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Do 1º brinquedo à falta de incentivo: a vida da ex-árbitra Cássia Dias

‘Eu poderia ter feito mais, apitado muitos outros jogos, mas falta reconhecimento e sobra preconceito’, diz

Foto: arquivo pessoal
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O interesse de Cássia pelo futebol começou cedo, em casa, quase que transmitido pela corrente sanguínea. A programação do final de semana? Ir ao Mineirão com o pai. O primeiro presente? Uma bola. Frequentadora assídua da arquibancada desde os quatro anos e incentivada pela família a jogar bola, o gosto pelo esporte cresceu e fez com que ela seguisse nesse caminho também em suas primeiras escolhas profissionais.

Cássia Dias deu seus primeiros passos no futebol como a maioria das pessoas: brincando. “Eu comecei a jogar bola com os moleques da minha rua. Eu lembro de mim com uns 8 anos chutando bola na rua”, conta. Aos 13 anos, começou a jogar em um time. O Benfica, equipe da Região Metropolitana de Belo Horizonte, a convidou para vestir a camisa do time. Depois de dois anos no Benfica, a equipe fez uma parceria e virou a equipe feminina do Clube Atlético Mineiro. Lá, Cássia jogou de 1980 a 1985. “Disputamos Campeonato Mineiro, Copa do Brasil e Campeonato Brasileiro. Fomos tri campeãs mineiras e eu também fui artilheira”, lembra.

A artilheira largou a carreira de jogadora desmotivada pela falta de incentivo ao esporte. “No futebol feminino eu não tinha perspectiva nenhuma, nenhum incentivo, nada. Então eu parei de jogar profissionalmente”, revela. O futebol, no entanto, continuou na vida de Cássia. Ela seguia fazendo o que aprendeu na infância: brincando de jogar bola. Em uma das peladas entre amigas, recebeu o convite para fazer o curso de arbitragem da Federação Mineira de Futebol.

A possibilidade, que ainda não havia passado pela cabeça de Cássia, virou profissão. Em 1996, ela concluiu o curso de arbitragem e se tornou apta a atuar como árbitra central. Filiou-se à Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e teve a primeira oportunidade de apitar pela entidade de forma inusitada. “O árbitro central sofreu uma contusão um dia antes, durante uma atividade física. Eu era quem estava escalada como quarto árbitro para aquele jogo entre Ipatinga e Villa Nova, pela segunda divisão. Fiquei sabendo que ia apitar a partida no dia, quando o árbitro assistente veio me buscar e me contou”, ressalta. Apesar da surpresa, Cássia enfatiza que estava preparada e lembra com orgulho que a arbitragem foi elogiada pelas duas equipes depois do jogo.

Cássia também fez o teste para integrar o quadro da Fifa. “Eu fiz o teste físico no Rio de Janeiro e fui aprovada. Naquele ano não teve vaga e por isso eu não entrei para o quadro da Fifa”, pontua. Ela apitou partidas de futebol de campo por 14 anos e, posteriormente, continuou apitando jogos de futebol society. Foi árbitra central nas séries B, C e D do Brasileirão; no Campeonato Mineiro feminino e masculino; na Copa do Brasil de futebol feminino e no Campeonato Brasileiro feminino, além de ter atuado nos jogos paralímpicos de 2007 e 2016 no futebol de 7.

Quando decidiu parar de atuar no futebol de campo, em 2010, estava com 42 anos. “Eu poderia ter feito mais, apitado muitos outros jogos, mas falta reconhecimento e sobra preconceito”. Então, veio a desmotivação. “A gente trabalhava a semana toda para fazer tudo bem. Chegava no jogo, apitava bem e recebia elogios. Só que a gente nunca teve a sequência que os homens têm. Eles apitavam todo final de semana, enquanto a gente apitava uma vez por mês no campeonato brasileiro e olhe lá”, desabafa.

A CBF tem oito árbitras em seu quadro com índice para apitar jogos masculinos. No mês passado, depois de quase 15 anos, uma mulher foi árbitra central em um jogo da série A do Campeonato Brasileiro masculino. Edina Alves apitou o jogo CSA x Goiás e teve a atuação elogiada. É preciso comemorar, valorizar e não deixar de questionar: qual será a próxima partida do Brasileirão para a qual ela será escalada?

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