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Países da América Latina precisam do povo na rua o tempo todo, destaca filósofo venezuelano

Para Manuel Carballido, Brasil precisa se integrar à América Latina

Manuel Gándara Carballido. Foto: EMERJ
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Não é de hoje que a América Latina luta contra as amarras coloniais e mesmo com a Covid-19, protestos e manifestações pipocaram em vários países espalhados pelo continente do sul global, Caso da Argentina, na marcha de mulheres, do Chile, com a nova Constituinte e da Colômbia, nos protestos contra o aumento de impostos. Grandes manifestações também estiveram presentes no Peru em apoio ao novo presidente e contra o golpe que o queria fora do poder, além do Brasil, em atos contra Bolsonaro e a favor da vacinação em massa.

Atento a esse cenário, em entrevista para a Rede Lado, o filósofo e doutor em Direitos Humanos, Manuel Gándara Carballido, afirma: “Não dá para ter falsa simetria na América Latina, ao mesmo tempo, temos que reconhecer que existem similaridades que nos trazem pistas, mas não mais do que pistas. Mas de fato, o povo ir às ruas na pandemia diz algo”.

Gándara Carballido é venezuelano, morou em outros países da América do Sul e mora há quatro anos no Brasil. Ele é professor da Universidad Pablo de Olavide, na Espanha, e da Universidade Federal do Rio de Janeiro, além de ser membro da organização de defesa direitos humanos espanhola Instituto Herrera Flores.

Olhando para o continente, Carballido identifica que os latino-americanos têm muito em comum, pois regimes totalitários fizeram parte da história de muitos países, mas há algo que, no Brasil, deu-se de forma diferente. Nesse sentido o filósofo destaca um importante processo argentino e chileno: a responsabilização de militares e civis que participaram das Ditaduras Civil-Militares. O Brasil nunca responsabilizou, de fato, os autores do regime.

E mais: além da não responsabilização, há a exaltação de torturadores e ditadores entre figuras do alto escalão do governo. “Os militares sempre estiveram nos governos, sobretudo quando não aparecem,” reitera Carballido. Para apoiar seu argumento, o filósofo conta que fez parte de uma pesquisa sobre o Judiciário durante a Ditadura Militar e participou da Comissão Nacional da Verdade entre 2013 e 2014. Na ocasião, mesmo a CNV tendo a finalidade de reunir a memória do que foi o Regime Militar brasileiro (1964-1985), não tendo o poder de condenar ou atribuir penas aos responsáveis, quando convidado para prestar depoimento a CNV um militar convocado afirmou: “não colaboro com o inimigo”. Carballido reitera que esse cenário é impensável em vizinhos da América do Sul.

O professor e filósofo também traz como exemplo um acontecimento recente entre os representantes dos poderes no Brasil. O “recado” do general Braga Netto ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) sobre não ter eleições em 2022, caso não votassem a favor do voto impresso e auditável, mesmo o voto eletrônico já o sendo. O “recado” não foi bem recebido por políticos e opinião pública. Depois da repercussão, tanto Lira quanto Braga Netto negaram ameaça. Para Carballido, essa e outras ações que ameaçam a Democracia são motivos suficientes para o povo estar na rua.

É preciso manifestações populares constantes no Brasil

No Brasil, os movimentos sociais estiveram nas ruas mesmo durante a pandemia. Em 2020, o ano ficou marcado por grandes protestos após a morte de George Floyd, marchando com Black Lives Matter por várias cidades do mundo, inclusive no Brasil. O movimento negro também protestou contra a morte de João Alberto Silveira Freitas, o Beto, pela rede Carrefour, no Dia da Consciência Negra em 2020. O breque dos apps também vem fazendo paralisações contra a exploração dos trabalhadores. Estes são alguns exemplos recentes das manifestações populares nas ruas, mesmo com a Covid-19.

Outros movimentos também continuaram em meio a pandemia, movimento de mulheres, de trabalhadores, de estudantes e desde maio de 2021 novas articulações populares nacionais também começaram a protestar por vacina, comida e impeachment. No protesto de 24 de julho, especificamente, manifestantes também rechaçaram as ameaças de golpe e queimaram uma estátua de Borba Gato em São Paulo, símbolo da colonização e escravização dos povos originários.

Ações como queima de estátuas também ocorreram na Colômbia, que tem visto protestos intensos desde abril. Os movimentos atuais começaram por conta de uma reforma tributária com aumento de imposto para os mais pobres. A demanda se uniu a outras, principalmente por conta da gestão na pandemia. A Colômbia vive há anos questões ligadas à violência com o narcotráfico e o povo colombiano também vai às ruas constantemente.

No 07 de setembro, mesmo com atos com teor golpista feitos por bolsonaristas, várias pessoas e entidades saíram às ruas junto do tradicional Grito dos Excluídos que é organizado desde 1995, neste ano, com o tema “Vida em primeiro lugar” pedindo vacina, comida no prato e trabalho.

“O que é fundamental: os processos de articulação política e popular. Sem povo na rua, esquece. Não dá para concentrar todas as forças só no âmbito eleitoral. Precisa-se de organização popular, articulação popular e mobilização popular. Precisa do povo na rua o tempo todo,” diz Gándara Caballido.

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