Diálogos da Fé

Blog dedicado à discussão de assuntos do momento sob a ótica de diferentes crenças e religiões

Diálogos da Fé

O papa e as duas Coreias no Conselho Mundial de Igrejas

A visita de Francisco à reunião em Genebra e a congregação de cristão dos dois países são notícias alentadoras nestes tempos de tanto ódio

O papa Francisco estimula o ecumenismo
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Há dias somos bombardeados por notícias que reforçam o caráter segregador da humanidade.

Algumas delas: o navio Aquarius repleto de imigrantes africanos impedido de atracar na Itália e em Malta;

A  indiferença ao sofrimento das milhares de vítimas da erupção de um vulcão na Guatemala;

A vitória para a presidência da Colômbia de um opositor do acordo de paz;

O silêncio das lideranças de poder no mundo diante do massacre do povo palestino;

Quase duas mil crianças separadas dos pais, imigrantes indocumentados, pelo governo dos EUA, todos encerrados em prisões;

Os mais de três meses de impunidade dos assassinos da vereadora Marielle Franco.

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Lamentavelmente, é preciso reconhecer que há expressões religiosas que não só apoiam como estão por trás da criação das barreiras divisórias. Contrariam o sentido do próprio significado de “religião”, religar, estabelecer laço, vínculo entre os seres humanos e o divino, e, consequentemente, entre elas mesmas.

Os grupos e discursos religiosos que sustentam as situações descritas acima revelam a dimensão desumana que pode orientar trajetos religiosos.

Não é disto entretanto que quero falar. Minha fé está ancorada num Deus que é todo amor e misericórdia, tão divino que se fez humano e pagou com a vida por ter estado em solidariedade com as vítimas de um mundo dividido.

Ela me faz buscar as vivências religiosas distintas desta realidade cruel, que estão por toda parte, e servem como fonte de esperança para a “estranha mania de ter fé na vida”.

Das tantas experiências que poderiam ser relatadas aqui, fico com a que acontece nesta semana: a reunião bienal do corpo diretivo do Conselho Mundial de Igrejas, associação de 345 igrejas cristãs, evangélicas e ortodoxas, de todos os continentes, formada em 1948 (a Igreja Católica Romana participa como observadora).

A organização surgiu na Europa das cinzas da Segunda Guerra Mundial ancorada no sonho das igrejas se tornarem um símbolo de unidade e reconciliação no mundo devastado por divisão, ódio e destruição.

É uma das mais significativas expressões do movimento ecumênico mundial em ações concretas nos campos da unidade cristã, da promoção da vida e do diálogo com as outras religiões.

O comitê central do CMI, reunido entre 15 e 21 junho na sede da organização em Genebra, tem 150 integrantes. São leigos e clérigos, mulheres e homens, que representam igrejas dos diferentes continentes e se reúnem a cada dois anos para garantir que as políticas e as atividades aprovadas nas Assembleias Gerais sejam implementadas.

A décima assembleia do CMI foi realizada na Coreia do Sul, em 2013, e a nona aconteceu no Brasil em 2006.

A reunião do comitê central neste 2018 destaca os 70 anos de existência dessa organização que tem marcos na sua história na promoção da paz com justiça, como a intensa atuação pelo fim do apartheid na África do Sul, em apoio às ações de lideranças evangélicas como o bispo anglicano Desmond Tutu e do metodista Nelson Mandela.

Duas participações especiais marcam a reunião: representantes da Federação Cristã Coreana, da Coreia do Norte, e o papa Francisco. A presença de representantes de igrejas da Coreia do Norte (sim, há igrejas na Coreia do Norte) juntamente com participantes da Coreia do Sul nessa reunião revela o quão ativo tem sido o CMI na promoção do diálogo e da paz entre os dois países.

Em um momento marcante, que simbolizou a quebra de barreiras e a busca de unidade, os cristãos das Coreias do Norte e do Sul cantaram juntos em momento celebrativo dos 70 anos do CMI. Os coreanos, de braços dados, entoaram a canção popular de 600 anos Arirang (uma espécie de hino oficial da Coreia unida que existia até que a guerra civil dividisse o país e as famílias nos anos 50).

A canção popular diz: “Assim como há muitas estrelas no céu aberto, há muitos sonhos em nossos corações”.

Agora os participantes se preparam para uma visita muito especial no dia do encerramento da reunião, 21 de junho: o papa Francisco, que aceitou o convite do CMI e priorizou este momento na sua agenda.

Será uma visita diferente comparada àquela que os papas Paulo VI e João Paulo II fizeram ao CMI. Naquelas ocasiões eles estavam em visita à Suíça e à ONU em Genebra, como chefes de Estado, e passaram pelo conselho. Francisco assumiu a ida à Genebra, como líder maior da Igreja Católica, o bispo de Roma, para estar no CMI. Francisco se unirá ao patriarca ecumênico (ortodoxo) de Constantinopla Bartolomeu I, também presente à reunião, e estará como um cristão, valorizando a experiência ecumênica de diálogo e de superação das barreiras divisórias.   

Segundo o secretário-geral do CMI, o pastor luterano da Noruega Olav Fykse-Tveit, o papa terá a oportunidade de testemunhar as atividades do CMI, em encontro ao vivo com suas lideranças representativas.

As palavras de Fykse-Tveit sobre a visita podem inspirar nestes tempos difíceis: “Podemos dizer que apesar de algumas luzes e sombras, sinais de uma primavera ecumênica coincidem com a visita do papa. Mas também poderíamos dizer que o movimento ecumênico precisa ser capaz de suportar todas as estações.  No inverno usamos gorro e luvas. Algumas vezes colhemos frutos, outras vezes não conseguimos ver resultados, ao menos não a curto prazo… mas também nestes momentos, é muito importante mantermos a coragem e perseverar”.

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