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Estamos melhorando sob a austeridade neoliberal?

Sofremos as piores reformas e ajustes, vimos a implosão dos direitos dos cidadãos, mas crescimento é pífio e desemprego aumenta

Ao contrário do prometido, cortes no orçamento não resolveram problema fiscal e agravaram a recessão e a miséria
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Os franceses Pierre Dardot e Christian Laval apresentam o entendimento de que o neoliberalismo é um sistema de normas que estão profundamente inscritas nas práticas governamentais, nas políticas institucionais, bem como nos estilos gerenciais, estendendo a lógica do mercado muito além das estritas fronteiras do mercado e produzindo uma subjetividade “contábil” pela criação de concorrência sistemática entre os indivíduos. Em suma, o neoliberalismo seria o desenvolvimento da lógica do mercado em todos os aspectos da vida, desde o Estado até o mais íntimo da subjetividade humana.

O empreendedorismo, palavra da moda, seria, portanto, essa expressão do neoliberalismo levada à subjetividade humana. Um espírito comercial que procura obter novas oportunidades de lucros onde puder. Sendo que toda pessoa teria algo de empreendedor dentro de si, cabendo ao mercado liberar esse empreendedorismo.

Ressalte-se, que sob essa lógica, empreendedores podem ser meros trabalhadores. Inclusive trabalhadores braçais e precarizados sem qualquer tipo de cobertura previdenciária ou trabalhista efetivas, como os que atualmente tomam as ruas das principais cidades brasileiras em aplicativos de transporte, em bicicletas alugadas por aplicativos para fazer entrega de comida também pedidas por aplicativos. E que também pululam na internet, através de coachs (inclusive quânticos!) e outras denominações cada vez mais inovadoras e precárias. Bem dentro do espírito neoliberal.

Sob o nome pomposo de austeridade, vimos novas iniciativas de promover o aprofundamento de políticas neoliberais desde 2008 em boa parte do mundo e inequivocamente desde 2016 no Brasil.

Sem esquecer a adoção de um ajuste fiscal rigoroso já em 2015, veio uma Reforma Trabalhista diretamente para retirar direitos dos trabalhadores num momento de fragilidade econômica, prometendo gerar mais empregos, ainda que com menor proteção. Veio em seguida uma Reforma da Previdência também retirando direito dos trabalhadores, sob a desculpa de que não haveria aposentadoria no futuro caso não fosse feita a reforma e uma série de “minirreformas” trabalhistas atacando grupos de trabalhadores aqui e acolá. Em comum duas lógicas: não há alternativa; e os trabalhadores devem abrir mão de seus direitos (muitas vezes colocados como privilégios) em favor do bem maior (de quem?).

Enquanto economistas liberais dizem que um belo dia isso terá resultado positivo, enquanto alguns apontam o recorde do Ibovespa como demonstração cabal do caminho correto da empreitada, desconsideram que o desemprego terá se mantido acima de 11% (com média em cerca de 12%) durante o tempo de um mandato presidencial no início de 2020. Sem falar no número de trabalhadores desalentados e subutilizados, que no segundo trimestre de 2019 somaram 4,9 milhões e 28,4 milhões de pessoas, respectivamente.

 

Com a desindustrialização, as reformas e as políticas de austeridade, as condições do trabalho no Brasil pioraram vertiginosamente. O Índice da Condição do Trabalho do DIEESE, que analisa a inserção ocupacional, a desocupação e o rendimento dos trabalhadores, passou de cerca de 0,8 (quanto mais próximo de 1, melhor a situação geral do mercado de trabalho) para 0,34 entre o 4º trimestre de 2014 e o 3º trimestre de 2019, sendo o pior resultado trimestral desde a criação da série em 2012.

Enquanto o 1% com maior renda do trabalho ganha 34 vezes mais do que os 50% mais pobres, a aparentemente festejada projeção do Banco Mundial para o crescimento do PIB brasileiro em 2020 prevê na verdade que dentre 133 países, o Brasil ficará na posição 109º, sendo que em 2019 a posição alcançada foi a de 106º.

Estamos melhorando sob a receita neoliberal?

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