dos italianinhos. Os Carcamanos eram massacrados pelos “patriotas” de então, empenhados em desqualificar os “quintas-colunas”. 

Em um depoimento à mídia palmeirense, o capitão Adalberto Mendes descreveu as ameaças que pairavam sobre o Palestra às vésperas da decisão contra o São Paulo FC. “A pressão aumentava de forma espantosa. Jornais estampavam manchetes colocando o Palestra Itália como ‘camisas pretas’“, uma alusão às nações inimigas do País. Foi quando o presidente Ítalo Adami decidiu, durante uma reunião que se estendeu até as 4 horas da madrugada e contra a minha vontade, alterar o nome do clube para Sociedade Esportiva Palmeiras.

Estávamos as vésperas de um jogo decisivo contra o São Paulo Futebol Clube, a equipe do Dr. Paulo Machado de Carvalho. Boatos diziam que haveria um clima de muita hostilidade por parte da torcida para com nossos jogadores, que realmente estavam preocupados. Percebi isso e notei também, que nosso treinador, Del Debbio, tinha em mãos uma bandeira brasileira.

Eu sabia que a exibição do pavilhão nacional só era permitida em eventos internacionais, mas chamei a responsabilidade para mim e orientei nossos atletas a entrarem, ao meu lado, carregando-o e o exibindo à toda a torcida que superlotava o Estádio do Pacaembu. Após alguns segundos de surpresa por parte de todos, fomos muito aplaudidos e nenhum ato hostil nos foi desferido”. 

O capitão Adalberto Mendes não se acovardou. Na decisão contra o São Paulo F.C, entrou à frente da esquadra ex-palestrina, agora palmeirense. Enfunada, a bandeira brasileira era empunhada por Oberdã, Waldemar Fiume, Claúdio Cristóvam Pinho, Og Moreira, Etchevarrieta, Lima.

Eis o Depoimento do General Adalberto Mendes:

“Em meados de 1942, na condição de capitão do Exército brasileiro, fui designado para servir em São Paulo. Chegando Capital paulista, encontrei-me casualmente na Praça do Correio com Ernani Jota, um ex-jogador do Vasco da Gama, RJ dos tempos em que lá estive como diretor de esportes, que me apresentou a Armando Gargaglione, na época secretário geral do Palestra Itália.

Este dirigente palestrino me convidou para conhecer as instalações do alviverde, e a forma como fui recebido pelo presidente Ítalo Adami, com toda a consideração, o respeito e a reverencia; cativou-me por completo, passando então eu a ser um fervoroso torcedor do clube”.

A PRESSÃO

“Em razão da II Guerra Mundial e de o Brasil ter se colocado contrário ao lado defendido pela Itália, a Radio Record, emissora que pertencia ao Dr. Paulo Machado de Carvalho, deu inicio a uma campanha encabeçada pelo locutor Geraldo Jose de Almeida que afirmava ser o Palestra uma equipe inimiga da Nação. Não existia nenhum ato oficial que nos obrigasse a mudar de nome, mas a campanha era forte. Criou-se a lenda de que no Palestra Itália havia traidores do Brasil, mas o que estes homens tinham, na verdade, era um falso patriotismo, pois seu objetivo se fundamentava na captação do nosso patrimônio.

Certo dia, precisei ia ao Rio de Janeiro para resolver um problema envolvendo o atacante Echevarrietta. Como argentino, ele de repente se viu impedido de jogar pelo alviverde, e para isso tive de ir CBD solucionar a questão. Lá, fui contatado por Sílvio de Magalhães Padilha, diretor do DEFE. Ele me pediu para que, ir na condição de vice-presidente do Palestra, intercedesse no sentido de alterarmos o nome da nossa agremiação, sob pena de termos todo o nosso patrimônio perdido. Fui muito claro a ele e assegurei que, por mim, nada mudaria”.

.O problema e que a pressão aumentava de forma espantosa. Jornais estampavam manchetes colocando o Palestra Itália como “camisas pretas“, uma alusão as nações inimigas do País. Foi quando o presidente Ítalo Adami decidiu, durante uma reunião que se estendeu até as 4 horas da madrugada e contra a minha vontade, alterar o nome do clube para Sociedade Esportiva Palmeiras.

A ENTRADA TRIUNFAL

“Estávamos as vésperas de um jogo decisivo contra o São Paulo Futebol Clube, a equipe do Dr. Paulo Machado de Carvalho. Boatos diziam que haveria um clima de muita hostilidade por parte da torcida para com nossos jogadores, que realmente estavam preocupados. Percebi isso e notei também, que nosso treinador, Del Debbio, tinha em mãos uma bandeira brasileira.

Eu sabia que a exibição do pavilhão nacional só era permitida em eventos internacionais, mas chamei a responsabilidade para mim e orientei nossos atletas a entrarem, ao meu lado, carregando-o e o exibindo à toda a torcida que superlotava o Estádio do Pacaembu. Após alguns segundos de surpresa por parte de todos, fomos muito aplaudidos e nenhum ato hostil nos foi desferido”. 

A “ARRANCADA HERÓICA”

“O jogo seguia tranqüilo e já vencíamos por 3 a 1 quando, no segundo tempo, Virgílio atingiu Og Moreira com os dois pés, e o árbitro Jaime Janeiro marcou pênalti a nosso favor. O jogador do São Paulo, Luizinho, pegou a bola com as mãos e se dirigiu ate o banco de suplentes, onde se encontrava o Dr. Paulo Machado de Carvalho, que me pareceu ter ordenado a saída de campo dos seus atletas. E foi o que eles fizeram. O árbitro esperou alguns minutos e deu por encerrada a partida que, diante da nossa vitória, se transformou no jogo do titulo”.

REPRESÁLIA SIM, ARREPENDIMENTO NÃO

“Apos a nossa “Arrancada Heróica”, fui vítima de muitas mentiras. Diziam que eu seria um “Quinta Coluna”, como também eram chamados os simpatizantes do nazi-fascismo. Por causa destes problemas, fui transferido logo depois pelo Comando Militar para o Rio de Janeiro, em seguida para Recife e somente quando dei baixa, já depois de 1949, pude retornar a São Paulo.

Aqui chegando, retomei minhas atividades no Palmeiras, do qual fui diretor de futebol em 1954 e também em 1963. Apesar destas represálias, jamais me arrependi do que fiz. Fico é gratificado porque contribuí para o bem de um clube oriundo de uma gente que fez muito por esta Cidade. Se hoje o Estado de São Paulo é grande, deve isso a colônia italiana”.

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