Diálogos da Fé

Blog dedicado à discussão de assuntos do momento sob a ótica de diferentes crenças e religiões

Diálogos da Fé

Os orixás que inspiram a arte

Muitos artistas se consagraram retratando as divindades e os rituais do candomblé, que continuam a inspirar talentos da arte contemporânea

Apoie Siga-nos no

Num dos seus últimos pronunciamentos como presidenta da República, Dilma Rousseff apareceu à frente de um painel que exibia a imagem de um ritual do candomblé. Não sei se a presidenta pretendia evocar a proteção de Iemanjá, Oxalá e Oxum, mas de qualquer forma mostrou ao Brasil a bela obra “Três Orixás”, de Djanira Motta e Silva.

A artista nasceu em Avaré, interior de São Paulo, no dia 20 de junho de 1914, e morreu no Rio de Janeiro, em 31 de maio de 1979. Fez seu primeiro desenho enquanto se tratava de uma tuberculose. Grande amiga de Jorge Amado, pintou para o escritor baiano o mural intitulado “Candomblé”.  

Sua obra “Três Orixás” ocupa lugar de destaque no Palácio do Planalto, bem no gabinete presidencial. Djanira Motta e Silva é uma das grandes artistas brasileiras que buscaram nos terreiros a inspiração e o mote para algumas de suas principais criações. Nas palavras de Jorge Amado:

“Djanira traz o Brasil em suas mãos, sua ciência é a do povo, seu saber é esse do coração aberto à paisagem, à cor, ao perfume, às alegrias, dores e esperanças dos brasileiros. Sendo um dos grandes pintores de nossa terra, ela é mais do que isso, é a própria terra, o chão onde crescem as plantações, o terreiro da macumba, as máquinas de fiação, o homem resistindo à miséria. Cada uma de suas telas é um pouco do Brasil.”

Outro grande amigo de Jorge Amado foi o “argentino” Hector Julio Páride Bernabó, nascido em Lanús, no dia 7 de fevereiro de 1911, mas renascido em Salvador desde 1949, tornando-se um dos baianos mais importantes de todos os tempos: Carybé.

Baiano de corpo e alma, filho dileto de Oxóssi, Carybé foi um dos mais famosos artistas plásticos do Brasil, tendo obras espalhadas pelo mundo inteiro. A Bahia, seus Orixás e sua gente foram sua maior inspiração. Obá Onanxokun no Axé Opô Afonjá, Carybé viveu com fé e alegria. Morreu em Salvador, no dia 2 de outubro de 1997, mas segue imortal nas cores de suas aquarelas.

Ao completar 70 anos, em 1981, Carybé lançou o livro Iconografia dos Deuses Africanos no Candomblé da Bahia, resultado de trinta anos de pesquisas nos mais importantes terreiros de Salvador e um registro fundamental dos rituais, insígnias, costumes e personalidades da religião. Em junho de 1982, recebeu da Universidade Federal da Bahia o título de Doutor Honoris Causa.

Leia também:
Sobre discriminação, preconceito e outras expressões da desigualdade
Quem tem medo de macumba?

No dia 2 de dezembro de 1917, na cidade de Salvador ou cidade da Bahia, como se dizia antigamente, nasceu Deoscóredes Maximiliano dos Santos, sumo sacerdote do cultos aos eguns, aos ancestrais, e reconhecidamente um dos grandes nomes da escultura brasileira.

Mestre Didi, como era respeitosa e carinhosamente chamado, morreu em 6 de outubro de 2013. Costumava dizer que seus trabalhos se inspiravam na natureza, na mãe-terra e nos seus respectivos orixás, especialmente Nanã, Omolu e Oxumarê. Em suas próprias palavras, “os orixás do panteão da terra são os que nos alimentam e nos ajudam a manter a vida”.

Filho consanguíneo de Mãe Senhora, uma das maiores ialorixás da Bahia, Mestre Didi era também escritor. Casado com a antropóloga Juana Elbein dos Santos, que assim descreveu seu estilo:

“Exprime, através da criação estética, uma arraigada intimidade com seu universo existencial, onde ancestralidade e visão de mundo africanos se fundem com sua experiência de vida baiana. Completamente integrado ao universo nagô de origem yorubana, revela em suas obras uma inspiração mítica, material. A linguagem nagô com a qual se expressa é o discurso sobre a experiência do sagrado, que se manifesta por meio de uma simbologia formal de caráter estético.”

Esses grandes nomes das artes contribuíram intensamente para a consolidação das imagens dos orixás no imaginário do povo brasileiro. Ainda hoje são referências para novos artistas, que seguem revelando em suas obras o universo afro-religioso em todas as suas variações de cores e formas.

Entre os bons exemplos de artistas contemporâneos que se inspiram nos orixás temos o fluminense Miguel Angelo, natural de Barcelos no norte do Estado.

Esse professor e design gráfico inaugura em São Paulo, no dia 30 de julho de 2018, a exposição “Orixás: sincretismo do nosso Brasil”, que conta com o apoio institucional da Secretaria de Cultura e fica em cartaz por um mês na Estação Cultura, na Rua Mauá, n° 51, na Luz.

A exposição conta com peças exclusivas, assinadas por Miguel Angelo, que retratam de forma lúdica, inspiradora e criativa, por meio de adereços, imagens e outras referências da religiosidade afro-brasileira, todo seu vasto e rico fundamento.

Mostra que a criatividade pode ser plena e que o domínio de diversas técnicas pode transformar elementos simples em grandes obras. E tudo isso tendo as religiões de matriz africana como principais fontes de inspiração. Para o artista, esse trabalho é uma forma de validar sua própria visão da fé e de demonstrar sua sensibilidade ao abordar um tema étnico.

Vale a pena conferir essa exposição e pesquisar um pouco mais sobre as obras de Djanira, Carybé, Mestre Didi e tantos outros que não encontraram nos orixás apenas inspiração estética. Mais do que isso, viram no candomblé uma possibilidade de recriar em esculturas e telas a visão de mundo e a alegria de um povo que reza cantando e dançando e que produz arte em cada gesto e movimento.

ENTENDA MAIS SOBRE: ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo