Diálogos da Fé
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Quem será punido pelo desaparecimento do jornalista saudita?
O Ocidente trata com excessiva condescendência a monarquia árabe


Jamal Khashoggi, importante jornalista de 60 anos exilado em Washington, foi assessor da inteligência saudita antes de se tornar um crítico da monarquia. Um dos alvos principais de suas reportagens era o príncipe herdeiro Mohammad bin Salman, que decretou uma fatwa contra ele.
Khashoggi fora ao consulado da Arábia Saudita na Turquia para regularizar documentos que permitiriam seu casamento. A noiva, a turca Hatice Cengiz, esperava do lado de fora. Ela tinha em mãos um telefone celular conectado ao relógio Apple Watch 3 do jornalista, que, além de monitorar os sinais vitais de quem o usa, grava sons ambientes, filma e retransmite dados ao aparelho celular .
O jornalista entrou pela porta da frente do consulado e de lá não saiu. Desde então, não foi mais visto. Só após 13 dias do desaparecimento, a diplomacia saudita permitiu a entrada da polícia turca.
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Segundo dois integrantes da equipe de investigação da Turquia, as autoridades sauditas não têm cooperado e não garantiram o acesso ao consulado nem à residência do cônsul, para onde seguiu um dos veículos que supostamente transportava agentes secretos a serviço da monarquia. E que, de acordo com apurações, teriam desembarcado no país para interrogar o jornalista.
O porta-voz do governo turco, Ibrahim Kalin, anunciou que, a pedido de Riad, foi formada uma “equipe de trabalho conjunto” com policiais turcos e agentes sauditas enviados para investigar o caso.
O presidente dos EUA, Donald Trump, descartou a imposição de sanções. Interessado apenas em negócios, justificou a leniência: “Os sauditas gastam 110 bilhões de dólares comprando nosso equipamento militar e outras coisas.” Várias empresas privadas adotaram, porém, medidas de represália contra a Arábia Saudita depois do episódio.
Representantes de Viacom, The New York Times, The Economist, CNBC, Financial Times e Bloomberg anunciaram o cancelamento da conferência Future Investment Initiative, conhecida como “Davos do deserto”, marcada para a terça-feira 23 na capital saudita. Um dos fundadores da AOL, o multimilionário Steve Case, desistiu de participar do evento.
O desaparecimento de Khashoggi levou a empresa de consultoria norte-americana The Harbour Group a interromper o contrato de assessoria ao governo de Riad. O grupo Virgin suspendeu investimentos de 1 bilhão de dólares no país.
O que ocorreu na Turquia, se for comprovado, “mudaria completamente a capacidade de qualquer ocidental de fazer negócios na Arábia Saudita”, afirmou Richard Branson, magnata britânico e proprietário do grupo Virgin.
Os sauditas, por sua vez, ameaçam aumentar o preço do barril de petróleo a mais de 100 dólares e estreitar as relações com a China e a Rússia.
Em nome dos negócios, os EUA toleram as atrocidades da Arábia Saudita, que não são poucas.
Recentemente, durante a peregrinação anual dos muçulmanos a Meca, uma opositora foi decapitada em público. Um líder da comunidade xiita, crítico da monarquia, e seus parentes foram presos e condenados a morte por participar de manifestações contra a monarquia. Seu sobrinho, um jovem de apenas 15 anos, foi morto por crucificação em pleno século XXI.
Os sauditas bombardeiam o Iêmen diariamente e o Ocidente não toma nenhuma providência. Também o Bahrein é vítima das violações aos direitos humanos patrocinadas pela monarquia, aliada do regime que comanda o país.
Até quando?
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