Diálogos da Fé

Blog dedicado à discussão de assuntos do momento sob a ótica de diferentes crenças e religiões

Diálogos da Fé

Pierre Verger e os orixás do terceiro milênio

O lançamento de uma nova edição do clássico “Orixás, Deuses Iorubás na África e no Novo Mundo” promete agitar São Paulo em 3 de outubro

Verger, autor de um clássico sobre as religiões afro-brasileiras
Apoie Siga-nos no

Pierre Verger nasceu em Paris, França, em 4 de novembro de 1902 e faleceu em Salvador, Bahia, em 11 de fevereiro de 1996. Iniciou-se na fotografia e nas viagens aos 30 anos de idade, após o falecimento de sua mãe, que era sua última parenta viva. Ao decidir se tornar um viajante solitário, optou por uma vida livre e não conformista.

De dezembro de 1932 a agosto de 1946, foram quase 14 anos consecutivos de viagens ao redor do mundo, sobrevivendo exclusivamente da fotografia.

Trabalhou para as maiores publicações da época, mas como nunca almejou a fama, estava sempre de partida: “A sensação de que existia um vasto mundo não me saía da cabeça e o desejo de ir vê-lo me levava em direção a outros horizontes”, afirmava.

Leia também:
As palavras e as coisas na política, na religião e no cotidiano
É possível ser tolerante nestes tempos?

Em 1946, enquanto a Europa vivia o pós-guerra, Verger desembarcou na Bahia. Assim as coisas começaram a mudar, pois logo foi seduzido pela hospitalidade e riqueza cultural que encontrou na cidade e acabou ficando. Como fazia em todos os lugares por onde passava, preferiu a companhia do povo simples de Salvador.

A população da cidade, majoritariamente negra, logo chamou sua atenção. Além de ilustrar suas fotos, muitos se tornaram seus amigos. Verger conheceu a vida e a história dessa gente em detalhes e assim que descobriu o candomblé acreditou ter encontrado a fonte da vitalidade do povo baiano, transformando-se em um dos maiores estudiosos do culto aos orixás.

Desde então, toda obra de Pierre Verger girou em torno dessa essência e em suas imagens captou a alma dos terreiros. Na velha roleflex conseguiu registrar as “cores” e a magia dos rituais e das divindades, deixando uma herança artística e cultural que o consagrou como grande fotógrafo e etnólogo.

Ao comemorar 30 anos, a Fundação Pierre Verger vai promover um conjunto de ações que incluem, entre várias atividades, uma grande festa de lançamento da nova edição do livro “Orixás, Deuses Iorubás na África e no Novo Mundo”.

No próximo 3 de outubro, das 19 às 21 horas, na Sala São Paulo, um livro clássico, um verdadeiro best-seller e um registro imprescindível para todos que pretendem conhecer o candomblé em profundidade será apresentado ao público por meio das histórias da griô e Iyá kekerê Vovó Cici, que conviveu com Verger por décadas, além dos escritores Carolina Cunha e Reginaldo Prandi.

O livro é um dos primeiros registros da cultura dos orixás na África e no Novo Mundo, um estudo comparativo que resulta de pesquisas etnográficas. Retrata os cultos aos deuses iorubás nos territórios de origem, como Nigéria, Benin e Togo, e nas Américas, sobretudo Brasil e Cuba.

As vozes da diáspora e seu poder de resistência às crueldades da escravidão estão expressas nesta publicação que traz 250 fotografias e os textos sobre as cerimônias, as características de cada orixá e as descrições dos arquétipos da personalidade de seus filhos.

Até hoje, este livro de Pierre Verger é considerado um dos títulos mais importantes, mais completos e precisos sobre o assunto, tratando-se de uma referência obrigatória para pesquisadores do mundo inteiro.

Há anos esgotado e com uma lista de espera enorme, tornou-se praticamente uma obra de colecionador. Com essa demanda vinda de diferentes públicos, a Fundação Pierre Verger decidiu reedita-lo, mas de uma forma totalmente nova, que inclui novo projeto gráfico, algumas fotos inéditas e prefácio de Mãe Stella de Oxóssi, ialorixá do Axé Opô Afonjá e imortal da Academia de Letras da Bahia.

Outra novidade é uma linha de produtos inédita e limitada, intitulada “Orixás” e desenvolvida com o objetivo de expandir a experiência com a cultura dos terreiros. A criação é da designer Juliana Rabinovitz, responsável pela identidade visual da campanha de comemoração dos 30 anos da Fundação Pierre Verger.

No dia do lançamento, o livro será vendido pelo preço promocional de 120 reais. As atividades de celebração vão até 2019 e contarão com exposições, doações de fotografias, lançamentos de outros títulos, seminários, workshops, ambientações em locais de acesso público e intervenções urbanas artísticas.

A nova edição será apresentada inicialmente ao público baiano, depois segue para uma programação em várias capitais, começando por São Paulo e seguindo com evento no Museu da Fotografia, em Fortaleza, Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, Livraria da Travessa, no Rio de Janeiro, entre outras.

O presidente da Fundação Pierre Verger, Gilberto Sá, está à frente da instituição desde 2001 e esclarece que o projeto para novas ações incluem a organização de um memorial na própria sede e a manutenção das mostras de fotos no Brasil e no exterior. Além disso, outros livros devem reeditados e alguns inéditos serão publicados.

“O que mais desejo é que a cada dia esta fundação seja uma fonte para pesquisadores de todo o mundo neste tema de África-Brasil, sua história e seu desenrolar. Ainda há muito por estudar e a fotografia é documento para entendermos a história da humanidade”, ressalta.

Devidamente preservada pela fundação, a obra de Verger é uma fonte para o conhecimento dos povos negros na África e na diáspora, engajando-se na pesquisa, preservação e divulgação, além de manter vivo todo legado e o pensamento do autor e seu amor pelo povo negro da Bahia.

A fundação foi presidida pelo próprio Verger até sua morte e, depois, pelo seu grande amigo Carybé. Após a nomeação de Gilberto Sá, uma de suas grandes realizações foi a exposição itinerante “O Olhar Viajante de Pierre Fatumbi Verger”, que em 2002, ano de seu centenário, percorreu as principais capitais brasileiras.

Verger foi homenageado no carnaval do Rio de Janeiro pela escola de samba União da Ilha do Governador. Nos versos do belo samba-enredo um pouco de sua trajetória no culto aos orixás:

Vem brilhar, um dom divino

Na regência de Ifá, nasce o filho do destino

E com a Ilha atravessa o mar

O navio é negreiro, ô ô ô

E na vinda vem os Orixás

Pra surgir nossos terreiros

Na cultura Yorubá Nagô, ô ô

Se entrega por inteiro

E se sagrou babalaô

Homem branco feiticeiro

Obra e autor que atravessaram um século e se perpetuaram como um patrimônio dos terreiros de candomblé, registrando em detalhes a riqueza, a alegria e as cores de um povo em diáspora.

ENTENDA MAIS SOBRE: ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo